Título: ALÍVIO MOMENTÂNEO
Autor: Merval Pereira
Fonte: O Globo, 12/11/2005, O País, p. 4

Uma vitória sempre é uma vitória, mas uma vitória apertada como a que o casal Garotinho obteve na noite de quinta-feira no Tribunal Regional Eleitoral do Rio pode dificultar a situação deles no Tribunal Superior Eleitoral, onde cabe recurso, e isso, segundo seus adversários, desgasta a candidatura de Garotinho dentro do PMDB.

Além de ter vencido pelo voto de minerva do presidente do TRE, os Garotinho, e os cidadãos de maneira geral, ainda tiveram que passar pelo constrangimento de ouvir comentários como o da desembargadora federal Vera Lúcia Lima e Silva, que votou contra a inelegibilidade com base em conceitos como "não é atribuição da governadora fiscalizar o dia-a-dia da aplicação de cada programa social de seu governo".

E fez ironias do tipo: "No contexto em que estamos vivendo, com as denúncias de mensalão, a quantia (os R$318 mil apreendidos na sede do PMDB em Campos sem origem comprovada) deixou de ser vultosa e passou a ser módica". Seu voto provocou murmúrios de revolta entre os advogados presentes ao tribunal, e fez com que o advogado Ivan Nunes Ferreira, que votou contra Garotinho, balançasse a cabeça em desaprovação.

O risco do casal no TSE ainda é grande, se lembrarmos que recentemente o senador João Capiberibe, do Acre, teve o mandato cassado por comprar dois votos a R$26. Com muito mais razão a Justiça Eleitoral teria que ser austera com os R$318 mil que a desembargadora Vera Lúcia Lima da Silva considerou quantia "módica". Garotinho ontem se dizia "aliviado em parte". Mas ele acha que a vitória apertada não vai influenciar o resultado do TSE, "porque aqui a votação estava muito apaixonada".

Na análise de seus assessores, é difícil que o TSE altere o resultado de um tribunal regional. Além do mais, como o recurso vai demorar, provavelmente a decisão do TSE sairá depois das prévias do PMDB, no início de março de 2007. Se Garotinho ganhar a indicação da legenda para disputar a Presidência da República, será politicamente mais difícil o TSE puni-lo. O resultado do TRE trouxe alívio a Garotinho, que ficaria inviabilizado em caso de derrota: "Ia ficar muito complicado eu sair pedindo voto com a possibilidade de inelegibilidade, mesmo podendo recorrer", admite.

Ele faz as contas e diz que do dia 19 de outubro, quando se inscreveu candidato, até hoje, já visitou 30 cidades em menos de 20 dias. Ontem estava em Goiânia, almoçando com o governador Íris Rezende e com o senador Maguito Vilela, e iria ainda a Jataí e Anápolis. Sua média tem sido visitar quatro cidades por dia. Ele diz que a tese da candidatura própria "é irreversível", embora isso não signifique que seja ele a opção do comando do partido. Ao contrário, ele quer ganhar as prévias para dificultar a ação da cúpula partidária, que trabalha contra sua candidatura. Para isso, a indefinição de outros candidatos para se inscrever nas prévias também o favorece.

O governador Germano Rigotto, do Rio Grande do Sul, pode até se candidatar, mas na sua avaliação, em janeiro "vai sair atrasado". "Não dá tempo de fazer campanha. Nesse ritmo em que estou indo, vou chegar em 5 de março tendo visitado quase 200 cidades", resume Garotinho. Assim, foi dele a idéia de realização das prévias, porque sabia que só teria chance de sair candidato no PMDB se o sistema de escolha fosse fora do usual.

Para bombardeá-lo, começaram a ampliar muito o colégio eleitoral, que hoje já engloba cerca de 20 mil votantes entre vereadores, presidentes de diretórios municipais, prefeitos, vice-prefeitos, deputados estaduais e delegados à convenção. Garotinho conseguiu então que o PMDB ponderasse o peso eleitoral de cada estado, para que estados como Minas, por exemplo, que tem muitos municípios, não desequilibrasse o resultado final.

Garotinho acha que vai disputar o segundo turno da eleição do próximo ano com o PSDB. Perguntado se considera que o PT está morto, Garotinho saca uma frase do primeiro-ministro britânico Winston Churchill: "A diferença entre a guerra e a política é que na guerra você morre uma vez só". Para ele, o PT não está morto, mas está difícil se explicar com o eleitorado. "Lula tem muito destaque porque é o presidente, mas na campanha eleitoral, com o debate, o contraditório, ele não tem como se explicar".

Garotinho vê também dificuldades logísticas para uma eventual campanha presidencial de Lula: "Ele tem que construir nesse pouco tempo um novo núcleo de campanha. O núcleo básico dele foi o Duda Mendonça na parte de propaganda e marketing; José Dirceu cuidando da articulação política e das alianças; o Genoino tocando a máquina partidária junto com o Dirceu e o Palocci coordenando. Está todo mundo alvejado, como se ele tivesse um exército com todo mundo ferido".

A utilização de metáforas militares parece demonstrar que Garotinho está pintado para a guerra, mas ele recusa a caracterização: "Nesta eleição, quem vai ser o 'Paz e Amor' vai ser o Garotinho. Vou deixar o PT brigar com o PSDB e vou ficar no meio". Para tanto, Garotinho está montando uma estrutura no Rio e em São Paulo. Dividiu os estados em distritos, e em cada distrito desses tem uma pessoa de sua confiança que está coordenando o processo politicamente.

São Paulo é decisivo, tanto nas prévias do PMDB quanto depois, na eleição, e ele está concentrando 50% de suas viagens lá, no interior e na capital. Pelo seu raciocínio, precisa ter em São Paulo os cerca de 3 milhões de votos que teve em 2002 para, com a votação do Rio, anular a vantagem que os candidatos Lula e Serra terão sobre ele em São Paulo. Na última eleição, a vantagem que o Serra teve sobre ele em São Paulo, ele anulou no Rio. Aí a decisão ficaria para o resto do país. (Continua amanhã)