Título: AÇÃO CONTRA CAIXA DOIS
Autor: Vagner Ricardo
Fonte: O Globo, 07/12/2005, Economia, p. 25

PF desmonta esquema criado por escritório de advocacia para lavar dinheiro no exterior

Uma operação deflagrada ontem pela Polícia Federal (PF) resultou na prisão de oito pessoas ¿ sete no Rio e uma em São Paulo ¿ que participavam de um esquema de lavagem de dinheiro, sonegação fiscal e evasão de divisas. Acusado de ser a peça principal do esquema, o advogado Chaim Henoch Zalcberg foi preso ainda nas primeiras horas do dia, assim como três sócios dele no escritório Zalcberg Advogados Associados. Estão foragidos o advogado Antonio Wanis Filho e um uruguaio encarregado de dar suporte às operações ilegais no exterior. Também foram apreendidas pilhas de documentos que serão analisados para identificar as empresas que se beneficiaram das fraudes, investigadas pela PF desde junho.

A chamada Operação Babilônia mobilizou 130 agentes da PF para cumprir dez mandados de prisão e outros 38 de busca e apreensão ¿ 30 em escritórios de empresas no Rio e oito em São Paulo ¿ expedidos pela Justiça Federal do Rio. Zalcberg foi detido em casa, no Alto Leblon, na Zona Sul do Rio. Segundo o delegado Algacir Mikalovski, da Delegacia de Repressão aos Crimes Financeiros da PF, o escritório criou um sistema para empresas remeterem ao exterior e repatriarem, de forma legal, dinheiro oriundo de caixa dois. Pelo serviços, o escritório cobrava de US$3 mil a US$5 mil mensais.

A estimativa da polícia é que o esquema tenha movimentado mais de US$30 milhões nos últimos dez anos. Dados preliminares indicam que mais de 30 empresas teriam participado das fraudes no período. Mas o delegado afirmou que o número de empresas envolvidas e os valores só serão conhecidos ao término das investigações, que terão a participação da Receita Federal, do Banco Central e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

¿ O primeiro passo foi desarticular o escritório que dava suporte às operações ilegais. O passo seguinte será identificar as empresas que legalizaram a contabilidade paralela ¿ disse Mikalovski.

Segundo a PF, o primeiro passo era criar no Brasil uma empresa de sociedade limitada para receber parte dos bens que precisavam ser ¿lavados¿. Em seguida, ela passava a fazer operações financeiras com uma offshore (empresa aberta em paraísos fiscais), como remeter recursos ao exterior a título de pagamentos de empréstimos fictícios.

Empresas que recebiam dinheiro ilegal ficavam em paraísos fiscais

O último passo era a compra da empresa local pela offshore, com um rápido aumento de seu capital social. Só que o ex-dono da firma limitada, simultaneamente, recebia as ações ao portador da empresa offshore, transformando o patrimônio ilícito em legal. As empresas offshore usadas nos golpes tinham sede no Uruguai, nas Ilhas Cayman e nas Ilhas Virgens, todos paraísos fiscais. O esquema incluía ainda operações de dólar a cabo ¿ ou seja, remessa ao exterior e ingresso simultâneo da moeda feitos por doleiros. No país, a maioria das empresas de fachada investia os recursos transformados em legais em empreendimentos imobiliários.

Os passos de Chaim Zalcberg são acompanhados pela PF desde que seu nome surgiu nas investigações do esquema que ficou conhecido como Propinoduto, montado por auditores e fiscais de renda do Rio de Janeiro, condenados pela Justiça em 2003. Zalcberg, especialista em direito internacional, recebeu ligações do fiscal Rodrigo Silveirinha, o principal acusado do Propinoduto, e Wanis tinha em seu nome imóveis de empresas offshore. Segundo o delegado da PF, a necessidade de concentrar as investigações na quadrilha de fiscais fez com que só em junho a atuação do escritório de advocacia começasse a ser vigiada.

Na operação de ontem, os três sócios presos são Alcindo de Azevedo Barboza, Shirley Andrade Santos, Taíssa Horovitz Balassiano. Também foram presos o contador Manuel Ilidio Campos Barreiro e o advogado Fabrício de Oliveira Silva, além de Adailton Guimarães, um laranja preso no bairro de Anchieta. Em São Paulo, a PF prendeu Renato Bastos Rosa, outro laranja. Eles ficarão presos por cinco dias e poderão ter a prisão temporária prorrogada por mais cinco dias.