Título: Favelas de Santa Teresa avançam para Laranjeiras
Autor: Fernanda Pontes/Luiz Ernesto Magalhães
Fonte: O Globo, 26/10/2005, Rio, p. 17

Crescimento desordenado ameaça unir algumas das 20 comunidades da região a favelas de bairros vizinhos

Reduto da boemia do Rio, Santa Teresa é mais um bairro tradicional da cidade que enfrenta problemas de favelização, principalmente em suas encostas. Ao todo, são 20 comunidades fincadas na região e em áreas vizinhas que crescem horizontal e verticalmente. A expansão sem controle já ameaça até unir as favelas do local a de bairros vizinhos. O Pau da Bandeira, com acesso pela Rua Almirante Alexandrino, já está se fundindo à Pereira da Silva, em Laranjeiras. Também já é difícil distinguir os limites entre o Morro dos Prazeres e o Escondidinho, no Rio Comprido.

A situação não é diferente na favela Júlio Ottoni, que avança pela Área de Proteção Ambiental (Apa) de São José e já se aproxima da Vila Alice, em Laranjeiras. O número de casas da Júlio Otoni, que era 26 na década de 70, atualmente já supera 400.

Verticalização preocupa até líderes comunitários

Na vizinhança de Santa Teresa, uma das comunidades que mais cresce é a Paula Ramos, no Rio Comprido, cuja expansão é comprovada por clareiras abertas na mata. Segundo o IBGE, mais de 200 pessoas já viviam ali em 2000.

- As comunidades crescem porque a prefeitura não consegue controlar a expansão. Infelizmente, isto se dá não apenas nos lugares que ainda não foram urbanizados mas também naqueles que passaram por obras dos programas Favela-Bairro e Bairrinho- disse Flávio Minervino, presidente da Coligação de Favelas de Santa Teresa.

O presidente da Associação de Moradores de Santa Teresa, Leonardo Guimarães, está preocupado com novos barracos que surgem em áreas de risco:

- As comunidades consolidadas devem ser urbanizadas. O problema é que temos cada vez mais clareiras sendo abertas na mata para construção de mais barracos- disse Leonardo, que considera crítica a situação na Júlio Otoni.

O crescimento vertical é apontado como problema até mesmo por líderes comunitários, que não conseguem conter a expansão das favelas. É o caso da Favela Coroado, na Rua Professor Olinto de Oliveira, onde 1.200 pessoas vivem em cerca de 300 casas. Criada há mais de três décadas, ela já alcança a divisa com a Rua Almirante Alexandrino.

Eco-limite não consegue conter crescimento

O presidente da Associação de Moradores, José Janduí Borges, de 44 anos, conta que a área verde no entorno da comunidade foi beneficiada com o programa Eco-Limite. Mas ainda assim a favela não pára de crescer verticalmente.

- As barreiras são respeitadas, mas não temos como controlar a construção de novos pavimentos, o que considero prejudicial para nós mesmos - afirma José.

Ele diz que já pediu a visita de técnicos da Fundação Municipal Rio-Águas para acompanhar as condições das duas nascentes na área da comunidade.

- Também solicitamos que o programa de reflorestamento do entorno da favela seja concluído e pedimos a implantação do projeto Bairrinho. Mas nenhum pedido foi atendido - lamentou.

O tema violência é evitado por José Janduí. Mas moradores da comunidade temem que o aumento da população, com o crescimento desordenado, torne a área atrativa para o tráfico de drogas que já domina favelas vizinhas.

Nem sempre obras são garantia de melhoria. Em Unidos de Santa Teresa (Morro do Fogueteiro), a Secretaria municipal de Habitação construiu uma creche há quatro anos que não funciona. O prédio constantemente é atingido por tiros durante confrontos entre a polícia e o tráfico. Lideranças comunitárias informaram que já advertiram a secretaria sobre o fato de o terreno escolhido para a creche ficar em área de risco.

Procurada para falar sobre o crescimento desordenado de favelas em Santa Teresa, a secretária de Habitação, Solange Amaral, não retornou as ligações.

Santa Teresa foi declarada Área de Proteção Ambiental em 1984 para preservar sua paisagem natural, com trechos de Mata Atlântica, e cultural, marcada por importantes conjuntos arquitetônicos que englobam os estilos neocolonial, neoclássico, art déco e modernista. O bairro começou a ser ocupado em 1744 por grandes chácaras de ricos imigrantes portugueses, alemães e italianos que optaram por morar numa área perto do Centro. Em 1898, os bondes eletrificados passaram a circular até o Largo da Carioca, atravessando os Arcos da Lapa.

Legenda da foto: NO FOGUETEIRO, creche construída pela prefeitura em área de risco