Título: A conexão da máfia na Alerj
Autor: Antônio Werneck e Carla Rocha
Fonte: O Globo, 10/11/2004, Rio, p. 13

Acusado de ser o cabeça da máfia do combustível no Rio, o empresário Renan de Macedo Leite é um simples servidor público. Apesar de ser ou de ter sido sócio de pelo menos 13 empresas, das quais oito são postos de gasolina, ele estaria batendo ponto diariamente na Assembléia Legislativa do Rio (Alerj) por um salário líquido de R$ 2.861. Em 6 de julho deste ano, foi nomeado para um cargo comissionado no gabinete do deputado Domingos Brazão (PMDB). Pode ser o elo para dar início a uma investigação da Polícia Federal sobre a ligação da quadrilha com o Legislativo estadual e até mesmo federal.

¿ Poderá ser uma vertente da investigação da Polícia Federal. As informações parecem consistentes ¿ disse o delegado Cláudio Nogueira, responsável pela investigação.

A lotação de Renan no gabinete do peemedebista é apenas o fio da meada. O empresário também é sócio do Auto Posto e Serviço Bam Bam Ltda, que cedeu um Dodge Dakota, placa LNL-0195, para a eleição do mais novo representante do clã Brazão na política fluminense. O carro com um adesivo de campanha foi usado no corpo a corpo de cabos eleitorais do vereador eleito Chiquinho Brazão (PMDB), irmão de Domingos. Na prestação de contas da campanha que acabou de entregar ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE), Chiquinho afirma ter recebido mais R$ 10 mil de Renan.

Deputado diz que não vai exonerar assessor

O deputado Domingos Brazão se disse surpreso com a prisão de Renan, a quem se referiu como um amigo de mais de 20 anos. Segundo ele, os dois foram criados juntos na Zona Oeste. Brazão disse que Renan se engajou fortemente na campanha de seu irmão e por isso o nomeou para o cargo comissionado.

¿ A vida dele (Renan) é outra. É claro que não precisa desse dinheiro, mas achei que deveria ter um vínculo político comigo por causa do belo trabalho social que ele faz para a comunidade de Ramos ¿ disse Brazão, referindo-se ao lugar onde Renan teria um posto e realizaria trabalhos sociais. ¿ Acredito na inocência dele. Não vou agora ser demagogo e exonerá-lo com data retroativa, como fariam outros políticos.

Investigando a máfia que adultera gasolina há alguns anos, a deputada Cidinha Campos (PDT) reuniu uma série de documentos sobre as ligações da máfia do combustível na Alerj, que entregará ao presidente da Casa, Jorge Picciani (PMDB).

¿ O homem acusado de ser o cabeça da máfia está dentro de um gabinete da Alerj. Além disso, ele tem sócios que contribuíram para outras campanhas de deputados estaduais, alguns que inclusive já estão sendo investigados ¿ disse Cidinha Campos. ¿ Assim como a CPI da Loterj, a CPI dos Combustíveis na Câmara (dos Deputados, em Brasília) também não investigou ninguém. Eles convocavam as testemunhas e desconvocavam.

Documentos revelam que, de fato, Renan também tem ligações com outros parlamentares do Rio. Além de trabalhar para Brazão, sócios do empresário em postos de gasolina, como Domingos Gonçalves dos Santos, um dos donos do Bam Bam e de outros postos de gasolina, doou R$ 5 mil para a campanha do deputado federal André Luiz (PMDB), que tem base no Rio e já foi do Legislativo estadual. Prova do bom trânsito de Domingos na Alerj é que ele ganhou a mais alta honraria da casa, a Medalha Pedro Ernesto, por indicação de outro parlamentar, Ely Patrício, atualmente sem partido.

O Posto Bam Bam também fez doação de R$ 4 mil para o mesmo André Luiz. Um outro sócio de Renan no mesmo posto, Vilarino dos Santos Gomes, ainda contribuiu com R$ 5 mil para ninguém menos do que a deputada estadual Eliana Ribeiro (PMDB), mulher do parlamentar. André Luiz está no momento no olho de furacão na Câmara de Deputados, ameaçado de cassação por envolvimento num escândalo: ele teria tentado extorquir R$ 4 milhões do empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, para retirá-lo do relatório final da CPI da Loterj na Alerj.

Durante a operação Poeira no Asfalto, realizada pela Polícia Federal anteontem, quando foram presas 42 pessoas, foram capturados, além de Renan, os empresários Paulo Roberto Prette e Sidmar Ribeiro da silva. Eles comandariam o esquema que contaria com a participação de policiais rodoviários federais, fiscais da Receita estadual e da Feema. Com escutas autorizadas pela Justiça, a polícia reuniu provas de que o grupo viria há pelo menos cinco anos adulterando combustível e sonegando impostos, causando um prejuízo de R$ 5 bilhões anuais.