Título: Armas de fogo mataram 266 mil nos anos 90
Autor: Demétrio Weber
Fonte: O Globo, 11/11/2004, O País, p. 8
A taxa de mortalidade por arma de fogo cresceu em 20 estados e no Distrito Federal na década de 1990, quando 265.975 pessoas foram mortas por disparos no país. Estudo do Núcleo de Estudos da Violência da USP (Universidade de São Paulo) mostra que o aumento da taxa de mortalidade ao longo da última década alcançou 371% no Mato Grosso, 162% no Piauí, 146% em São Paulo e 110% em Tocantins. No Rio de Janeiro, ao contrário, houve redução de 9%. Mesmo assim, o estado ainda apresentava, em 2000, a segunda taxa mais alta do país: 41,2 mortos em cada grupo de 100 mil habitantes.
O Estudo Mortalidade por Armas de Fogo no Brasil 1991-2000 foi distribuído ontem, em Brasília, pelo Ministério da Saúde, que também lançou a Carta da Saúde pelo Desarmamento. A carta tem o apoio de secretários estaduais e municipais de Saúde e busca mobilizar os profissionais da área em defesa do desarmamento da população.
Recolhimento de armas deve durar mais seis meses
O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, que participou da divulgação da carta, disse que o governo pensa em editar uma medida provisória para prorrogar por mais seis meses o período de coleta de armas de fogo na Campanha do Desarmamento. A data prevista para o encerramento da campanha é 23 de dezembro e o governo quer estendê-la durante o primeiro semestre de 2005.
Segundo o estudo da USP, a taxa nacional de mortalidade aumentou 38% no período, de 14 para 19,4 mortos a cada 100 mil habitantes. Oito estados e 13 capitais, incluindo o Rio, apresentavam taxa mais alta do que a média nacional em 2000. Os gastos do Sistema Único de Saúde (SUS) com internações de vítimas de armas de fogo somaram R$ 6 milhões de janeiro a julho deste ano. Com pacientes internados por todas as causas de violência, inclusive acidentes de trânsito, chegou a R$ 397 milhões de janeiro a setembro.
Na cidade do Rio também houve redução, de 48,5 para 43,4 mortes a cada 100 mil habitantes, o terceiro indicador mais alto do país, atrás apenas de Recife (56,5) e Cuiabá (48,4). No ranking estadual, Pernambuco, a exemplo da capital Recife, também liderava, com 45,6 mortes a cada 100 mil habitantes.
O estudo não esclarece o que provocou a redução das taxas no Rio de Janeiro e em outros seis estados. Mas indica que a melhoria na qualidade das informações sobre mortes por disparos pode estar por trás dos súbitos aumentos. É o caso de Cuiabá, onde a taxa de mortalidade em 1991 era de 6,1 e subiu para 48,4 em 2000.
O ministro da Saúde, Humberto Costa, defendeu a mobilização do setor para proibir definitivamente o comércio de armas de fogo no Brasil, no referendo popular que será realizado em outubro do ano que vem. Indagado se essa era a posição do governo Lula, Costa respondeu:
¿ Posso dizer que é uma posição da área da saúde, uma posição óbvia. A saúde entende hoje que a violência é um tema de saúde publica que nos custa extremamente caro. Não apenas do ponto de vista das vidas que são perdidas, mas dos próprios gastos do SUS.
Até hoje, foram recolhidas 160 mil armas
Bastos lembrou que o governo já superou a meta de recolhimento de armas, fixada inicialmente em 80 mil. Segundo ele, até hoje já foram recolhidas 160 mil armas. A nova meta é 200 mil até o fim de dezembro. O ministro da Justiça lembrou que o foco da campanha é recolher as armas ¿dos cidadãos de bem¿ para evitar mortes fortuitas em discussões de trânsito ou em família. Bastos afirmou ainda que o desarmamento dos bandidos deve ser feito de em ações de polícia propriamente dita.
Segundo o Ministério da Saúde, 70% dos homicídios no país ano passado foram provocados por armas de fogo, totalizando 36 mil pessoas.
Bastos destacou que levantamentos já mostraram redução da violência em municípios onde houve forte adesão à campanha de recolhimento de armas. Para prorrogar a campanha, o governo terá de desembolsar mais recursos para pagar as indenizações de R$ 100 a R$ 300 por arma devolvida. Humberto Costa apóia a iniciativa.
¿ A campanha tem sido um sucesso, a população está cada vez mais engajada. Sabemos que há dificuldades operacionais e ainda há necessidade de um maior trabalho de conscientização.
Segundo Bastos, nas próximas duas semanas nove estados serão visitados por representantes do Ministério da Justiça com o intuito de instalar comitês pró-desarmamento, levando o programa a todas as unidades da Federação.