Título: DESAFIO À REPRESSÃO DE PEQUIM
Autor: Gilberto Scofield
Fonte: O Globo, 21/11/2005, O Mundo, p. 19

Tocando em pontos delicados para a China em sua visita oficial ao gigante comunista, o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, pediu ontem ao governo de Pequim que amplie as liberdades religiosa, política e social. Pouco depois de expressar esse desejo participando com a mulher, Laura, de um culto num templo da Igreja Gangwashi ¿ uma das poucas igrejas protestantes reconhecidas oficialmente no país ¿ Bush afirmou, ao lado do presidente Hu Jintao:

¿ É importante que as liberdades sociais, políticas e religiosas cresçam na China, e incentivamos a China a continuar fazendo uma transição histórica para uma liberdade maior.

Na igreja, que fica perto da Praça da Paz Celestial ¿ e que meses atrás foi visitada pela secretária de Estado americana, Condoleezza Rice ¿ Bush expressou seu apoio aos cristãos do país escrevendo no livro de visitantes: ¿Que Deus abençoe os cristãos na China¿. Cercado de pastores e membros de um coral da paróquia, o presidente ¿ que é evangélico ¿ desafiou a repressão religiosa na China, mas com o cuidado de medir as palavras:

¿ Não faz muito tempo as pessoas eram proibidas de demonstrar abertamente sua fé nesta sociedade. Minha esperança é de que o governo não tema os cristãos que se reúnem para rezar abertamente. Uma sociedade saudável é uma sociedade que acolhe todas as fés e que permite a seu povo que se expresse por meio da fé no Criador.

Num encontro repleto de simbolismos ¿ mas de poucas decisões concretas ¿ os dois presidentes se comprometeram a melhorar as relações entre seus países, porém deixaram claro que não abrem mão de posições divergentes.

¿ De maneira alguma vamos tolerar a independência de Taiwan ¿ disse Jintao a Bush, no momento em que o presidente americano se preocupa com uma suspeita acumulação de mísseis na costa chinesa em frente a Taiwan, que a China considera uma província rebelde.

No Japão, antes de seguir para Pequim, Bush já alfinetara o governo chinês ao se referir a Taiwan como um modelo de sociedade que passou ¿da repressão para a democracia¿ com sucesso.

Por outro lado, o presidente agradeceu à China por ¿assumir a liderança¿ nas negociações pelo desarmamento da Coréia do Norte, e observou que os norte-coreanos em princípio concordaram em desistir de suas armas e de seu programa nucleares.

¿ Os EUA esperam que eles honrem esse compromisso ¿ disse.

Bush trouxe de avião sua bicicleta, mas quando decidiu usá-la, num passeio com atletas chineses, na manhã de ontem, a cobertura jornalística foi limitada. Num país onde a mídia é fortemente controlada, apenas palavras amáveis e elogiosas do presidente foram publicadas nos jornais e na internet do país. A imprensa destacou a relação entre os EUA e a China como ¿muito estratégica e importante¿, e elogiou o papel de Pequim como principal interlocutor da Coréia do Norte nas conturbadas e lentas negociações para o desarmamento do país comunista.

Ao fim do encontro, Jintao reiterou a disposição de visitar os EUA, onde muitos acreditam ¿ inclusive na delegação americana ¿ que ele vai encontrar algo não visto por Bush em Pequim: protestos nas ruas. Em setembro, Jintao adiou uma viagem oficial a Washington devido à passagem do furacão Katrina.

Diferentemente do que diz Bush ¿ que chegou a afirmar que ¿uma vez aberta apenas uma fresta da porta da liberdade, ela não pode mais ser fechada¿ ¿ Jintao exerce com mão-de-ferro seu poder na China, controlando a mídia e prendendo opositores e defensores de direitos humanos.

Num cenário bastante diferente de outros países onde Bush esteve recentemente, nenhum cartaz de protesto foi visto em Pequim durante os dois dias de sua visita ¿ a terceira de um presidente americano, depois de seu pai, George W. Bush, e Bill Clinton. Nenhum dos dois líderes mencionou o Iraque em suas conversas públicas. Hoje, Bush segue para a Mongólia.

Com agências internacionais