Título: Tucano diz na CPI que mensalão era semanada
Autor: Adriana Vasconcelos
Fonte: O Globo, 28/10/2005, O País, p. 13

Parlamentar usou dados da corretora indicada pelo PL, partido da base do governo, para receber os repasses

BRASÍLIA. Em meio à superacareação promovida ontem pela CPI do Mensalão, o deputado Júlio Redecker (PSDB-RS) divulgou um minucioso levantamento de repasses de dinheiro do empresário Marcos Valério de Souza e, com base nessa pesquisa, afirmou que os pagamentos a partidos e políticos foram feitos por semana, e não mensalmente. O deputado tucano pretende desmontar a tese dos petistas de que os repasses eram para pagar despesas de campanha.

- A periodicidade e a coincidência nos valores dos repasses mostram que o dinheiro não era para campanha. Comprova que havia não um mensalão, mas uma semanada - disse.

O deputado usou os dados sobre os repasses de Marcos Valério à corretora Guaranhuns. Essa corretora teria sido indicada pelo ex-tesoureiro do PL Jacinto Lamas para que o partido recebesse recursos do PT.

Soma dos valores dos cheques era sempre igual

O levantamento feito por Redecker mostra que, entre 11 de fevereiro e 27 de agosto de 2003, a SMP&B enviou à Guaranhuns R$6,037 milhões por meio de cheques nominais. Os valores dos cheques variavam, mas a soma total da semana era sempre a mesma. Na primeira semana, por exemplo, foram feitos quatro repasses, o menor de R$50 mil e o maior de R$200 mil, somando R$500 mil. Esse foi o valor total dos repasses das três semanas seguintes, o que foi caracterizado por Redecker como a primeira série de pagamentos. Na segunda etapa de repasses, o valor total caiu para R$300 mil e, na terceira série, para R$200 mil.

Para o deputado, agora a CPI deve se empenhar em identificar os beneficiários desses pagamentos.

- Como na lista de beneficiários constam nomes que não conhecemos, sugiro que a CPI promova o cruzamento com os nomes de funcionários dos gabinetes de parlamentares dos partidos acusados de estarem envolvidos no mensalão.

A troca de telefonemas entre Jacinto Lamas e a diretora financeira da SMP&B, durante o período em que foram feitos os repasses, foi intensa, de acordo com o deputado.

Relator não demonstra interesse no levantamento

A segunda série de pagamentos, em que o valor total dos repasses foi sempre de R$300 mil, se repetiu por cinco semanas. Na terceira série, os pagamentos passaram a ser de R$200 mil. Apenas dois repasses fugiram a essa ordem: um de R$37,5 mil, registrado em 14 de julho de 2003, e o último, em 27 de agosto de 2003, no valor de R$100 mil.

O relator da CPI do Mensalão, deputado Ibrahim Abi-Ackel (PP-MG), não demonstrou muito interesse pelo levantamento feito por Redecker, que sequer pôde confrontar esses dados com Marcos Valério e o presidente nacional do PL, o ex-deputado Valdemar Costa Neto, que participavam da acareação.

CPI usará dados de deputado nas investigações

Abi-Ackel chegou a propor que os parlamentares fossem proibidos de fazer qualquer pergunta que fugisse ao objetivo central da acareação, que era o de confrontar a lista de valores dos repasses apresentados por Marcos Valério e os admitidos por cada um dos partidos. O deputado Moroni Torgan (PFL-CE) protestou e travou uma ríspida discussão com o relator.

- Nós estamos aqui todos como juízes e não há hierarquia que limite o que cada parlamentar pode perguntar. Não pode haver censura - reagiu Moroni.

- Pode sim! Se não houver hierarquia, isso aqui vira uma desordem - rebateu Abi-Ackel.

O levantamento de Redecker está em poder da CPI do Mensalão para que seja aprofundada a investigação.