Título: AMAZÔNIA: POVO TENTA SALVAR ANIMAIS EM EXTINÇÃO
Autor: Ismael Machado
Fonte: O Globo, 21/10/2005, O País, p. 15

População de Oriximiná, no Pará, se esforça para tirar tracajás presos na lama de lagos vazios

BELÉM. O drama da seca nos rios amazônicos atinge não só as comunidades ribeirinhas, mas se transforma em luta pela salvação de algumas espécies típicas da região. Na semana passada, três peixes-boi morreram no Amazonas. Em Oriximiná, no Pará, praticamente todos os moradores de uma comunidade se uniram para salvar centenas de tracajás (pequenos jabutis) que, presos na lama ressecada dos lagos vazios, estavam condenados à morte.

Os lagos da região funcionam como viveiros de espécies fundamentais para os ribeirinhos, que tiram dali o seu sustento. Os moradores retiram os tracajás da lama, onde não resistiriam sob o sol, e os transportam para os rios. Se com os peixes os moradores não estão obtendo muito sucesso, com os quelônios, a solução vem dando certo.

Seca é provocada pelo menor índice de chuva

A seca na região já tem uma explicação. O Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (Cptec), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), informou que um dos principais motivos da seca é que a Região Norte passa este ano pelo menor índice de chuvas dos últimos 40 anos.

Durante o período chuvoso na região, que se estende de dezembro a março, os índices de chuva foram até 350 mm menores que a média, o que contribuiu para que o nível dos rios não atingisse o ideal para suportar o período seco. Além disso, as queimadas podem alterar a formação de chuva no sul da Amazônia, e possivelmente adiar o inicio da estação chuvosa.

Em Manaus a população já começa a ser orientada a economizar água para não correr o risco de desabastecimento, dada a possibilidade de a seca se prolongar por mais tempo do que o esperado. A água, antes abundante na cidade, já é vendida por ambulantes na cidade a R$5 cada cem litros.

No Pará, o Rio Tapajós, um dos principais do oeste do estado, está sete metros abaixo do nível normal. Com isso, a navegação está totalmente comprometida. Percursos que eram feitos em cinco horas levam o dobro do tempo agora para serem feitos.

No município de Aveiro, as crianças precisam caminhar pelo menos 12 quilômetros para ir à escola, andando no leito quase seco dos igarapés. A trilha é perigosa.

- A gente corre o risco de encontrar cobras, jacarés e arraias no caminho - diz o menino Renilson Soares, de 12 anos.

Prefeitura tenta retirar areia para permitir navegação

A Prefeitura de Aveiro iniciou a escavação do leito de alguns igarapés e rios para retirar a areia e permitir a passagem de barcos. Mesmo assim, os moradores ainda precisam fazer longos percursos a pé. O agricultor Francisco Filho, de 58 anos, diz que caminha quase dez quilômetros com cachos de banana às costas para tentar comercializar as frutas e garantir o sustento da família.

A primeira remessa de ajuda a vítimas da seca no Pará chegou ontem (quinta-feira) . Foram enviadas 30 toneladas de alimentos, 50 mil frascos de hipoclorito e cinco mil envelopes de soro oral a Santarém. O transporte foi feito por um avião Hércules, da Aeronáutica.

Legenda da foto: HOMEM CARREGA água em Manaus para vender a comerciantes: há risco de desabastecimento na capital