Título: CHIRAC ASSUME COMANDO DA CRISE
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Fonte: O Globo, 07/11/2005, O Mundo, p. 21

França vive madrugada mais violenta desde início dos distúrbios

PARIS

Depois de dez dias seguidos de violentos protestos pelo país, o presidente da França, Jacques Chirac, convocou ontem uma reunião do Gabinete de crise e garantiu que o restabelecimento da ordem é sua prioridade máxima. Segundo analistas, a decisão do presidente de intervir na crise dá a dimensão da proporção adquirida pela revolta nas ruas, já apontada como a maior registrada no país desde os conflitos de maio de 1968.

A madrugada de domingo foi a mais violenta desde o início dos distúrbios. Manifestantes destruíram pelo menos 1.300 veículos e atearam fogo a prédios públicos como escolas e ginásios. Pelo menos 300 pessoas foram detidas. A violência, que na região de Paris estava restrita aos bairros pobres da periferia, chegou ao centro da cidade e já se espalha por todo o país, da fronteira com a Alemanha à costa mediterrânea. Ontem à noite, em Grigny, na décima-primeira noite de distúrbios, dez policiais foram feridos a bala, segundo as autoridades, em enfrentamento com 200 jovens.

Num breve pronunciamento feito logo após o encontro ministerial, que reuniu titulares das principais pastas do governo, Chirac ressaltou que, antes de se implementar um programa de justiça social e igualdade de oportunidades, ¿a prioridade absoluta é o restabelecimento da segurança e da ordem públicas¿.

¿ A República está determinada, por natureza, a ser mais forte do que os que querem semear a violência ou o medo. Estes serão detidos, julgados e condenados ¿ sustentou o presidente, falando pela primeira vez em público sobre o tema.

A segurança pública havia sido deixada principalmente nas mãos do primeiro-ministro Dominique de Villepin e do ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, que até o momento não encontraram uma solução para a explosão de violência com complexas causas sociais, econômicas e raciais.

Para traduzir em ações as diretrizes apontadas por Chirac, o primeiro-ministro anunciou o reforço das medidas de segurança ¿onde for necessário¿ porque, segundo ele, não se pode aceitar a existências de áreas em que o Estado não esteja presente. O primeiro-ministro garantiu que os procedimentos judiciais serão acelerados para que todos os presos durante os conflitos sejam julgados o mais rapidamente possível.

Distúrbios chegam à Praça da República

Pelo menos 800 pessoas já foram detidas ¿ 300 delas somente na última madrugada. O principal foco da revolta continua sendo os bairros de imigrantes pobres de Paris e cidades vizinhas. Mas já chegou ao centro da capital, onde 32 automóveis foram incendiados na madrugada de ontem nas proximidades da Praça da República. No subúrbio de Evry, a polícia encontrou uma fábrica de coquetéis molotov com mais de 150 explosivos.

Nas primeiras horas da madrugada de domingo, duas escolas foram incendiadas no departamento de Essone, nos arredores de Paris, assim como um ginásio de dois mil metros quadrados em Noisy-le-Grand e um abrigo juvenil em Villeneuve-Saint-Georges. Em Seine-et-Marne, um caminhão foi queimado. Em Corbeil-Essones, um veículo foi atirado contra uma filial do McDonald¿s, mas não houve feridos.

Em Toulouse, no sudoeste do país, mais de 20 carros foram queimados. Nos arredores de Lyon, a polícia contabilizou mais de dez veículos incendiados. A região norte é uma das mais afetadas, com incêndios de carros em Lille ¿ onde um ônibus também foi queimado ¿, Roubaix, Tourcoing e Mons. No sul, em Marselha e cidades próximas, como Cannes e Nice, bombeiros foram apedrejados.

Cerca de 2,3 mil policiais foram destacados para garantir a segurança da população, além de sete helicópteros que sobrevoaram a região de Paris durante a noite, filmando os distúrbios e direcionando os esquadrões móveis. Os esforços do governo, no entanto, não evitaram a violência. Para a oposição, os distúrbios revelam o fracasso das políticas públicas.

Os tumultos são causados por grupos formados, em sua maioria, de jovens franceses descendentes de imigrantes africanos e muçulmanos inflamados por desemprego, pobreza e falta de acesso a educação e moradia.

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