Título: Vice de Lula ataca política de Palocci: `Nosso discurso não assumiu o poder¿
Autor: Luiza Damé
Fonte: O Globo, 26/11/2005, O País, p. 4

José Alencar se une a Carlos Lessa e Stédile na crítica à política econômica

BRASÍLIA. No momento em que o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, luta para se manter forte no governo, o PSB, partido aliado do Planalto, abriu espaço para ataques à política econômica do governo Lula e ao próprio ministro num seminário ontem no Congresso. Começando pelo vice José Alencar, passando pelo ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) Carlos Lessa e chegando ao líder do MST João Pedro Stédile, tradicional aliado do PT, todos condenaram as altas taxas de juros e a rigidez do ajuste fiscal.

Alencar disse que o discurso de campanha de Lula não chegou ao poder e que o governo está perdendo tempo para fazer o país crescer.

¿ O nosso discurso não assumiu o poder. É circunstancial? É circunstancial. Ainda há tempo, mas não é tempo de irresponsabilidades na economia. Ao contrário, irresponsabilidade é tratar a administração orçamentária como se tem tratado. O orçamento é altamente deficitário em razão dos juros estratosféricos, despropositados ¿ afirmou ele, um dia depois de o Banco Central ter baixado a taxa básica de juros em 0,5 ponto percentual.

Alencar disse que Lula, ao assumir o governo, teve que adotar uma política econômica rígida porque havia um cenário desfavorável, com perspectiva de aumento de inflação e desequilíbrio nas contas públicas. Segundo ele, naquele momento foi necessário fazer ¿um pacto com o diabo¿, pois a desconfiança com o novo governo ¿era cavalar¿ e foi preciso adotar medidas de controle da inflação e dos gastos públicos também em ¿dose cavalar¿:

¿ Estamos perdendo um grande tempo de recuperação da economia para pôr o Brasil no patamar que lhe pertence.

Para Stédile, o presidente comete uma ignorância ao afirmar que a política econômica é do governo. Ele disse que Lula alimenta ¿conversa de botequim¿ ao tratar da disputa entre Palocci e a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. O líder do MST comparou Palocci a ¿um lateral direito ruim que leva bola nas costas¿. Lula havia comparado o ministro a Ronaldinho Gaúcho.

¿ Essa política econômica não é do presidente, não é do PT, não é do Palocci. Essa política econômica só interessa ao capital financeiro. O Estado brasileiro foi seqüestrado pelo capital financeiro ¿ disse Stédile.

Lessa: política monetária ¿ortodoxa, burra e suicida¿

Lessa foi ainda mais duro: afirmou que a política monetária inibe o desenvolvimento, a geração de empregos, a distribuição de renda e a inclusão social, e usou termos como indecente e repugnante para qualificar a taxa de juros. Disse que a política monetária atual é ¿frenética, ortodoxa, burra e suicida¿:

¿ A política monetária brasileira é um pesadelo. Com a taxa de juros que o Brasil pratica é impossível ter crescimento razoável e ter investimento.

Integrando a mesa do seminário, o presidente do PT, Ricardo Berzoini, ouviu calado e com a fisionomia fechada os ataques à política econômica. Depois defendeu o governo, apresentando dados de exportações, contas externas e geração de empregos. O petista também cobrou responsabilidade dos aliados com as palavras diante do momento político que o país vive e da proximidade da eleição.

¿ Nós das esquerdas não podemos nos furtar de perceber o que está em jogo nas palavras que proferimos e no impacto que elas têm. Temos que ter a responsabilidade e, mais do que destacar as insuficiências, mostrar onde estávamos em 2002 e onde estamos hoje ¿ disse Berzoini, acrescentando que a fragilização dos partidos de esquerda pode levar de volta ao poder ¿aqueles que produziram a tragédia de 2002¿.

O presidente do PSB, Eduardo Campos, disse que o seminários estava marcado e não dava para prever que Palocci ficaria sob fogo cruzado.