Título: Palocci critica, Lula elogia
Autor: Mônica Tavares/Gerson Camarotti/Luiza Damé
Fonte: O Globo, 18/11/2005, O País, p. 3

Um dia depois de ministro reagir à colega Dilma, presidente é só afagos a ela

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva evitou fazer novamente ontem uma defesa pública do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, bombardeado por denúncias de corrupção quando era prefeito de Ribeirão Preto e afrontado pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, na polêmica sobre ajuste fiscal de longo prazo. Durante solenidade sobre biodiesel, no Planalto, Lula não fez referência a Palocci no discurso, mas afagou Dilma, que estava magoada com o colega. Ela não gostou da crítica de Palocci que, no depoimento da véspera na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, afirmara que ela está errada na discussão sobre ajuste fiscal.

Dilma, que coordenou o projeto do biodiesel quando era ministra de Minas e Energia, participou da solenidade ao lado de Lula, que a citou cinco vezes em seu discurso. Lula ficou ao lado da ministra e, em vários momentos, cochichou com ela.

- Acho que a exigência do mundo, hoje, por opções de combustíveis vai exigir que ultrapassemos algumas etapas que estão previstas no projeto bem montado e bem coordenado pela companheira Dilma - disse Lula, que, no fim, acrescentou: - Muito obrigado, boa sorte e, companheira Dilma, meus parabéns.

Depois da solenidade, o presidente elogiou o desempenho de Palocci no Senado, mas só quando perguntado pelos jornalistas. Lula repetiu cinco vezes que Palocci "foi bem" no depoimento, mas desconversou ao ser perguntado se o ministro continua sendo o homem forte de seu governo:

- Toda vez que vocês criam um homem forte num dia, no outro querem derrubar - disse Lula. - Não consegui assistir (ao depoimento de Palocci) porque estava trabalhando aqui. Pelo que vi vocês escreverem, foi bem.

Ministra amanhece irritada com Palocci

A ministra, segundo fontes do governo, amanheceu muito irritada com as críticas de Palocci, mas, antes do discurso de Lula, foi acalmada por interlocutores acionados pelo Planalto. O próprio Lula entrou em campo, antes do discurso, para tranqüilizá-la e evitar um contra-ataque, o que poderia causar novo grande estrago ao governo. A assessores, a ministra demonstrou mágoa. O próprio Lula conversou com ela e pediu calma:

- Segure as pontas!

Lula não foi o único a atuar como bombeiro. No início da manhã, o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), foi dos primeiros a ligar para a ministra. Numa conversa franca, pediu para ela entender o contexto das declarações de Palocci e argumentou que era necessário que o titular da Fazenda usasse aquele tom.

O ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner, também pediu calma à ministra. Nos bastidores, Dilma recebeu a solidariedade de vários petistas, inclusive do presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (PT-SP). O partido está convencido que é preciso apoiar a posição de Dilma para forçar um debate interno que possa flexibilizar a política econômica.

No almoço que teve ontem no Planalto com os presidentes da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e Jaques Wagner, Lula disse que tinha conseguido acalmar os ânimos.

- Lula disse que Dilma entendeu a posição de Palocci - contou Renan.

Aos dois parlamentares, Lula disse que assistiu até tarde ao depoimento de Palocci e que ficou muito satisfeito com o desempenho do ministro da Fazenda - ao contrário do que dissera aos jornalistas no Planalto. O presidente também elogiou a condução política da sessão.

COLABOROU Mônica Tavares

www.oglobo.com.br/pais

O presidente que afaga é o mesmo que se cala

O comportamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem oscilado no embate entre a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, em torno da proposta de ajuste fiscal de longo prazo. Lula evitou dar uma reprimenda pública na ministra quando ela atacou publicamente a proposta feita por Palocci e pelo ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. A chefe da Casa Civil classificou de rudimentar a proposta de ajuste fiscal em estudo na área econômica do governo.

Em reuniões e conversas com ministros e assessores diretos, Lula reclamou das declarações de Dilma e decidiu que faria uma defesa pública de Palocci, mas não fez isso ainda em discurso ou entrevista. Apenas divulgou uma nota no sábado afirmando que não estuda mudar a política econômica nem o ministro da Fazenda. Depois disso, Lula já teve oportunidade de defender Palocci no programa semanal de rádio "Café com o presidente" e em duas solenidades públicas, mas não o fez.

Antes da crise, era comum o presidente se dirigir a Palocci com deferência especial: chegou a dizer que os dois eram como "unha e carne".

Durante a preparação de Palocci para o depoimento na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, Lula avalizou o discurso dele contra Dilma. Palocci criticou publicamente a posição da ministra, dizendo que ela estava errada nesta questão. Dilma, magoada, queixou-se com o presidente. Menos de 24 horas depois, no primeiro discurso depois da ida de Palocci ao Senado, Lula disse apenas que ele foi muito bem. Os elogios ficaram para a chefe da Casa Civil, parabenizada por ele na solenidade do projeto do biodiesel, uma proposta implantada por Dilma quando ela era ministra de Minas e Energia.

Legenda da foto: ... DESTACOU o trabalho da ministra, embora tenha deixado de fazer a esperada defesa do ministro