Título: DIÁRIO DA ÁSIA
Autor: JOAQUIM LEVY
Fonte: O Globo, 17/11/2005, Economia, p. 29

O Tesouro Nacional completou na semana passada mais um circuito de contatos (roadshow) na Ásia, dentro da sua estratégia de ampliação da base de investidores na dívida pública mobiliária federal. Houve reuniões em Cingapura, Hong Kong, Seul e Tóquio. Entrementes, houve uma emissão de títulos do Tesouro, que foi pioneira entre países emergentes, ao ser aberta no horário da Ásia e atrair nova classe de investidores.

Investidores e analistas estão impressionados com o desempenho brasileiro nos dois últimos anos. No Brasil, consideramos que o nosso crescimento é baixo em relação ao do resto do mundo e nos inquietamos. Lá, observa-se que a melhora macroeconômica não é universal, nem mesmo na Ásia, como ilustram os casos das Filipinas e da Indonésia e outros países que, apesar do ambiente internacional favorável, têm apresentado deterioração em setores-chave. No Brasil, o crescimento pode ser moderado, mas continuamos construindo com segurança novas pontes para o futuro.

A disposição dos investidores mudou com respeito a investir no Brasil. Com o terceiro ano de queda da relação dívida/PIB, os bancos mais sofisticados vêm conduzindo análises internas de risco que parecem se antecipar às das agências de risco tradicionais, o que os tem permitido investir em papéis privados e da República, apesar dos ratings ainda baixos desses títulos. Isso pode ter um impacto enorme no investimento no Brasil. O país é um dos poucos em que se emitiram recentemente ações de ferrovias, companhias de energia e mesmo de aviação (o país não tem uma aerovia oficial). Esse é um canal excelente para os investidores aumentarem sua exposição na infra-estrutura no Brasil, ajudando a financiar o investimento nesses setores. Para acelerar esse movimento, o governo, a BM&F e a Bovespa realizarão seminários especiais em Hong Kong e Cingapura em dezembro.

O importante é que a firmeza percebida no governo e no presidente Lula em consolidar, em face dos desafios dos últimos meses, os pilares estabelecidos em 2003 para a área econômica tem contribuído para diminuir o sentimento de fragilidade que tantas vezes cerca bons resultados no Brasil. Cem mil novos empregos por mês e uma lucratividade das empresas como não se via há 20 anos ganham, assim, uma dimensão de movimento, ainda incipiente, mas que não se extinguiria nos pródromos eleitorais ou no próximo mandato.

Essa mudança de sentimento é notável para quem tem viajado nos últimos cinco anos. É um enorme contraste com as preocupações que foram se acumulando com a deterioração política no começo de 2001 e a crise energética que se seguiu. São portas que se abrem, se o país continuar fazendo escolhas que gerem riquezas e que permitam a emergência de uma nova "marca" Brasil, que permita nos posicionar com sucesso na concorrência mundial.

Um exemplo da nova atitude lá fora foi a sabatina sobre economia brasileira e perspectivas fiscais organizada por um grande banco em Tóquio, com a presença de uma quarentena de analistas de grandes instituições financeiras e indústrias. O mais encorajador foi perceber que essas empresas estavam investindo para formar uma nova geração de funcionários que estão conhecendo o Brasil como um país "arrumado" e não campeão da inflação e dos gastos públicos desregrados. Um país exportador, com programas sociais focados, e com o óbvio potencial de inclusão e bem-estar que pode ser alcançado com a manutenção de um crescimento per capita (e.g., 3,2% ao ano) duas vezes maior que a média dos últimos 15 anos.

JOAQUIM LEVY é secretário do Tesouro Nacional