Título: Relatório da CPI do Mensalão acaba no arquivo
Autor: Isabel Braga
Fonte: O Globo, 19/11/2005, O País, p. 13
Mesmo ignorando regimento, integrantes da comissão não conseguiram assinaturas suficientes para prorrogar trabalho
BRASÍLIA. O destino do relatório lido anteontem pelo deputado Ibrahim Abi-Ackel (PP-MG), relator da CPI do Mensalão, será o arquivo da Câmara dos Deputados. O documento não poderá sequer ser remetido oficialmente ao Ministério Público e à Polícia Federal. Mesmo com o aval do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e dos líderes na Câmara de ignorar a extinção regimental da CPI e dar mais um dia para a coleta de assinaturas, os integrantes da CPI não conseguiram garantir a prorrogação dos trabalhos por mais 30 dias. O requerimento foi entregue anteontem com apenas 148 assinaturas de deputados, 23 a menos do que as 171 exigidas pelo regimento interno.
Abi-Ackel chegou a ler seu texto para oito integrantes da CPI, mas a leitura não foi válida porque a extinção da comissão já havia sido publicada no Diário Oficial do Senado de 17 de novembro.
O presidente da CPI dos Correios, senador Delcídio Amaral (PT-MS), disse que não considera uma boa idéia a incorporação das investigações da CPI do Mensalão pela comissão que comanda, na forma de uma subrelatoria, como chegou a ser cogitado.
¿ Não acho bom. Estamos em fase de elaboração e aprovação de relatórios, apresentação de conclusões por parte das subrelatorias em dezembro, janeiro e fevereiro. Isso só vai atrapalhar ¿ disse.
Dirceu usará texto de relatório
Apesar do fracasso da CPI do Mensalão, o conteúdo do relatório de Abi-Ackel deverá ser usado pela defesa do deputado José Dirceu (PT-SP) no julgamento do processo de cassação de seu mandato.
¿ Como alguém pode ser condenado de ser o mentor do mensalão se a própria CPI não afirma a existência dessa prática? A conclusão do relator é o caixa dois. E Dirceu é acusado de ser o mentor do esquema de compra de votos ¿ disse o advogado do deputado, José Luiz de Oliveira.
O advogado vai ler o relatório para saber se há respaldo para alguma medida judicial que resguarde os direitos de Dirceu. O documento será usado pelo menos, na defesa em plenário, na votação do relatório do Conselho de Ética pela cassação. Além disso, diz Oliveira, o próprio desfecho da CPI ¿ criada para investigar as denúncias do mensalão e da compra de votos para aprovação da emenda da reeleição em 1996 ¿ também mostrou que não há provas da existência do pagamento de mesada a parlamentares da base.
Durante seus 120 dias, a CPI do Mensalão realizou 34 reuniões e ouviu 34 depoimentos. Apenas um deputado que está na lista dos cassáveis pelo Conselho de Ética, Pedro Correia (PP-PE), foi ouvido. Foram apresentados 662 requerimentos, dos quais apenas 336 apreciados e 315 pendentes de apreciação. Dos 336 apreciados, 234 foram aprovados, 93 retirados, dois rejeitados, sete prejudicados e seis parcialmente atendidos. A CPI recebeu 60 documentos sigilosos e 137 não sigilosos.
O sentimento que predomina entre os deputados que participaram das investigações foi o de tempo perdido. Perpétua Almeida (PCdoB-AC), afirma que faltou vontade política do governo e da oposição de apurar as denúncias.
¿ Desde o início, o que predominou foi todo um jogo de cena para passar a idéia de que queriam apurar. Mas nenhum dos lados quis isso ¿ disse Perpétua.