Título: Grupo Tortura Nunca Mais faz 20 anos
Autor: Evandro Éboli
Fonte: O Globo, 04/12/2005, O País, p. 23

Entidade trouxe à tona a face oculta do terrorismo de direta

Como diria o cardeal-arcebispo de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns, ainda há muito o que fazer para que toda a verdade venha à tona. Mas o Grupo Tortura Nunca Mais (GTNM) comemora amanhã 20 anos com proezas a se orgulhar no acerto de contas com os torturadores do regime militar de 64. A festa será a partir das 19h, no Arquivo Nacional, no Centro.

Fundado em outubro de 1985, quando o país entrava na última etapa para o retorno à democracia ¿ após 21 anos de autoritarismo ¿- o Tortura Nunca Mais conseguiu tirar o capuz não apenas de torturadores que agiram nos quartéis e prisões clandestinas, mas também denunciar e obter a cassação do registro profissional de dezenas de médicos no Rio e em São Paulo, que assessoraram torturadores em interrogatórios de presos políticos ou como legistas que atestaram a história oficial dos mortos sob tortura. Além disso, o grupo hoje atende a cerca de cem vítimas de violência policial.

No Rio, foram cassados os médicos Amílcar Lobo ¿ que serviu na Polícia do Exército ¿, José Lino Coutinho de França Neto (Marinha) e Ricardo Agnese Fayad, que conseguiu chegar à patente de general e coordenar a área de saúde do Exército. O nome de Fayad foi revelado por Lobo, que trabalhou com ele no DOI-Codi da Barão de Mesquita. O GTNM deu trabalho também ao coronel Armando Avólio Filho, descoberto em 1995 como adido militar da embaixada brasileira em Londres. Era o tenente ¿Apolo¿, no DOI-Codi da Barão de Mesquita. Avólio ¿caiu¿ quando se deixou exibir num boletim da associação de ex-alunos do Colégio Militar.

¿ A persistência desse grupo e de seus colaboradores contribuiu para que conquistássemos o reconhecimento oficial das mortes. A luta agora é pela abertura dos arquivos para que apareçam os fatos e personagens que a história oficial ainda tenta esconder ¿ afirma a presidente do Grupo Tortura Nunca Mais, Elisabeth Silveira, irmã do guerrilheiro Luiz Renê Silveira e Silva, que desapareceu aos 23 anos, em 74, na Guerrilha do Araguaia. Só essa batalha contabiliza 58 dos 136 desaparecidos políticos. No total, já foi resgatada a história de cerca de 500 mortos no período.

A entidade nasceu depois que um ex-preso político, Brandão Monteiro, então secretário de transportes no primeiro governo Brizola, viu nos jornais uma foto do militar que o havia torturado na cadeia: o coronel bombeiro Walter Jacarandá. Naquele ano de 1985 ¿ quando os militares começavam a sair de cena, um ano depois da derrota das ¿Diretas já¿ ¿ saiu a lista dos 444 torturadores, que acabaram entrando na alça de mira do Grupo Tortura Nunca Mais.