Título: MÁ CONDUTA SEXUAL DE PADRES PREOCUPA A IGREJA
Autor: Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 04/12/2005, O País, p. 19

Além dos danos à imagem, preocupação é com o pagamento de indenizações milionárias a vítimas de abusos

BRASÍLIA. Os casos de má conduta sexual dos padres acenderam uma luz amarela na cúpula da Igreja Católica no Brasil. Embora o tema seja tabu, os bispos estão em estado de alerta com os números e com a dimensão do problema. Além do temor com a crise de imagem, já que o Brasil é o maior país católico do mundo, outra grande preocupação é de ordem prática: a Igreja no Brasil quer evitar o pagamento de indenizações milionárias que quase a levou à falência nos Estados Unidos.

A argumentação jurídica que está sendo discutida internamente na CNBB é que, diferentemente da legislação americana, no Brasil a pessoa individualmente é responsável por seus atos. Isso poderia salvar a Igreja no Brasil de quebrar, segundo a avaliação de integrantes da CNBB feitas para o GLOBO.

Em 2002, quando explodiram casos de pedofilia na Igreja Católica nos Estados Unidos, um bispo e 55 padres foram afastados. Até aquele ano, a Igreja chegou a gastar US$350 milhões em indenizações. Esse valor pode alcançar a marca de US$1 bilhão ao final de todos os processos. A diocese de Bridgeport chegou a fazer um acordo de cerca de US$15 milhões com as vítimas, por envolvimento de seis padres com casos de abuso sexual. Na época, o papa João Paulo II chegou a fazer uma reunião de emergência com todos os cardeais americanos.

Igreja paga indenizações milionárias no mundo

Na Irlanda, a Igreja pagou o equivalente a US$110 milhões em indenizações às vítimas de abusos sexuais em escolas e orfanatos. Em 1996, na Austrália, a Igreja arcou com o prejuízo de US$2,6 milhões em indenizações para 200 estudantes que haviam sido molestados num internato católico. No Brasil, existe uma preocupação concreta por parte de integrantes da CNBB com a possibilidade de a Igreja ter de pagar indenizações milionárias.

¿ O temor com as indenizações sempre existe. É preciso discutir essa possibilidade legal. Aliás, em casos comprovados, os padres são suspensos do ministério sacerdotal e passam a responder à Justiça comum ¿ observa o arcebispo de Maringá (PR), dom Anuar Battisti, presidente da Comissão Episcopal para os Ministérios Ordenados e a Vida Consagrada.

Fonte da CNBB sustenta que existe um movimento para levantar casos de pedofilia para forçar a Igreja a pagar indenizações, apesar de o direito brasileiro individualizar a pena. Essa fonte argumenta que seria algo semelhante ao caso de um crime sexual praticado por um juiz ou militar.

¿ Nesses casos o Estado assumiria o crime? ¿ argumenta a fonte.

CNBB nega relatório sobre má conduta sexual

A CNBB também nega a existência de um relatório feito pelo Vaticano, que apontaria a existência no Brasil de 1.700 padres envolvidos em casos de má conduta sexual. Em nota oficial enviada ao GLOBO na última sexta-feira, a Nunciatura Apostólica no Brasil, que funciona como a Embaixada do Vaticano, informou que não existe uma comissão especial da Santa Sé para o estudo sobre homossexualidade no Brasil. Segundo a nota, ¿quanto à solução dos vários problemas, observe-se o magistério e as leis canônicas da Igreja¿.

O texto diz ainda que, de fato, o documento mais recente da Congregação para a Educação Católica refere-se aos ¿critérios de discernimento vocacional acerca das pessoas com tendências homossexuais e da sua admissão ao Seminário e às Ordens Sacras¿. Na semana passada, o Vaticano divulgou um documento com restrições à entrada de gays na Igreja que vinha causando polêmica. O documento diz que gays praticantes e homens com fortes tendências homossexuais devem ser barrados do sacerdócio.

A Nunciatura afirma ainda que ¿quanto aos crimes de pedofilia, como se sabe, são punidos quer pelas leis da Igreja e quer pelas leis do Estado¿.