Título: Poleto cai em contradições e tem prisão pedida
Autor: Alan Gripp/Demétrio Weber
Fonte: O Globo, 11/11/2005, O País, p. 10

Ex-assessor de Palocci em Ribeirão Preto só não deixou Congresso algemado por causa de hábeas-corpus

BRASÍLIA. A CPI dos Bingos aprovou ontem requerimento pedindo a prisão do economista Vladimir Poleto, suspeito de transportar o suposto dinheiro enviado pelo governo de Cuba para a campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002. Poleto depôs ontem e caiu em diversas contradições. Só não deixou o Congresso algemado porque depôs protegido por um hábeas-corpus. Para parlamentares da oposição, Poleto acabou tornando verossímil a denúncia da revista "Veja" sobre o suposto dinheiro cubano e deixou ainda mais frágil a situação do ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Seu ex-assessor tentou fazer um desmentido acusando o autor da reportagem, mas foi desmentido, se enrolou com inúmeras contradições e ainda confirmou a viagem do avião Sêneca transportando caixas que ele agora diz serem de uísque e não de dólares.

A CPI aprovou outro requerimento, enviando uma queixa-crime à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal para apurar a suposta entrada ilegal de dinheiro no país e o transporte de dólares no chamado caso Cuba. A prisão de Poleto foi pedida pelos mesmos crimes.

Poleto negou ter dado as declarações à "Veja" e alegou que, se falou, foi porque estava bêbado. Disse que não autorizou que a entrevista fosse gravada. Para desmentir o depoimento de Poleto, a revista pôs a gravação em seu site e o áudio foi reproduzido na sessão da CPI . Na fita, porém, Poleto não se mostra contrariado com as perguntas e não parece embriagado.

As contradições levaram os integrantes da CPI a aprovar os dois requerimentos.

- Essa gravação fala por si. É claro que o senhor Poleto está mentindo de maneira deslavada diante deste plenário - protestou o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).

Muito nervoso, Poleto iniciou seu depoimento lendo um relato de 12 páginas com sua versão para o caso Cuba. Ele confirmou que levou três caixas de uísque num avião Sêneca de Brasília para São Paulo, mas negou que elas continham dólares. O economista disse que pegou uma carona no Sêneca atendendo a uma oferta de um amigo, o também ex-assessor de Palocci Ralf Barquete, que lhe pedira o favor de transportar as caixas. Poleto negou ter recebido as caixas de um diplomata cubano.

- Foi do porteiro do prédio - afirmou Poleto, dizendo não lembrar do endereço onde pegou as caixas.

Depois, Poleto acusou o repórter Policarpo Júnior, da "Veja", de lhe coagir a dar a entrevista usando um dossiê com acusações profissionais e pessoais, além de fotos. O economista disse, então, ter cedido à pressão e ido ao seu encontro num hotel em Ribeirão Preto. E afirmou que, apesar de negar que tenha transportado os dólares, o repórter teria lhe dito que publicaria a história de qualquer maneira e que sua meta era "pegar o ministro Palocci":

- Ele (Policarpo) me disse: "A reportagem está pronta, quer você queira ou não".

Apesar de ter negado as declarações dadas ao repórter, Poleto depois considerou a possibilidade de ter dado de fato a entrevista por estar sob o efeito de álcool. Ele alegou que antes de se encontrar com o repórter tomara "umas cachacinhas" num churrasco e que, no hotel, bebeu alguns chopes:

- Nem me recordo se fiz realmente alguma declaração. Mas se fiz, essas declarações são falsas, fruto da coação que sofri e também do excesso de álcool.

CPI pôde ouvir parte da conversa

A versão foi contestada quando a revista avisou à CPI que tinha uma gravação com dez minutos, na qual Poleto resume ao jornalista as informações dadas ao longo de cerca de cinco horas de conversa.

"Hoje é madrugada de sábado. Estou aqui com Vladimir Poleto. Vladimir, você transportou dinheiro para o PT na campanha de 2002?", inicia Policarpo Júnior. "Não, absolutamente não", responde Poleto. O repórter insiste e pergunta o que lhe disseram que havia dentro das três caixas de uísque: "Que tinha dinheiro numa das caixas. Só isso", responde Poleto.

A conversa prossegue e Poleto conta que descobriu que carregava dinheiro depois que ganhou de presente uma garrafa do rum cubano Havana Club. O jornalista disse que tem a informação de que as caixas continham US$3 milhões e Poleto o corrige: "Não. O valor que me disseram era US$1,4 milhão".

Após a exibição da fita, os senadores aprovaram o requerimento para indiciar Poleto, que foi duramente criticado:

- Este depoimento é muito ruim para o ministro Antonio Palocci. Fica claro que existe entre ele, o Buratti, o Barquete, o Adermison (assessor) uma triangulação complicada - disse Tasso Jereissati.

JOGO DOS ERROS

Poleto disse que estava bêbado quando conversou com o jornalista da "Veja"

A entrevista, exibida na CPI, mostrou o economista falando com clareza, sem aparentar embriaguez

Poleto disse que foi coagido a falar e ameaçado pelo repórter

Na fita, ele responde às perguntas tranqüilamente

Poleto afirmou que o jornalista disse que ganharia o prêmio Pulitzer com a reportagem

Também disse, porém, que não se lembrava de nada porque estava bêbado

Poleto afirmou que o avião Sêneca deixou Viracopos rumo a Amarais porque o piloto queria abastecer com querosene

A CPI foi informada de que em Viracopos há querosene e desconfia que ele tenha tentado escapar da fiscalização de cargas (Amarais é um aeroporto menor)

Poleto disse que levou as caixas a pedido de Ralf Barquete

A CPI contesta o fato de um avião ser mobilizado só para carregar uísque (Jonny Walker) encontrado em supermercados

Legenda da foto: POLETO: " Se fiz essas declarações, elas são falsas, fruto da coação que sofri e do excesso de álcool"