Título: PLANEJAMENTO AINDA QUER AJUSTE DE LONGO PRAZO
Autor: Flávia Oliveira/Regina Alvarez
Fonte: O Globo, 30/11/2005, Economia, p. 29

Ministério espera retomar debate dentro do governo. Nova proposta de Delfim prevê superávit primário de 4,75%

BRASÍLIA e RIO. O Ministério do Planejamento está aguardando o melhor momento para retomar a discussão dentro do governo sobre o ajuste fiscal de longo prazo. A proposta apresentada à Câmara de Política Econômica, que está sendo aperfeiçoada pelos técnicos do Planejamento e da Fazenda, incorpora os principais pontos do plano elaborado pelo deputado Delfim Netto e pelo economista Fabio Giambiagi, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A diferença é que a proposta discutida pelo governo não prevê superávit primário (receitas menos despesas, exceto gastos com juros) superior a 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB). Já Delfim e Giambiagi sugerem esforço fiscal de 4,75% do PIB em 2006 e 2007 - em seguida, haveria uma queda gradual, chegando a 2% em 2016.

O deputado e o economista são colaboradores do governo na elaboração da proposta de ajuste de longo prazo, mas a idéia de elevar o superávit primário para um patamar acima de 4,25% do PIB sequer foi levada à reunião da Câmara de Política Econômica, segundo um dos participantes. Isso porque o presidente Luiz Inácio Lula da Silva acha que a economia de 4,25% é suficiente para garantir a estabilidade.

No Congresso, a aprovação de um ajuste de longo prazo nos moldes propostos por Delfim e Giambiagi é considerada improvável com o atual clima político. O líder do PSDB na Câmara, deputado Alberto Goldman, foi duro nas críticas, embora não se declare contrário ao ajuste das contas públicas:

- É um exercício intelectual inútil. Você bola uma coisa aparentemente ideal e esquece a realidade e as demandas da sociedade. A chance de ser aprovado pelo Congresso é zero.

Relator do Orçamento não vê clima político para mudança

O plano de Delfim e Giambiagi - batizado pelos autores de "Agenda de Consenso" e que será publicado no próximo Boletim de Conjuntura do Ipea - é composto de cinco medidas, além do superávit de 4,75% do PIB nos dois primeiros anos dos dez de ajuste. Eles sugerem a aprovação, em 2006, do aumento da desvinculação de receitas da União (DRU) dos atuais 20% para até 35%.

A segunda medida envolve mudar o orçamento da Saúde. A Constituição determina ao setor uma verba fixa como proporção do PIB. Os autores propõem uma emenda que corrija as receitas com base na inflação e na expansão da população brasileira. O crescimento vegetativo também delimitaria o aumento da folha salarial do funcionalismo nos três poderes.

Outra medida é a adoção de um limite constitucional para as despesas correntes do governo: sairia de 17,4% do PIB em 2007 para 16,5% em 2016. Por fim, os economistas propõem a renovação da CPMF, com a alíquota decrescente, até chegar a 0,08% em 2016.

O deputado Paudernei Avelino (PFL-AM), da Comissão Mista de Orçamento, acha que a elevação do superávit pode ser boa para o país, desde que o governo reduza as despesas de custeio. Ele reconhece que a vinculação de receitas no Orçamento é excessiva, mas diz que o momento político não favorece qualquer mudança na Constituição.

O próprio relator do Orçamento, Carlito Merss (PT-SC), não vê clima político para aprovar uma proposta que envolveria mudanças na Constituição e temas tão sensíveis, como mudança na forma de cálculo dos recursos para a saúde e o aumento do superávit.

Fabio Giambiagi afirma que a proposta permitirá que os juros reais caiam para 5% ao ano a partir de 2012. O crescimento econômico, nos dez anos, se manteria entre 4% e 4,5%. Já o investimento como proporção do PIB subiria dos atuais 0,6% para 2,12% até 2016.

Economista diz que juros contaminam área fiscal

A economista Margarida Gutierrez, do Grupo de Conjuntura da UFRJ, considera bem-vinda a proposta de ajuste de longo prazo. Segundo ele, os gastos correntes do governo não param de subir e a carga tributária chegou ao limite. Por isso, a única chance de reduzir a dívida pública é um controle rígido das despesas.

- Chegou o momento de olhar o Orçamento e pôr um teto nos gastos - resume.

Já o economista André de Melo Modenesi, do Ibmec, concorda com o controle dos gastos. Mas duvida que a proposta de aumento do superávit e mudança das regras de desembolso do governo levará os juros reais para 5% ao ano. Segundo ele, o peso dos preços administrados no IPCA exige uma política monetária rígida para controlar a inflação. Por isso, são os juros que contaminam a área fiscal. Não o contrário.

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