Título: CPI: Dinheiro do BB foi parar na conta do PT
Autor: Adriana Vasconcelos
Fonte: O Globo, 04/11/2005, O País, p. 3

Segundo relator, banco antecipou R$10 milhões para a DNA de Valério, que repassou ao partido

A CPI dos Correios denunciou ontem que pelo menos R$10 milhões dos R$55 milhões que abasteceram o valerioduto saíram do Banco do Brasil. Ao informar a descoberta, o relator da CPI, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), disse que a comissão começa a identificar a origem dos recursos que o empresário Marcos Valério de Souza repassou ao PT e a seus aliados. Para o deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ), relator-adjunto da CPI, os empréstimos que Valério alega ter contratado no BMG e no Banco Rural para alimentar os cofres do PT teriam sido usados apenas para esquentar recursos públicos fruto de corrupção passiva e ativa.

- Isso é dinheiro público nas mãos de um partido. A farsa está desmontada. Esse dinheiro é fruto de roubo e não serviu apenas para financiar o caixa dois do PT - disse Paes, ao lado de Serraglio.

Até chegar ao PT, de acordo com a CPI, os R$10 milhões percorreram um tortuoso caminho. Detentor de 32% do capital da Visanet, o BB tem direito a controlar um percentual equivalente dos recursos de publicidade da empresa. Até 2002, dividia essa verba entre as três agências de publicidade que atendiam ao banco. A partir de 2003, quando Henrique Pizzolato foi nomeado diretor de Marketing do BB, a conta da Visanet foi entregue à DNA, cujo sócio majoritário era Valério.

Em dois anos, mais de R$74 milhões

No mesmo ano, o banco divulgou nota técnica, assinada por Pizzolato e mais três funcionários do BB - o diretor Fernando Barbosa de Oliveira e os gerentes executivos Cláudio de Castro Vasconcelos e Douglas Macedo - autorizando o pagamento antecipado dos serviços que a DNA prestaria ao longo do ano. A agência recebeu antecipadamente em 2003 R$29.754.331,43 e, no ano seguinte, R$44.097.024,75.

- A desculpa que nos foi apresentada é que esse pagamento antecipado poderia baratear os custos de mídia, com a compra antecipada de espaço. Mas o que se comprovou foi que os recursos foram aplicados pela DNA - disse Paes.

Ao rastrear a movimentação de R$35 milhões, referente à primeira parcela paga à DNA em 2004, a CPI dos Correios descobriu um roteiro do dinheiro destinado ao PT. Três dias depois do primeiro pagamento, a DNA aplicou R$34,8 milhões no BB-DI (fundo de investimento). No mês seguinte, a agência mandou R$10 milhões para o BMG por meio de uma transferência eletrônica (TED). Após quatro dias, o BMG concedeu um empréstimo do mesmo valor para a Rogério Lanza Tolentino & Associados Ltda, tendo como avalistas Rogério Tolentino e Valério. Os dois apresentaram como garantia uma aplicação em nome da DNA feita no próprio banco. Na contabilidade de Valério, esse empréstimo aparece como sendo para o PT.

- Está comprovado que houve um direcionamento de R$10 milhões, dos R$35 milhões pagos à DNA, para o PT - disse Serraglio.

Ao tomar conhecimento, pelas agências de notícias, de que a CPI teria identificado recursos do BB como fonte do valerioduto, o atual diretor de Marketing do banco, Paulo Rogério Cafarelli, procurou Serraglio ontem à tarde. Cafarelli apresentou uma notificação que o Banco do Brasil enviou em 25 de outubro deste ano à DNA cobrando o ressarcimento de R$9.095.610 que a Visanet teria antecipado à agência em 2004 e cujos serviços prestados não foram comprovados. O valor é um pouco menor do que os R$10 milhões repassados ao PT.

- O Banco do Brasil sabia disso há muito tempo e vinha omitindo da CPI - acusou Eduardo Paes.

A CPI dos Correios suspeita que uma operação parecida tenha ocorrido em 2003, mas ainda não tem provas suficientes para confirmar que o dinheiro tenha abastecido o valerioduto. A exemplo do que aconteceu em 2004, a DNA recebeu R$23,3 milhões em 15 de abril de 2003 como antecipação dos serviços que seriam prestados ao longo daquele ano.

Esses recursos recebidos pela DNA foram então aplicados num fundo de investimento do Banco do Brasil e, coincidentemente, seis dias depois a SMP&B, outra empresa de Valério, contratou um empréstimo de R$19 milhões no Banco Rural. Pela contabilidade do empresário esse empréstimo também seria do PT.

A partir das novas descobertas, Serraglio e Paes pretendem convocar os envolvidos na operação do Banco do Brasil e da Visanet que favoreceu a DNA. A começar por Pizzolato e os três outros funcionários do BB que assinaram a nota técnica permitindo o pagamento antecipado dos contratos. Também querem convocar Leo Batista dos Santos, que era chefe de divisão do banco que autorizou a liberação dos recursos. Serraglio afirmou ainda que a CPI pretende investigar o envolvimento da Secretaria de Comunicação e do ex-titular da pasta Luiz Gushiken.

- Até agora já identificamos uma série de crimes como peculato, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha, corrupção ativa e passiva, prevaricação. Estamos dispostos a sugerir a punição civil, criminal e administrativa de todos os envolvidos - antecipou o relator.

Pizzolato deve ser acusado de peculato

Segundo Serraglio, Pizzolato poderá ser enquadrado no crime de peculato porque colaborou no suposto desvio de recursos públicos que favoreceram o PT. O ex-diretor de Marketing do BB aparece na lista de Valério como beneficiário de R$300 mil sacados da conta da SMP&B no Banco Rural. No mesmo período em que teria recebido esse dinheiro, Pizzolato comprou um apartamento de R$300 mil. Valério poderá responder por corrupção e peculato. Já o ex-tesoureiro petista Delúbio Soares é acusado de tráfico de influência e corrupção. Serraglio disse que não há elementos que comprovem que o BMG tivesse ciência do esquema.

A DNA divulgou nota na qual afirma que está analisando as informações divulgadas por Serraglio e "levantando dados sobre os serviços que prestou à Visanet" e se compromete a responder às acusações do relator da CPI " assim que possível".

Incluir Quadro: O caminho do dinheiro - Da Visanet até o PT, segundo a CPI

Legenda da foto: DELÚBIO E Valério: acusações de corrupção, peculato e tráfico de influência