Título: Tambores tucanos
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Fonte: O Globo, 19/11/2005, O Globo, p. 2

Nada mais parecido com uma reunião petista do passado, com tambores rufando e gritos de guerra contra o governo de plantão, do que a convenção tucana de ontem, um ensaio para a batalha eleitoral de 2006. Falou-se muito na unidade representada pela eleição de Tasso Jereissati e na uniformização do discurso, mas ainda assim houve nítidas variações de tom dos discursos.

Essas variações expressam concepções diferentes sobre a conduta do PSDB na campanha: um grupo aposta mais nos ganhos com a derrocada do PT e seu linchamento. Outro acha que não se deve buscar a vitória no fracasso do PT, mas na apresentação de alternativas.

A escolha de Tasso Jereissati, do Ceará, para a presidência, e de Eduardo Paes (Rio), para a secretaria-geral, representa uma outra inflexão, alguma redução do peso dos paulistas e um perfil mais nacional para o partido. Da briga por essa mudança interna saíram vitoriosos, principalmente, o governador Aécio Neves, de Minas, e o próprio Tasso, do Ceará.

Em seu discurso, Tasso não deixou, como os demais, de espancar o PT e o governo Lula, pregando um choque de moralidade. Mas seu tom foi mais propositivo, apontando os problemas cruciais do país ¿ das questões econômicas às desigualdades sociais e regionais ¿ e a necessidade de o partido apresentar propostas para enfrentá-los. Olhando para 2006, distribuiu elogios aos aliados do PFL e do PPS que ali estavam (Bornhausen, Agripino e ACM em postos de honra). Na mesma linha foi o discurso de Aécio, para quem o partido deve se destacar na campanha pela demonstração de sua competência para governar, reivindicando o legado de Fernando Henrique e dos governos estaduais bem sucedidos, atuais e passados.

Tasso, Aécio e outros governadores parecem buscar uma moderação na guerra com o PT, não por compaixão ou conveniência, mas por entenderem que a beligerância atual será nociva a todos, inclusive a um eventual futuro governo tucano. ¿Se ganharmos, como seria a transição?¿, pergunta Aécio. E quem serão os interlocutores modernizantes na oposição, os petistas ou os chamados partidos podres?

Fernando Henrique, que andou afastado do cotidiano partidário por conta de seus compromissos, fez uma reentrada em grande estilo. Foi dele o melhor discurso, em se tratando de discursos de guerra. Foram dele os ataques mais duros a Lula, ao PT e ao governo, chegando a desafiar o presidente para que seja candidato, lembrando que já o derrotou duas vezes e tudo fará para que venha a terceira. Em sua entrevista de rádio, Lula atendeu a esse desejo admitindo a candidatura. Mas depois, disse que foi um lapso.

Em conversa, depois da convenção, FH disse que não pretende ser coordenador ou ter qualquer papel oficial na campanha mas que ajudará ¿fazendo discursos pelo país afora¿. Espera que o candidato seja escolhido por consenso, sem necessidade de prévias. O líder Arthur Virgílio também foi tão ou mais contundente mas perde, em estética e graça, para a oratória de FH, que fere como o florete. Os dois encabeçam a lista dos que preferem ou acham inevitável a batalha sangrenta.

Entre os pré-candidatos, Serra foi o que mais explicitou tal condição. Falou depois de Geraldo Alckmin e, ao contrário dos demais, fez questão de ler um discurso escrito. E nele, além dos ataques duros ao PT, que acusou de ter trocado a ¿a ética da responsabilidade pela ética da conveniência¿, abordou questões diversas que fizeram de sua fala uma verdadeira plataforma de governo.

O PSDB armado e reestruturado parece realmente mais unido (mas nem tanto) e mais nacional. Mas falta um teste importante, a escolha sem rachas do candidato a presidente. Isso deve ocorrer em março.

Estavam todos no palanque ontem. Tanto os tucanos, na convenção, como o presidente Lula, em sua entrevista a radialistas. Temos pela frente dez meses de campanha.

Lamentável

A não votação da MP 258, que criava a Super-Receita Federal, foi uma derrota do governo mas também da administração pública. Tendo conseguido aprová-la na Câmara, pela reorganização de sua antiga base, o governo mais uma vez ficou em minoria evidente no Senado. Em discurso na convenção de seu partido, o líder tucano Arthur Virgílio gabou-se da derrota imposta, embora tenha dito antes que o PSDB nunca deixou de ajudar o governo a aprovar uma medida importante para o país.

Esta era importante e, para a oposição, seu defeito estava apenas na forma com que foi proposta, a de MP. Isso é brincadeira: as MPs não foram inventadas pelo atual governo nem este fez uso delas mais que os anteriores. E por projeto de lei a medida não sairia tão cedo. Nem sairá.

Técnicos da Receita e da Previdência agora têm um grande problema pela frente, pois muitos procedimentos já estavam unificados. E o país perde a oportunidade de ter um sistema único de arrecadação, que ajudaria a combater fraudes e tornaria mais racional o sistema tributário que enlouquece as empresas, não apenas pela carga mas também pela burocracia.

NÃO FICOU BEM para o senador Efraim Morais (PFL-PB) ir à convenção dos tucanos. Como presidente da CPI dos Bingos, a do juízo final para o PT, devia guardar alguma distância da guerra partidária.

LULA explicitou o apoio a Palocci que tantos cobravam. Mas a discussão continua mal colocada. Dilma e os demais ministros não estão pedindo redução do superávit. Querem é que a Fazenda os deixe gastar, em tempo hábil, os recursos que sobram do ajuste fiscal.