Título: JOAQUIM LEVY TROCARÁ TESOURO POR CARGO NO BID
Autor: José Meirelles Passos/Regina Alvarez/Martha Beck
Fonte: O Globo, 12/11/2005, Economia, p. 31

Secretário foi indicado para vice-presidência ocupada por João Sayad, mas inicialmente deverá ir para uma gerência

BRASÍLIA. O secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, deixará o cargo e deve assumir um posto no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em Washington. Há cerca de 40 dias, Levy manifestou ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci, o desejo de assumir a vice-presidência de Finanças e Administração do BID. Com a concordância de Palocci, Levy foi indicado para o cargo pelo ministro Paulo Bernardo, que é o governador do Brasil junto à instituição. Na próxima quarta-feira, o secretário terá uma primeira reunião com o presidente do BID, o colombiano Luiz Alberto Moreno, mas não deverá ser confirmado agora na vaga que almeja.

Levy deve ser acomodado inicialmente em um cargo menos expressivo, a gerência de Planejamento Estratégico, para um período de testes, e não há ainda garantia de que ocupará no futuro a vaga do brasileiro João Sayad, ex-ministro do Planejamento, na vice-presidência de Finanças e Administração, cargo que é da cota do Brasil na instituição. Desgastado pela derrota na sucessão de Enrique Iglesias - que estava há 17 anos na presidência do BID - Sayad ficou em uma situação delicada no cargo de vice-presidente da instituição e decidiu que deixará o BID até abril.

Já o secretário do Tesouro nunca teve uma posição muito confortável no governo Lula, embora conte com o apoio do ministro da Fazenda. Desde que assumiu o cargo, em janeiro de 2003, Levy enfrenta o bombardeio de setores do PT, que consideram o secretário do Tesouro a personificação da política econômica neoliberal adotada pelo governo.

Brasil pode ter participação na instituição reduzida

O próprio presidente Lula tem restrições ao secretário do Tesouro, mas o bom momento da política econômica e o prestígio de Palocci no governo criaram uma espécie de blindagem em torno de sua equipe. Com a crise avançando em direção ao Ministro da Fazenda, essa blindagem começa a perder efeito. Até mesmo Palocci ameaçou deixar o cargo depois das duras críticas da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, à política econômica.

O secretário do Tesouro está no exterior fazendo uma rodada de contatos com investidores. Ontem ele estava em trânsito de Tóquio para Paris. O Ministério da Fazenda confirmou, no início da noite, o encontro de Levy com o presidente do BID, informando que o secretário foi sondado para integrar a instituição, mas ainda não tomou a decisão de deixar o Tesouro. O governo não quer se antecipar ao BID na confirmação da ida de Levy para Washington.

Com o troca-troca de cargos no BID, decorrente da mudança no comando da instituição, o Brasil perdeu espaço e pode ter a sua participação em postos-chave ainda mais reduzida. Ontem, o presidente do BID anunciou que a Gerência do Departamento Regional de Operações I, que era ocupada pelo brasileiro Ricardo Santiago, irá para o argentino Manuel Repoport. Santiago foi transferido para Paris a pedido, porque pertence aos quadros do BID, mas a gerência que ocupava em Washington era considerada cota informal do Brasil.

Na eleição para a presidência do BID, realizada em julho último, o governo brasileiro recusou-se a fazer um acordo e retirar a candidatura de João Sayad, mesmo quando já havia evidências de que o colombiano Luiz Moreno, apoiado pelos Estados Unidos, venceria a eleição.

Essa atitude acabou provocando desgaste para o próprio Sayad e para o governo Lula. O candidato brasileiro contou com o apoio de Iglesias na eleição, a partir de um acordo fechado com o então presidente Fernando Henrique Cardoso, o primeiro a anunciar o apoio a Iglesias para a reeleição de 2003. Mas isso não foi suficiente para alavancar a candidatura do brasileiro, que não conseguiu nem mesmo o apoio integral do Mercosul. O Uruguai e o Paraguai se alinharam com Moreno.

O cargo de João Sayad foi criado a partir de um acordo do Brasil com a cúpula do BID e foi ocupado no governo anterior pelo ex-ministro do Planejamento Paulo Paiva. Com as mudanças na cúpula da instituição, a Argentina tem pretensões de ocupá-lo a partir da saída de Sayad, o que inviabilizaria a indicação de Joaquim Levy.

COLABORARAM José Meirelles Passos, correspondente, e Martha Beck

Legenda da foto: JOAQUIM LEVY: seu nome foi indicado ao BID pelo ministro Paulo Bernardo a pedido do próprio secretário