Título: Distância entre Brasil e China
Autor: Mariza Louven/Luciana Rodrigues
Fonte: O Globo, 26/10/2005, Economia, p. 23

OCDE diz que país pode superar chineses em investimentos, mas cobra reformas

O Brasil é a segunda nação emergente que mais recebe investimentos estrangeiros diretos, tendo atraído US$18 bilhões no ano passado. Mas pode superar a China e passar ao primeiro lugar, previu ontem o secretário-geral da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento (OCDE), Donald Johnston. Mas, na opinião dele, o país ainda precisa realizar reformas estruturais para poder se beneficiar plenamente de uma economia cada vez mais globalizada.

Segundo ele, foi o tamanho do mercado brasileiro e não o ambiente de negócios que atraiu os investidores. Para chegar ao primeiro lugar, o país precisaria avançar na regulação da economia, na reforma tributária, na redução da burocracia e nas Parcerias Público-Privadas. Johnston participou ontem da conferência internacional "Investimento para o desenvolvimento - fazendo acontecer", realizada pela OCDE na sede do BNDES.

Durante sua apresentação no mesmo evento, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, disse que há várias razões para o Brasil ter se mantido, nos últimos anos, entre os principais destinos do investimento estrangeiro direto. Citou o tamanho e o potencial do mercado, a estabilidade macroeconômica, a competitividade das exportações e a capacidade do país de abrigar pólos globais de produção, pesquisa e desenvolvimento.

Palocci lembrou que os lucros das empresas estrangeiras, em 2004, foram os mais altos em duas décadas. O ministro destacou as reformas institucionais e a agenda microeconômica, que segundo ele está levando à redução do custo do capital.

- O Brasil está atraindo investimentos tanto nacionais como externos. E vai continuar sendo um grande país em termos de atração de investimentos estrangeiros - disse.

O ministro acrescentou que o estímulo tributário pode contribuir, mas não é determinante.

- O tributo é um elemento para decisões empresariais. Mas o primeiro é a percepção de que a economia do país é equilibrada e tem perspectiva de crescimento de longo prazo - afirmou.

Mas disse que o governo está se esforçando para aprovar os principais itens da Medida Provisória 252, a MP do bem, extinta na semana passada, na MP 255, em discussão no Congresso. Segundo Palocci, um dos mais importantes itens para o investimento, na MP, é o que prevê a suspensão de PIS/Cofins para setores exportadores.

Os analistas não compartilham do otimismo do secretário-geral da OCDE sobre um possível favoritismo pelo Brasil, em detrimento da China, na atração de investimentos estrangeiros. Cláudio Frischtak, da Inter.B Consultoria Internacional, lembra que a China tem um mercado consumidor grande e uma economia que cresce 10% ao ano. Além disso, o país se tornou o maior centro manufatureiro mundial, com mão-de-obra barata e qualificada, o que faz da China uma excelente plataforma de exportação.

Não por acaso, se somados os recursos destinados a Hong Kong, a China recebeu US$94 bilhões em investimentos diretos no ano passado, cinco vezes mais o volume destinado ao Brasil. Mas o ambiente regulatório também deixa a desejar na China, afirma Frischtak:

- Porém, suas enormes vantagens mais do que compensam.

Muitos economistas também divergem da avaliação do ministro Palocci de que o Brasil tem aprimorado seus marcos regulatórios. Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura, vê retrocesso:

- A MP do Bem morreu, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) está parado por falta de conselheiros, a ANP (Agência Nacional do Petróleo) ficou sem diretor-geral desde janeiro e a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) tem duas diretorias vazias.

Diferenças entre as nações

MERCADO: Com 1,3 bilhão de habitantes - muitos na pobreza e em áreas rurais - a China atrai as multinacionais mais pela rápida expansão da renda per capita. O país cresce a um ritmo de 9% a 10% ao ano e seu Produto Interno Bruto (PIB, conjunto das riquezas produzidas ao longo de um ano) é o segundo maior do mundo pelo critério de paridade do poder de compra. O Brasil também tem um mercado grande - população de mais de 180 milhões, uma das dez maiores do mundo - porém a economia cresceu só 4,9% no ano passado.

CUSTO: A China serve também como plataforma de exportação, graças a uma mão-de-obra barata, qualificada e uma crescente competência tecnológica. No Brasil, as empresas reclamam de carga tributária elevada e de custos trabalhistas.

AMBIENTE REGULATÓRIO: Apesar das queixas de empresas, nesse critério o Brasil leva vantagem. Para muitos analistas, a China ainda não é uma economia de mercado.

COLABOROU Luciana Rodrigues

Inclui quadro: "Dinheiro de fora" [gráfico com a evolução dos investimentos produtivos no país e as aplicações em bolsa, entre 2000 e 2005]