Título: Aldo aceita manobra que dá sobrevida a Dirceu
Autor: Maria Lima/Isabel Braga
Fonte: O Globo, 21/10/2005, O País, p. 9

Erro regimental na sessão de leitura do relatório contra deputado propicia novo adiamento da votação da cassação

BRASÍLIA. Um recurso à Mesa Diretora aceito pelo presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), permitiu novo adiamento da votação da cassação do mandato do deputado José Dirceu (PT-SP). O recurso que deu sobrevida de mais duas ou três semanas a Dirceu se baseou em erro regimental do Conselho de Ética durante a leitura do relatório do deputado Júlio Delgado (PSB-MG) no qual foi pedida a cassação. A votação do parecer, que seria hoje, só deverá ser realizada na próxima terça-feira. Agora, os líderes da oposição trabalham para evitar que a votação no plenário da Câmara aconteça na primeira semana de novembro, em que há o feriado de finados (dia 2), quando o quórum não deve ser alto.

- Somos radicalmente contra votar na semana do feriado. A ausência de parlamentares abrirá votos em favor de José Dirceu - afirmou o líder do PFL, deputado Rodrigo Maia (RJ).

Prazo para processo ir a plenário termina dia 8

Os 90 dias que o regimento estabelece para que o processo de cassação contra Dirceu seja levado ao plenário terminam em 8 de novembro. A partir do dia 10, o processo tranca a pauta de votações. Caso o conselho vote o parecer na próxima semana, Aldo poderá incluir o processo na pauta de votação na semana seguinte, a do feriado.

O erro do Conselho de Ética, que deve garantir pelo menos 15 dias a mais a Dirceu, ocorreu na última terça-feira. Mesmo com o início da ordem do dia (sessão para votação de matérias) no plenário da Casa, o conselho manteve a leitura do parecer de Delgado. Isso fere o Regimento Interno da Câmara e deu argumentos para que Aldo anulasse parte da sessão.

Antes de anunciar sua decisão, o que obrigaria nova leitura de parte do parecer do deputado Júlio Delgado, Aldo chamou a seu gabinete o presidente do conselho, deputado Ricardo Izar (PTB-SP), comunicando-lhe o fato. Izar evitou fazer críticas a Aldo, mas não poupou os petistas e Dirceu. Para Izar, é clara a intenção deles de adotar medidas protelatórias para atrasar os trabalhos do conselho.

- Eu faço um apelo: deixem o Conselho de Ética trabalhar - protestou Izar.

Com a nova leitura de trechos do parecer foi aberta também a possibilidade de novo pedido de vista, o que atrasa a votação por mais duas sessões. Por isso, a sessão para votar o parecer, que estava prevista para hoje, só poderá acontecer semana que vem.

Deputada do PT se ofende com acusação de Izar

Indagado por que o conselho manteve a sessão mesmo após o início da ordem do dia, Izar disse que pediu a Aldo que adiasse o início das deliberações para a conclusão da leitura do parecer de Delgado. Segundo ele, houve muita pressão dos deputados no plenário e a Mesa teve que iniciar a sessão.

Izar convocou a nova sessão para o final da tarde de ontem e obrigou o relator Delgado, que já tinha viajado para Minas, a voltar às pressas a Brasília.

O presidente do Conselho de Ética realizou a sessão ontem mesmo, para que fosse lido de novo trecho do parecer de Delgado, para tentar garantir a votação do parecer na próxima terça-feira. Antes da retomada da leitura do parecer, a deputada Ângela Guadagnin (PT-SP) declarou-se indignada com uma nota de Izar, em que ele acusa a existência de uma conspiração e de manobras protelatórias ao trabalho do conselho.

- Senti-me ofendida por ser acusada de fazer manobra protelatória - disse a petista.

Ângela fez novo pedido de vista - que adiou a votação do parecer por mais duas sessões - e justificou sua iniciativa. Disse não ter tido tempo de preparar o voto em separado que pretende apresentar. Izar afirmou que em momento algum quis ofender a deputada e adiantou que na sessão da CCJ na qual será analisado o parecer de Darci Coelho (PP-TO), favorável a Dirceu, usará da palavra para dizer por que não concorda com o teor do parecer. Izar conclamou todos os deputados do conselho a fazer o mesmo.

Presidente da Câmara nega favorecimento

BRASÍLIA. O presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), negou ter beneficiado o deputado José Dirceu com a anulação de parte da reunião do Conselho de Ética em que foi lido o seu pedido de cassação. Ele disse que não tinha alternativa, pois o regimento o obriga a anular sessões de comissões realizadas simultaneamente à ordem do dia no plenário para votações:

- A decisão que tomei e todas que tomarei no futuro terão amparo no regimento interno.

O pedido para a anulação foi feito pelo deputado Luiz Sérgio (PT-RJ), aliado de Dirceu, porque a leitura do relatório de Julio Delgado se estendeu por 22 minutos além do permitido, depois de iniciada a ordem do dia.

Legenda da foto: OS DEPUTADOS Ricardo Izar e Júlio Delgado na sessão de ontem do Conselho de Ética da Câmara