Título: O manda-chuva da economia vira
Autor: Bernardo de La Peña e
Fonte: O Globo, 13/11/2005, O País, p. 8

Pela primeira vez, Planalto conclui que Palocci está vulnerável, o que pode abreviar sua permanência no cargo

BRASÍLIA. A disposição do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, de ir ao Senado no dia 22 dar explicações na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) sobre a economia do país e até mesmo falar da crise não está sendo suficiente para acalmar os ânimos da oposição ao governo. Tucanos e pefelistas, que já preservaram Palocci dos ataques por temerem turbulências na economia, agora enxergam no ministro a oportunidade maior de desgastar o governo. Os dois partidos só estão divididos sobre em qual das CPIs devem concentrar esforços para convocar o ministro ¿ na dos Bingos ou na dos Correios ¿ mas concordam que chegou a hora de expô-lo numa comissão que investiga corrupção no governo e no PT.

A oposição insiste na necessidade de que Palocci explique três pontos das denúncias que o levaram ao centro da crise política, acabando com a famosa blindagem: a relação com seus ex-assessores Rogério Buratti e Vladimir Poleto; a participação de seu irmão Adhemar Palocci em financiamentos irregulares de campanhas em Goiás; e o fato de empresas estatais investigadas pela CPI dos Correios estarem ligadas à sua pasta.

No Palácio do Planalto, a avaliação é que, pela primeira vez, o ministro da Fazenda está de fato vulnerável. O próprio presidente Lula já teria a percepção de que Palocci perdeu apoio político. Mesmo assim, considera o ministro fundamental, principalmente porque tem a habilidade como poucos para conseguir segurar os ataques do PT contra a condução ortodoxa da política econômica.

Governo tenta diminuir tensão

O temor no governo é que Palocci não sobreviva ao tiroteio do Senado. Lula mandou emissários do governo conversar com representantes da oposição para tentar diminuir a tensão. O próprio presidente avaliou sexta-feira à noite que, se perder Palocci, a oposição tentará transformá-lo no próximo alvo. Já há ministros que reconhecem de forma reservada que a sobrevida de Palocci no governo pode não ser longa.

O enfrentamento com Dilma foi um sinal claro da fragilidade interna de Palocci. Por isso, Lula resolveu agir e determinou que os aliados passassem a defendê-lo publicamente.

¿ Há um movimento de setores da oposição para fragilizar o ministro Palocci. A proximidade do período eleitoral faz com que nossos adversários façam ataques contra um dos principais marcos do governo Lula que é a economia ¿ diz o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP).

A mesma linha foi adotada pelo presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP):

¿ A oposição precisa ter responsabilidade. A condução tranqüila da economia é de interesse do país. Não podemos comparar a credibilidade de Palocci com a desses dois ex-assessores e com isso pôr em risco a estabilidade econômica.

A decisão no PSDB é torpedear o governo e não dar trégua nem na área econômica. Mesmo com Palocci indo à CAE, afirmou um parlamentar tucano, o foco será levá-lo à CPI do Fim do Mundo (a dos Bingos), única das três onde a oposição tem folgada maioria.

Mas a oposição mostra não temer mais grandes turbulências na economia. O líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia (RJ), defende a investigação dos episódios que envolvem o ministro na CPI dos Correios:

¿ Temos de focar nas estatais envolvidas no escândalo e no caso do irmão. O Palocci estava sendo blindado. Mas a partir das evidências, ele ficou ilhado. Quanto mais rápido vier ao Congresso, maior a probabilidade de distender o ambiente ¿ diz Maia, cobrando ainda o fato de o ministro ter adiado por cinco vezes sua presença na Comissão de Finanças da Câmara.

Para o vice-líder do PSDB na Câmara, Eduardo Paes (RJ), o ministro terá de dar explicações em uma das CPIs:

¿ Acho que ninguém no Brasil, nem o presidente da República ou o ministro da Fazenda, está imune a prestar contas à sociedade e às leis. Por conta disso, ele (Palocci) ainda vai ter de se explicar muito nas CPIs.

O líder do PFL no Senado, José Agripino Maia (RN), diz que, se o ministro for convocado, terá de ser pela CPI dos Bingos, mas pondera que a ida dependerá do desempenho no Senado.

¿ Depende do que ele vai dizer. Mas dificilmente terá argumentos suficientes para desmontar coisas como a versão apresentada por Poleto (que alegou só ter admitido ter transportado dinheiro vindo de Cuba para a campanha petista porque estava bêbado).

Petista quer conter oposição

Para Agripino, não há um interesse específico da oposição em investigar o ministro, mas o governo Lula. Sub-relator da CPI dos Correios, o deputado ACM Neto (PFL-BA) concorda:

¿ Devemos focar para caracterizar a responsabilidade do Lula em todo esse episódio. O que não quer dizer que seja para fazer o impeachment. Isso pode ser feito sem passar pelo Palocci. Ele não precisa servir de trampolim. Mas também não quer dizer que ele tenha de ser poupado ou que não seja investigado.

Para o prefeito de Aracaju, o petista Marcelo Déda, é preciso conter a oposição no ímpeto de atacar o ministro Palocci. Interlocutor freqüente do presidente Lula, Déda concorda com a tese de que existe um empenho para desestabilizar o governo. Ele avalia que, depois de ter atingido o ex-chefe da Casa Civil José Dirceu, a estratégia é enfraquecer ainda mais Lula ao mirar no titular da Fazenda.

¿ A oposição só pensa em 2006 e trabalha com a tese do quanto pior, melhor. Palocci virou o novo alvo. Isso tudo é movimento eleitoral. A ordem é bater. O que importa é desestabilizar o governo ¿ diz Déda.

Mesmo assim, para o prefeito petista não deve existir relação entre os ataques externos e o debate sobre ajustes na política econômica. Ele defendeu a posição da ministra Dilma Rousseff de forçar uma execução orçamentária maior.

¿ São coisas distintas, que não se confundem. Uma coisa é envolver Palocci para atingir o coração político do governo. A oposição resolveu contaminar a economia com a crise. Agora, há uma legítima preocupação interna da ministra Dilma com a retomada das ações de governo. Ela expressa apenas a pressão que recebe no governo por resultados concretos na retomada do crescimento ¿ observa Déda.

O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio, é irônico ao falar do ministro Palocci:

¿ Ando chateado com esse lado ribeirão-pretano dele. O lado do governo é o que tem de melhor. O ideal para mim seria que ele se dividisse ao meio.