Título: Dilema é importar ou reativar indústria bélica
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Fonte: O Globo, 20/11/2005, O País, p. 14

Governo aprovou política nacional da indústria de defesa para tentar tirar setor da crise em que está desde os anos 90

A necessidade de renovar os equipamentos bélicos mais importantes põe o governo brasileiro diante de um dilema: importar ou reativar a indústria bélica brasileira, que viveu o auge nos anos 70 e entrou em decadência nos 90? Para o coronel Oswaldo Oliva Neto, secretário-executivo do Núcleo de Estudos Estratégicos da Presidência da República, a sociedade brasileira precisará fazer uma opção:

- A primeira opção é ir ao mercado mundial. Comprar, provavelmente mais barato, em vez de desenvolver tecnologia aqui. A outra é investir em tecnologia nacional de defesa. Qualificar-se e dar saltos maiores. Para que isso funcione, é preciso garantir encomendas periódicas para permitir que as empresas sobrevivam.

Neste caso, seria necessário um programa nacional unificado de defesa e a cooperação interna, sistema aplicado em potências como os EUA, que têm regras estabelecidas para o setor e determina a associação das empresas, que desenvolvem juntas projetos estratégicos.

Pesquisador diz que orçamento é "obra de ficção"

No Brasil, companhias como Engesa e Bernardini foram à falência por falta de políticas similares.

O que existe hoje são projetos tímidos e isolados, como o Programa Excelência Gerencial (PEG-EB), desenvolvido pelo Exército e que imprime às instituições públicas filosofias gerenciais modernas, buscando uma administração aberta. Ou mesmo o Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam), criado em 1990 e que deve ficar totalmente pronto em julho do ano que vem. A iniciativa, fruto da parceria entre o governo federal e empresas privadas, conseguiu bons resultados para a defesa aérea em uma das áreas geopolíticas mais disputadas do mundo e que representa 60% do Brasil.

Pesquisador de Assuntos Militares da Universidade Federal de Juiz de Fora, Expedito Carlos Stephani Bastos lamenta que o orçamento no Brasil seja "obra de ficção". Para o ano que vem, estão previstos R$35,1 bilhões para a área militar. Expedito garante que ao longo do tempo, o recurso será gradualmente cortado.

O governo tenta fazer a sua opção. Aprovou, em julho, a política nacional da indústria de defesa. O objetivo é revitalizar o setor, que se encontra em crise aguda desde segunda metade dos anos 90. Para isso seria necessário fortalecer a base industrial visando a redução progressiva da dependência externa, em produtos estratégicos, desenvolvendo internamente e buscando uma melhoria da qualidade tecnológica dos produtos estratégicos com a ampliação da capacidade de produção de produtos de defesa feitos pela indústria nacional.

Navios de combate estão a caminho da desativação

Programa de reaparelhamento aguarda uma decisão

A Marinha terá que desativar, em 20 anos, todos os navios de combate (fragatas e corvetas). Para enfrentar a situação, apresentou em 2003 seu Programa de Reaparelhamento à Casa Civil e está aguardando até hoje uma decisão do governo. Segundo estudos da Marinha, já a curto e médio prazo parte desses navios terá de ser retirada do serviço ativo "devido ao elevado grau de obsolescência ou longo tempo de operação que atingirão".

Com relação aos submarinos, a Marinha precisa construir um tipo convencional, antes do nuclear, que tenha um casco com pelo menos oito metros de largura, espaço mínimo para caber o reator, e capacidade para vedar o vazamento de som. Para isso, ela vai precisar de uma parceria estrangeira, pois ainda não detém 100% a tecnologia.

A principal vantagem de um submarino movido a reator nuclear é dispensar a necessidade de ir à tona, periodicamente, para renovar o ar e recarregar as baterias. No caso dos convencionais, como é a frota brasileira, a necessidade de emergir torna o submarino um alvo fácil do inimigo. A vantagem do nuclear, porém, perde o sentido se ele puder ser localizado pelo som que emite de seu reator.

- Todo submarino tem uma assinatura acústica. O som que ele emite é como se fosse a sua impressão digital e permite que seja descoberto. Por isso, um submarino nuclear precisará de um casco duplo, tecnologia dominada por poucos países. Só assim ele será silencioso - explicou um especialista em tecnologia militar.

Porta-aviões só deve voltar a operar em março de 2006

Enquanto patina no projeto do submarino nuclear, a Marinha se esforça para manter a sua armada operacional. O porta-aviões São Paulo está em reparos desde o acidente e só deve voltar a operar em março de 2006. Os aviões embarcados nele não estão voando e os pilotos estão perdendo a qualificação.

A Aeronáutica teve de adiar o sonho do Programa FX, a substituição dos aviões Mirage IIIE por aviões mais modernos, de interceptação em grandes atitudes. O projeto investiria R$700 milhões em 12 unidades. Mas o governo optou por adquirir aviões usados da França, dez Mirage 2000-C e dois Mirage 2000-B. Os primeiros aviões vão chegar em 2006.

- Não é o ideal mas conseguimos dar um salto. Saímos dos anos 60 e entramos nos 80 em termos de tecnologia. Há muitos excedentes da França. É possível comprar mais - disse Expedito.

A FAB encomendou ainda 76 aviões SuperTucano à Embraer, por US$420 milhões, e já recebeu 24. O Super Tucano é um turboélice com eletrônica de um caça de 4ª geração. Sua missão é formar os pilotos de caça da FAB e proteger a Amazônia do tráfego aéreo ilícito.