Título: Sinais de ajuste nos juros
Autor: Cristiane Jungblut, Regina Alvarez e Flávia Olivei
Fonte: O Globo, 02/12/2005, Economia, p. 27

Após queda do PIB, Lula e Palocci dizem que política monetária pode sofrer reparos

Opresidente Luiz Inácio Lula da Silva mudou ontem o tom sobre a queda de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre e admitiu que há tempo para fazer reparos na condução da economia, se necessário. Ao discursar na reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), Lula disse que o recuo do PIB é um alerta para o governo e afirmou que é preciso ver se a política monetária foi responsável pela retração. Para o presidente, é preciso começar 2006 dando ¿sinais à sociedade¿ de que o crescimento será mais vigoroso ¿ e isso passa por ¿definir claramente que entramos numa rota de redução dos juros¿. No Rio, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, também disse que o Banco Central pode fazer ajustes na política monetária.

¿ Já esperava que fosse um trimestre ruim, mas não esperava o número que foi. Trabalho com a certeza de que o Brasil entrou num caminho de estabilidade e desenvolvimento que não tem retorno. Obviamente, sempre temos tempo de fazer os reparos naquilo que precisar ser reparado ¿ disse Lula.

Embora tenha mantido um discurso otimista sobre os rumos da economia, Lula foi cauteloso. E evitou assinar embaixo da gestão da política econômica pelo Ministério da Fazenda e pelo Banco Central:

¿ O fato de o PIB ter decrescido é um alerta para nós. Vamos ver o que aconteceu, ver o que a crise política e a política de juros têm de incidência nisso. Há indícios na economia, no comportamento das pessoas, no BNDES de que isso vai acontecer (crescimento). Não podemos permitir que a gente não comece 2006 dando sinais para a sociedade de que nosso crescimento vai ser mais rigoroso, mais forte do que foi em 2005, 2004.

Palocci: ¿BC teve grande vitória, mas política monetária tem custos¿

O presidente Lula acrescentou:

¿ Estamos conscientes e consistentes de que as coisas podem ser ajustadas aqui e ali. Mas estamos conscientes de que não há por que não continuar acreditando que o que plantamos é o que o Brasil precisa.

Como num movimento coordenado, Palocci também falou de ajuste em discurso, no Rio, no almoço em sua homenagem organizado pelo presidente da Federação das Indústrias do Rio (Firjan), Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira. Dizendo-se humilde, o ministro afirmou que aceita debater possíveis exageros da política monetária:

¿ Quando as pessoas dizem que talvez a dose do remédio esteja exagerada, podemos debater. Não é um debate indesejável, ilegítimo, antipatriótico. É legítimo discutir se as doses são adequadas. Principalmente porque, se as doses não são adequadas, com o tempo elas são ajustadas. O Banco Central se reúne todo mês. Eventualmente, se a dose não for adequada, pode mudar essa dose.

Palocci só deixou claro que não aceita a volta da inflação. Para ele, o BC teve ¿grande vitória¿ ao trazer a inflação de volta a 5,5%, após as previsões indicarem 8% ao ano no início de 2005. O problema, disse, é que ¿a política monetária tem custos¿.

¿ O que é inadequado é que, em todo momento que uma dificuldade aparece, entramos no velho debate, que no fundo é se vale a pena controlar a inflação ou não. É uma questão perigosa para o futuro da economia.

Pela primeira vez, Palocci admitiu que a crise política trouxe danos à economia. Segundo ele, o ambiente de incerteza afetou fortemente as decisões de investimentos e de consumo no terceiro trimestre. Mas para o ministro, a tendência já mudou.

O discurso de Lula foi bem recebido por empresários. Eles identificaram uma diferença em relação à rigidez da política econômica. O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, que fizera duras críticas antes de Lula chegar, disse:

¿ Como o presidente reconhece a necessidade de reparos e ajustes, começa a ficar melhor a história.

À noite, após jantar oferecido pela Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), em São Paulo, o presidente do BC, Henrique Meirelles, ironizou as afirmações de economistas de que os juros levaram à queda no PIB:

¿ É interessante: alguns meses atrás, se dizia que só as expectativas influenciavam e a política monetária não fazia efeito. Agora é o contrário, só a política monetária faz efeito.

Meirelles admitiu, no entanto, o impacto dos juros.

¿ A política monetária está fazendo seu trabalho de conter a inflação e isso tem seu efeito.

INDÚSTRIA PAULISTA ENCOLHEU 0,9%, na página 28