Título: 'ÁLCOOL MOLHADO' DÁ UM SALTO DE 50%
Autor: Ramona Ordoñez
Fonte: O Globo, 20/11/2005, Economia, p. 36

Com o sucesso dos carros bicombustíveis, consumo do produto adulterado avança e pode chegar a 6 bilhões de litros anuais, mais do que o mercado formal

Na mesma velocidade em que cresce o número de automóveis flexfuel, avança o mercado de álcool clandestino. Um dos sinais disso é que, apesar do sucesso dos carros bicombustíveis, o consumo oficial de álcool hidratado chegou a cair durante seis meses este ano. Há estimativas de que o mercado ilegal movimente 2,2 bilhões de litros por ano, mas a Federação Nacional do Comércio Varejista de Combustíveis (Fecombustíveis) diz que o volume atingiu 6 bilhões, após um crescimento de 40% a 50% nos últimos 18 meses. Isso representaria um movimento de R$5 bilhões por ano e sonegação de impostos estaduais de cerca de R$1,4 bilhão. Se a estimativa dos postos estiver correta, o comércio ilegal já será maior do que o mercado formal de álcool hidratado, de 4 bilhões de litros.

O chamado "álcool molhado" é vendido adulterado, com elevado teor de água, e as distribuidoras que operam com esse produto ilegal não recolhem os impostos devidos (PIS, Cofins e ICMS). Especialistas explicam que uma distribuidora que trabalha na ilegalidade compra o álcool anidro (o que é misturado à gasolina) sem impostos, mistura água e vende o produto como se fosse álcool hidratado (aquele encontrado nas bombas como combustível).

De janeiro a outubro, segundo a Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), foram vendidos 650,8 mil carros flexfuel, quase o dobro do número de 2004. Por sua vez, o consumo oficial de álcool hidratado tem-se mantido estável, mostra a Agência Nacional do Petróleo (ANP). De março a agosto houve até queda sobre o mesmo período do ano passado.

- Pelo número de veículos existentes, o consumo de álcool hidratado deveria ser de 10 bilhões de litros por ano - calcula o diretor técnico da Fecombustíveis, Aldo Guarda.

- Esse mercado ilegal prejudica todos, dos usineiros às distribuidoras e postos que trabalham na legalidade e aos consumidores - disse o presidente da Fecombustíveis, Gil Siuffo.

Montadoras: R$1,7 milhão em perdas com troca de peças

Com o sucesso dos bicombustíveis, já houve uma redução no consumo da gasolina, que tem uma carga maior de impostos, o que preocupou o setor, por causa da queda na arrecadação de tributos. Agora, o mercado teme que o comércio clandestino cause prejuízos ainda maiores. Siuffo ressalta que somente com a sonegação dos impostos o litro do álcool hidratado chega R$0,30 por litro mais barato ao mercado.

Os consumidores também se preocupam com o álcool adulterado. O analista de sistemas Valério Ferreira diz que às vezes tem dificuldade de ligar o motor quando seu carro flexfuel fica muitos dias parado:

- Fico preocupado, pois me falaram que isso acontece porque o álcool é de má qualidade. Então hoje resolvi encher o tanque com gasolina.

Desde o ano passado, os problemas nos motores têm aumentado nos carros movidos a álcool e nos bicombustíveis. Segundo a superintendente de Qualidade da ANP, Maria Antonieta Souza, dados apresentados pela Anfavea revelam que de abril do ano passado a janeiro deste ano as montadoras acumularam um prejuízo de cerca de R$1,7 milhão com a troca de peças.

Henry Joseph Junior, presidente da comissão de Energia da Anfavea, prefere não comentar esses números, mas garante que as fabricantes de automóveis estão muito preocupadas com os problemas que têm acontecido nos motores.

- Foi desenvolvida uma tecnologia para os veículos funcionarem com os dois combustíveis sem problemas - afirmou o executivo.

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os perigos para o carro

O álcool hidratado - vendido nas bombas dos postos de combustíveis para encher os tanques dos veículos - contém 93% de álcool e 7% de água pura, destilada. As distribuidoras que trabalham no mercado de forma ilegal compram álcool anidro - aquele misturado à gasolina que é vendida nas bombas - sem impostos, misturam água e vendem o produto aos postos como se fosse álcool hidratado. A adição de maiores quantidades de água de qualquer origem, sem tratamento, aumenta a condutividade elétrica no produto, causando vários problemas nos veículos:

Aumento de consumo

Dificuldade na partida do motor

Entupimento do pré-filtro da bomba de combustível

Estouro de escapamento

Corrosão na bomba de combustível

Corrosão no pré-filtro da bomba

Entupimento dos bicos injetores

Formação de depósitos no cabeçote do motor

Formação de depósitos nas câmaras de combustão