Título: Irmãos de Celso Daniel mantêm denúncias
Autor: Luiza Damé e Demétrio Weber
Fonte: O Globo, 27/10/2005, O País, p. 8
Chefe de gabinete de Lula nega ter transportado dinheiro para Dirceu e diz que não falou em corrupção em Santo André
BRASÍLIA. Ao participar ontem de acareação na CPI dos Bingos com o chefe de gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Gilberto Carvalho, os irmãos do prefeito assassinado Celso Daniel, João Francisco e Bruno José Daniel, disseram que Carvalho teria lhes revelado que havia um esquema de corrupção na prefeitura de Santo André.
Segundo os dois, Carvalho teria dito que ele próprio transportava dinheiro arrecadado com corrupção, tendo levado uma vez R$1,2 milhão em espécie para o então presidente do PT, o deputado José Dirceu (SP). Carvalho, que foi secretário de governo na prefeitura, negou as acusações.
¿ Não falei que transportava dinheiro. Era uma mentira. Não falei que levei dinheiro para José Dirceu. Não fiz essa afirmação ¿ disse o chefe de gabinete.
A acareação teve momentos de tensão, mas Carvalho e os irmãos Daniel pouco ou nada acrescentaram de novo ao que já haviam falado sobre o tema. O relator da CPI, senador Garibaldi Alves (PMDB-RN), disse estar cada vez mais convencido de que o assassinato foi planejado e não obra de seqüestradores ou bandidos comuns. Mas admitiu que a acareação não trouxe maiores avanços:
¿ Não espero milagres de acareações. Acho que a acareação não resolve o problema do dia para a noite.
Durante a acareação, Carvalho se apresentou como um defensor da imagem de Celso Daniel e tentou demonstrar que os irmãos estavam afastados do prefeito. Indignado, Carvalho gritou que Celso Daniel não teria guardado dinheiro em casa num saco de lixo, como disse uma ex-empregada do prefeito em depoimento ao Ministério Público de São Paulo. Ele acusou ainda os irmãos Daniel de estarem sendo usados politicamente pela oposição:
¿ A conduta de vocês está servindo para um jogo político.
Interpelado pelo presidente da CPI dos Bingos, senador Efraim Morais (PFL-PB), Carvalho respondeu:
¿ Interesses políticos. Na época, estávamos em plena campanha eleitoral e agora numa grave crise política. Não sejamos ingênuos, nem mintamos para nós mesmos. É natural da democracia que haja muitas contradições políticas. As forças que se opõem ao governo têm tirado proveito disso.
Nesse momento, o líder do PT na Câmara, Henrique Fontana (RS), que acompanhava a acareação, protestou aos gritos contra a condução de Efraim. Também gritando, Efraim cortou-lhe a palavra, justificando que Fontana é deputado e não poderia falar numa CPI do Senado.
Segundo João Francisco, em três oportunidades, Carvalho conversou com ele sobre o esquema de arrecadação de dinheiro montado na prefeitura de Santo André. A primeira conversa teria sido logo depois da missa de sétimo dia de Celso Daniel, na presença de Bruno. Depois, teria ocorrido outra conversa na presença da mulher de João Francisco, Marguerita. Ainda segundo ele, a terceira conversa foi no Corsa preto de Carvalho a caminho do apartamento do deputado Luiz Eduardo Greenhalgh.
João Francisco, que foi mais incisivo com o chefe de gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no começo do depoimento, foi irônico ao contar detalhes dos encontros em que Carvalho teria feito tais revelações. Primeiro, disse que ele comeu vários pedaços de bolo de aipim em sua casa, servido por sua mulher, Marguerita, que também teria ouvido os relatos. Depois, disse que na conversa dentro do Corsa, a única testemunha era o próprio carro.
¿ Você repetiu o bolo de aipim, Gilberto. Você não se lembra de ter gostado do bolo? ¿ perguntou.
Carvalhoconfirmou os encontros, mas negou com veemência o teor das conversas relatadas pelos irmãos. Ele afirmou ter se encontrado com eles depois da missa de sétimo dia para se colocar à disposição da família para acompanhar as investigações e repassar as informações. Carvalho ainda questionou o fato de inicialmente João Francisco ter falado em uma conversa e depois em três. Irônico, afirmou que a ¿criatividade¿ de João Francisco foi crescendo com o tempo.
João Francisco desafiou Carvalho a passar por um detector de mentiras, sob responsabilidade de uma instituição internacional, pois não confia nas nacionais. Carvalho se pôs à disposição para fazer o teste, embora tenha dito não conhecer o método. Carvalho ainda acusou João Francisco de ser lobista da empresa de ônibus Guarará e de ter pedido emprego para sua filha Ana Cristina na prefeitura de Santo André. A acareação enveredou ainda pela vida pessoal do prefeito assassinado. Carvalho disse que a família Daniel se nega a reconhecer uma suposta filha de Celso Daniel com Ivone.