Título: Conselho deve aprovar hoje cassação de Dirceu
Autor: Maria Lima/Carolina Brígido/Isabel Braga
Fonte: O Globo, 04/11/2005, O País, p. 8

Aldo Rebelo é pressionado para antecipar votação do processo em plenário mas confirma que será no dia 23

BRASÍLIA. O Conselho de Ética da Câmara votará hoje, pela segunda vez, o relatório do deputado Julio Delgado (PSB-MG) que pede a cassação do mandato do deputado José Dirceu (PT-SP). Mas a conclusão do processo transformou-se no pivô de nova queda-de-braço, desta vez entre o Conselho de Ética, que quer votar o parecer no plenário semana que vem, e o presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), que teme atropelar o calendário e marcou a votação para dia 23.

A pressão dos conselheiros foi grande. Aldo, irredutível, avisou que está disposto a pagar o preço do desgaste perante a opinião pública, mas insistirá na votação em dia de quórum alto, uma quarta-feira. O presidente do Conselho, Ricardo Izar (PTB-SP), ainda tentaria convencê-lo num jantar ontem á noite.

Hoje cedo o Conselho repete a votação. Para que o processo de Dirceu seja apreciado antes do fim do prazo de 90 dias - que vence dia 8 - e chegue ao plenário dia 9, houve inversão de pauta e ele será votado hoje no lugar do relatório do deputado Romeu Queiroz (PTB-MG), adiado para semana que vem.

O advogado de Dirceu, José Luiz Oliveira Lima, preferiu esperar o resultado da votação para encaminhar os novos recursos ao STF. Ele disse ter uma carta na manga.

Aldo alega que é preciso cumprir prazos regimentais

Delgado e outros conselheiros foram pressionar Aldo a manter a votação no dia 9. Mas ele alegou que é preciso cumprir prazos regimentais. Disse ainda que marcou anteriormente a votação para dia 9, mas que, por falhas processuais no Conselho, teve de adiar. Como a terça-feira seguinte é feriado, e a quarta-feira, dia 16, pode ter quórum baixo, prefere manter no dia 23. Aldo não quer ser acusado de beneficiar Dirceu.

- Escolhi uma quarta-feira cheia para ter a garantia de que a manifestação do plenário será a mais representativa possível da vontade da Casa. Alguns processos têm simbologia muito grande, não posso correr riscos. Estou disposto a pagar qualquer preço para ser o mais justo, equilibrado e isento - disse.

Izar voltaria a insistir no encontro da noite.

- O presidente teme que a votação num dia de baixo quórum sugira que ele está facilitando as coisas para Dirceu. Mas o processo é tão importante que acho que teremos quórum alto, mesmo na quinta-feira. Até o fim do ano teremos seis ou sete processos concluídos. Faltaria quarta-feira para votar. Tem de ter quórum alto sempre.

A deputada Ângela Guadagnin protestou:

- Já marcou para o dia 23, para que tanta pressa? A pressa é inimiga da perfeição. Dá a impressão de que querem votar o Dirceu antes de tudo.

STF abre processo para investigar Janene

O Supremo Tribunal Federal (STF) abriu ontem processo criminal para investigar o deputado José Janene (PP-PR) por corrupção ativa. Ele já responde no Conselho de Ética da Câmara por envolvimento no escândalo do mensalão. No caso que está no STF, Janene foi acusado de subornar vereadores de Rolim de Moura (RO) em 1992 para evitar a cassação do então prefeito, José Joacil Guimarães. A decisão de transformar o inquérito em processo, a pedido do Ministério Público, foi unânime entre os ministros.

A investigação começou em 1992, quando foi descoberto em Rolim de Moura superfaturamento numa obra de iluminação pública por meio da Eletrojan, empresa já extinta da qual Janene era sócio-gerente. A Câmara de Vereadores ameaçou cassar o mandato do então prefeito por participar das irregularidades.

Segundo a denúncia do Ministério Público, Janene teria desembolsado R$40 milhões para pagar propina a vereadores e manter o prefeito no cargo, essencial para a permanência da empresa na fraude. A assessoria de Janene informou que ele se recupera de uma cirurgia e não pode de comentar o caso.

Ministro do STF diz que cumpriu a lei

Eros Grau, que deu liminares a Dirceu, recebe membros do Conselho de Ética

BRASÍLIA. Criticado por integrantes do Conselho de Ética da Câmara por conta das liminares favoráveis ao deputado José Dirceu (PT-SP), o ministro Eros Grau, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse ontem que tem a consciência tranqüila, pois cumpriu a Constituição. As liminares deram sobrevida ao deputado e determinaram que fosse refeito o relatório do Conselho de Ética que pediu a cassação de Dirceu. Perguntado se ficara magoado com as críticas, Grau desconversou:

- Existem duas pessoas: a do ministro do tribunal, que representa a instituição, e esse tem consciência de que cumpriu a Constituição. O que vai no íntimo das pessoas não importa.

O comentário foi feito após reunião com o presidente do conselho, Ricardo Izar (PTB-SP), que entregou ao ministro relatório argumentando que o colegiado cumprira a determinação do STF. O deputado disse que fez questão de levar o documento ao ministro para desfazer qualquer mal-entendido.

De acordo com Izar, no início da conversa o ministro mostrou-se muito magoado com críticas sobre sua imparcialidade, mas depois teria dito que a liminar fora completamente atendida pelo conselho, não cabendo mais recursos sobre o assunto.

- Ele disse que está tudo resolvido. Um novo recurso tem de ser despachado para outro ministro - disse Izar.

Em entrevista após o encontro, Grau não comentou se a liminar fora cumprida. Limitou-se a dizer que cumprira a Constituição e que suas posições só serão manifestadas caso novo recurso caia em suas mãos.

Izar conversou com Grau sobre as críticas do relator do caso no conselho, Júlio Delgado (PSB-MG), às decisões do ministro e concluiu que os comentários foram inadequados:

- Não havia necessidade de fazer aquelas críticas.

Grau: STF também tem função política

Grau admitiu que o STF cumpre também uma função política, além da jurídica. Explicou que a atuação do tribunal está distante da atividade partidária, mas seria política ao levar em consideração as repercussões dos temas na sociedade:

- Este é um tribunal político, pois todos nós somos políticos. Não no sentido político-partidária. Neste tribunal temos que considerar a Constituição, que é um pedaço da realidade.

Izar foi ao Supremo acompanhado dos deputados Carlos Sampaio (PSDB-SP) e Nélson Trad (PMDB-MS). Um dos mais ácidos nas críticas ao Supremo, o deputado Edmar Moreira (PFL-MG), foi vetado na comitiva. E alfinetou:

- Eu queria ir, mas me disseram que eu era persona non grata por lá. Eu acreditava em Papai Noel e que não havia juízes corruptos. Não acredito mais.

No texto levado ao ministro, Izar disse que o relatório de Delgado fora reformulado, com a supressão de trechos que citavam provas emprestadas da CPI. Por isso, não seria necessário reescrever o documento.

Incluir Quadro: O valerioduto e suas ramificações - Pela Polícia Federal - Pelas CPIs

Legenda da foto: RICARDO IZAR (à direita), acompanhado dos deputados Nelson Trad e Carlos Sampaio, deixa o STF após a reunião com o ministro Eros Grau