Título: MENSALÃO NA RECONSTRUÇÃO DO IRAQUE
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Fonte: O Globo, 18/11/2005, O Mundo, p. 34

Empresário teria pagado suborno a americanos para obter contratos

Acossado pelos piores índices de popularidade de seu governo, o presidente George W. Bush tem agora de lidar com mais um escândalo de corrupção na reconstrução do Iraque. A denúncia foi feita no Tribunal Regional Federal do Distrito de Columbia, nos Estados Unidos, pela Inspetoria-Geral Especial para a Reconstrução do Iraque, segundo a qual um empresário americano pagou mensalmente centenas de milhares de dólares a funcionários do governo provisório de ocupação para obter contratos milionários.

A ação deve ser a primeira de várias na Justiça - as autoridades estão investigando um esquema que teria dado origem a pelo menos uma dezena de casos semelhantes - e ocorre no momento em que o presidente George W. Bush enfrenta a maior taxa de impopularidade de seu governo. No caso divulgado ontem, o empresário Philip Bloom, dono de três firmas que participaram da reconstrução do Iraque, é acusado de subornar - com pelo menos US$200 mil por mês - funcionários americanos e seus cônjuges, e também de fraude, conspiração, lavagem de dinheiro e transporte ilegal de propriedade roubada. O motivo seria a obtenção de contratos fraudulentos de US$3,5 milhões.

A acusação envolve pelo menos dois funcionários da Autoridade Provisória da Coalizão, a entidade governamental criada pelos EUA para administrar o Iraque logo após a invasão em 2003.

- Este é o primeiro caso, mas não será o último - disse Jim Mitchell, porta-voz da Inspetoria-Geral.

Segundo a acusação, Bloom entrava numa mesma licitação com várias empresas controladas por ele (inclusive algumas fantasmas) e depois os funcionários subornados asseguravam que uma delas fosse a vencedora. A Inspetoria-Geral diz que as propinas mensais foram confirmadas por uma testemunha iraquiana - que seria um dos criminosos - e "outras pessoas com conhecimento dos pagamentos, e por meio da revisão contábil".

A Inspetoria-Geral criticou a pressa em iniciar os projetos de reconstrução no Iraque logo após a invasão, o que teria aberto o caminho para que os contratos fossem concedidos com um mínimo de supervisão.

Em editorial, o jornal "The New York Times" disse ontem que o presidente George W. Bush perdeu um voto de confiança sobre a guerra no Iraque no Senado quando os senadores decidiram - por 79 votos a 19 - que o governo deve apresentar relatórios regulares sobre o conflito e ressaltaram que 2006 deve ser um ano significativo para a transferência de soberania aos iraquianos. Segundo o jornal, a proposta só foi adiante porque os próprios legisladores republicanos estão insatisfeitos com a situação no Iraque e querem marcar distanciamento da Casa Branca às vésperas de um ano eleitoral. O "Times" adverte para a possibilidade de uma fragmentação do Iraque e cobra de Bush um programa objetivo, que deixe claro a Bagdá a necessidade de garantir democracia e direitos humanos a todos os iraquianos. "O presidente Bush perdeu a confiança do povo americano, e de seu próprio partido, quando se trata do Iraque. Se a quer de volta, deve produzir um plano claro do que espera, tanto política como militarmente, do governo iraquiano."

Por sua vez, em seu mais contundente ataque aos críticos da guerra, o vice-presidente Dick Cheney disse que as acusações de que Bush manipulou as informações obtidas pela inteligência para justificar a invasão do Iraque são uma jogada política "desonesta e repreensível". Cheney chamou de oportunistas os democratas e disse que eles propagam "falsidades cínicas e perniciosas" para obter ganhos políticos. O vice lembrou que muitos democratas apoiaram a guerra em 2003.

- Não vamos deixar que eles se sentem e mudem a História - disparou Cheney, um dos principais arquitetos da guerra.

Em visita a Seul, Bush - cuja política para o Iraque é desaprovada por 63% dos americanos, segundo o Instituto Gallup - apoiou o vice.

- É irresponsável usar a política. É assunto sério ganhar esta guerra - argumentou Bush.

A resposta democrata veio rápido:

- Retórica cansada e ataques políticos nada contribuem para que o trabalho seja feito no Iraque - criticou o líder democrata no Senado, Harry Reid.

Com o New York Times

Nas garras da corrupção

HALLIBURTON: A companhia americana, que já foi dirigida pelo vice-presidente Dick Cheney, ganhou o maior contrato após a guerra, de US$2,3 bilhões. Uma auditoria feita pelo Pentágono mostrou que a empresa superfaturou em US$61 milhões um contrato para enviar gasolina do Kuwait ao Iraque.

PETRÓLEO POR COMIDA: O programa da ONU que assegurava ao Iraque de Saddam Hussein vender petróleo para comprar remédios e alimentos foi alvo de corrupção por seus gestores. Um inquérito internacional revelou que mais de 2.200 empresas pagaram US$8 bilhões em propinas a Saddam. Entre os envolvidos estavam o ex-ministro francês Charles Pasqua e o deputado inglês George Galloway.

Legenda da foto: DICK CHENEY: críticos da guerra no Iraque espalham "falsidades cínicas e perniciosas"