Título: Niterói, IDH alto e favelas em expansão
Autor: Fernanda Pontes
Fonte: O Globo, 04/11/2005, Rio, p. 14

População de comunidades carentes da cidade cresceu 103% em dez anos

Apesar de ter o maior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do estado, Niterói também não escapa do crescimento desordenado de favelas. O número de moradores de favelas aumentou 103% em uma década, de 1991 a 2000, segundo o Censo do IBGE. Enquanto isso, a população de áreas urbanizadas caiu 0,5%. As ocupações irregulares já tomaram conta de encostas verdes e ameaçam três Áreas de Proteção Ambiental (APA) do município.

Um dos casos mais graves é o Morro do Preventório, em Charitas, onde os barracos de alvenaria já chegaram próximo dos limites do Parque da Cidade. Em Boa Viagem, as construções irregulares do Morro do Palácio já podem ser vistas do Museu de Arte Contemporânea (Mac), um dos cartões-postais da cidade.

Ministério Público recebe uma denúncia por semana

Dados do Censo mostram que Niterói tinha, em 2000, 50. 632 pessoas vivendo em 43 favelas, o equivalente a 11% da população. Em 1991, eram apenas 25 comunidades carentes com 24. 843 moradores. A favelização da cidade não poupou áreas verdes nem propriedades particulares. Segundo o promotor Augusto Vianna, o Ministério Público recebe pelo menos uma denúncia de ocupação irregular por semana:

- Ficamos sabendo que há uma invasão dentro do Parque da Cidade. As construções do Morro do Preventório, que fica dentro da APA (Área de Proteção Ambiental) da Viração, também estão bem próximas dos limites do parque.

A expansão do Morro do Preventório é evidente e contrasta com mansões luxuosas de São Francisco e de Charitas. Há cinco anos, eram 1.353 moradores, mas hoje são 7.800, segundo o programa Médico de Família.

- A encosta ainda têm muitas áreas livres para se construir. Os barracos avançam em ritmo acelerado em direção ao Parque da Cidade sem que ninguém faça nada. Com isso, as trilhas de acesso ao parque estão ficando comprometidas - afirmou o ambientalista Gehard Sardo.

A prefeitura de Niterói reconhece a pressão que existe para expansão da área favelizada. Mas, segundo o município, a construção de novas casas está sendo impedida graças a um trabalho articulado com a associação de moradores, que também prevê o reflorestamento de áreas degradadas.

Membro do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), Gehard Sardo também já denunciou outras ocupações irregulares em encostas e áreas verdes, como na Serra da Tiririca e no Morro das Andorinhas, na Região Oceânica. Todas as invasões estão em áreas de preservação ambiental.

O promotor Augusto Vianna afirma que a responsabilidade pelo controle do crescimento das favelas é do município.

- Em julho, por exemplo, a Justiça entendeu que a prefeitura deveria retirar 18 casas construídas irregularmente no topo do Morro do Cavalão - disse Vianna.

Crescimento vertical próximo ao Mac

Em Boa Viagem, um dos cartões-postais de Niterói, moradores do Morro do Palácio aproveitaram o buraco no muro de contenção para expandir os limites da favela. O espaço também está sendo usado como lixeira. Os detritos, com a chuva, descem pela encosta. A favela, que tem 2.798 habitantes, também cresce verticalmente. Os barracos com dois andares podem ser vistos do Mac.

- Não sei como podem permitir isso aqui numa das áreas mais valorizadas do cidade - disse a moradora de Icaraí, Adriana Correia, que costuma fazer exercícios nos arredores do museu.

No Barreto, na Zona Norte, a Comunidade Leopoldina, erguida há dez anos perto da linha ferroviária, vem ganhando novos barracos e moradores. O terreno, que antes tinha apenas construções abandonadas, está repleto de casas de alvenaria, que agora chegam perto da Avenida do Contorno.

Entenda o problema

O crescimento acelerado das favelas levou a Assembléia Legislativa (Alerj) e a Câmara de Vereadores do Rio a debater projetos para tentar conter as comunidades, criando mecanismos para facilitar as remoções em casos de necessidade obras ou de melhorar a infra-estrutura dos locais. A polêmica começou em setembro quando O GLOBO mostrou que foi construído um prédio de 11 andares na Rocinha. No Rio, o crescimento desordenado ocorre em toda a cidade: 16 comunidades já invadiram áreas de preservação ambiental. Uma auditoria do Tribunal de Contas do Município (TCM) pôs em xeque até o Programa Favela-Bairro que, segundo o órgão, não foi capaz de conter a expansão de favelas.

Legenda da foto: O GALPÃO onde já funcionou antiga estação ferroviária hoje está cercado por barracos, próximo da Avenida do Contorno, no Barreto