Título: Grampolândia
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 03/11/2005, O GLOBO, p. 2

Uma das marcas do ambiente político incendiário dos últimos dias é a velocidade com que as denúncias surgem e são até dissipadas pela erupção de outras. A suposta ajuda financeira cubana ao PT já perdeu força e foi trocada por novo combustível, agora os grampos de que teriam sido vítimas um senador e três deputados que ocupam posições estratégicas no processo depurativo.

Depois do líder tucano Arthur Virgílio e dos deputados Osmar Serraglio e ACM Neto, relator geral e sub-relator da CPI dos Correios, o presidente do Conselho de Ética, Ricardo Izar, denunciou ontem uma escuta em seus telefones. O único caso confirmado é o de Izar mas não é de hoje que os grampos se tornaram um instrumento da luta política. Já causaram muitos escândalos, como o das inesquecíveis fitas do BNDES na privatização das teles, mas estranhamente nunca vimos um araponga ser preso ou condenado pela prática ilegal, herdada da ditadura. Talvez porque tenham se tornado serviçais úteis a todas as forças políticas.

Discretamente a oposição decidiu encaminhar ao TSE a denúncia de que Cuba mandou dólares para a campanha de Lula através de uma verdadeira operação tabajara, tamanho seu primarismo. Dá a entender assim que não investirá no assunto, ficando já no lucro com mais esta munição, ainda que não comprovada, contra Lula e o PT.

Já não mais se fala também na CPI do Caixa Dois, proposta por Arthur Virgílio como reação imediata à renúncia do senador Azeredo à presidência do PSDB, por conta de seu envolvimento com Marcos Valério entre 1998 e 2002, pelo menos. A cúpula tucana torceu o nariz para a iniciativa suspeitando que ela venha a ter boa serventia para o PT, sempre empenhado em demonstrar que caixa dois todos fazem ¿ embora tenha feito algo bem mais grave ao compartilhar o seu com partidos aliados.

Agora, vamos aos grampos. ACM Neto e Virgílio acusaram a Abin, falando até em surrar o presidente se isso for confirmado. Ricardo Izar acha que o órgão tem mais o que fazer. Desafetos não faltam a quem presidirá o processo de cassação de 11 deputados. Estranhamento nenhum dos deputados fez a denúncia ao presidente da Câmara, Aldo Rebelo.

Mas certamente há muito mais gente, além do governo, interessada em saber o que falam os membros da CPI. Inclusive os tais financiadores privados de campanhas e doadores do valerioduto. Alguns devem andar trêmulos de medo de que seus nomes sejam revelados.

O general Jorge Félix, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, ao qual é subordinada a Abin, pedirá informações aos denunciantes para, se for o caso, abrir uma sindicância. A Abin freqüenta a crise desde a origem. Foi suspeitando que Dirceu mandara arapongas gravar seu afilhado Maurício Marinho com a mão na cumbuca da propina que Roberto Jefferson explodiu o valerioduto e o mensalão. Depois, o empresário Arthur Waschek assumiria que contratou um araponga para fazer a fita. E arapongas há de todas as linhagens, públicos e privados, federais e estaduais. Todos inalcançáveis.

De outra massa

Que ninguém considere a absolvição do deputado Sandro Mabel pelo Conselho de Ética como base para qualquer massa de pizza, diz o deputado Chico Alencar, membro do Conselho. O caso tinha singularidades que de fato o distinguem de todos os outros. No PL e na conexão com o mensalão, Mabel nunca teve a proeminência de Valdemar Costa Neto e Carlos Rodrigues, que até renunciaram. Nem ele nem qualquer assessor ou parente seu apareceu na lista de sacadores no valerioduto. Foi Roberto Jefferson que o acusou de ter oferecido R$1 milhão à deputada Raquel Teixeira para que entrasse no PL. Ela confirmou mas ficou a palavra dela contra a dele. No curso do processo, Mabel abriu mão de seu sigilo bancário e fiscal. Nunca se escondeu nem deixou de enfrentar o assunto.

O fabricante dos biscoitos que levam seu nome é um homem simples que, depois da absolvição, admitia tranqüilamente:

¿ Um cargo ou uma liberação de emenda eu peço para mim ou para os companheiros. Mas dinheiro, não peço nem ofereço. O meu nunca foi fácil.

É o chamado fisiologismo, mas se fossem cassá-lo por isso, como diz Chico Alencar, haveria uma limpa na Casa. Cassá-lo sem prova alguma seria mesmo um perigoso precedente.

Aldo e os gladiadores

O presidente da Câmara, Aldo Rebelo, diz-se muito mal impressionado com a violência verbal que está sendo praticada no Congresso, com deputados e senadores falando em dar surra no presidente da República.

¿ Vindo de ardorosos defensores do decoro parlamentar, esta linguagem é chocante. Não deve ser usada nem para com o mais humilde servidor da mais insignificante prefeitura. E como exemplo, é uma deplorável incitação à violência, à prática da justiça pelas próprias mãos, que vem a ser o linchamento.

O ministro Jaques Wagner, baiano, lamentou as ameaças de seu conterrâneo ACM Neto:

¿ É pena que este rapaz tão jovem e promissor não se mire no exemplo do tio, Luiz Eduardo Magalhães, sempre aberto ao diálogo, preferindo a escola de xingamento do avô.

Agora surgiu também uma gladiadora, a senadora Heloísa Helena.

DE LONDRES, onde está ¿vendendo Minas e o Brasil¿, o governador Aécio Neves lamenta o incêndio político aqui na terra. Acha que o PT exagerou na primeira contra-ofensiva e a oposição recrudesceu. ¿De minha parte, continuo evitando dinamitar pontes¿.