Título: EUROPA TEME QUE REVOLTA SE ESPALHE
Autor: Deborah Berlinck
Fonte: O Globo, 06/11/2005, O Mundo, p. 38

Condições de imigrantes no continente criam possibilidade de explosão social

As centenas de carros incendiados na periferia de Paris lançaram também sombras sobre grande parte da Europa. A revolta de imigrantes contra as autoridades francesas, ou contra a sociedade francesa como um todo, ameaça se espalhar por outros países do continente. Para estudiosos, mais importante do que o temor das autoridades em relação às ondas de pessoas que tentam emigrar de fora para o continente é tentar é integrar à sociedade milhões de pessoas que já moram na União Européia e se sentem cidadãs de segunda classe.

¿ Nem o sangue derramado por muçulmanos do Norte da África lutando com uniformes franceses durante as guerras mundiais nem o suor dos trabalhadores migrantes, vivendo sob condições deploráveis, que reconstruíram a França e a Europa ganhando quase nada depois de 45, fizeram com que seus filhos fossem cidadãos com plenos direitos ¿ disse, num seminário realizado antes do início dos distúrbios, o acadêmico francês Gilles Kepel.

O problema está sendo sentido em vários países. E se torna visível em locais tão distantes quanto a Pequena Karachi, bairro da capital norueguesa Olso; na ¿Cidade Satélite¿ de Amsterdã, localidade que ganhou esse nome porque as TVs da região estão sempre em canais árabes como a al-Jazeera; na Cova da Moura, bairro proletário de Lisboa; ou na capital britânica, chamada ironicamente, ou de modo preconceituoso, de Londonistão.

As políticas dos governos em relação aos imigrantes sempre foram diferentes entre si. A França se caracteriza por uma tentativa de assimilação, que fica mais clara na política de secularização do espaço público. Em Reino Unido e Holanda, apregoava-se o multiculturalismo, permitindo que as culturas dos países de origem fossem vividas pelos imigrantes. No modelo segregacionista alemão, até mesmo aos filhos dos turcos imigrados para os trabalhos braçais era negada a cidadania alemã.

Mas todos os modelos demonstram falhas. Como resposta aos ataques em Londres, Madri e Amsterdã, as autoridades reagiram, avaliando que o excesso de liberdade cultural possibilitara as ações. Holanda e Reino Unido agora tentam aculturar os imigrantes. Até países mais abertos, como a Dinamarca, endureceram as leis de benefícios sociais para migrantes. Especialistas como Robert Leiken, diretor do Programa de Imigração do Centro Nixon, prevêem que isso pode provocar reações.