Título: JURO ALTO E MÁ GESTÃO NO PAÍS QUE SÓ VÊ O PRESENTE
Autor: Fabiana Ribeiro
Fonte: O Globo, 08/12/2005, Economia, p. 33

Brasil e poupança dominaram debate de economistas sobre livro `O valor do amanhã¿, de Eduardo Giannetti

As altas taxas de juros e a má gestão dos recursos públicos no Brasil, combinadas à baixa taxa de poupança interna do país, dominaram o debate de lançamento no Rio do livro do economista Eduardo Giannetti, ¿O valor do amanhã¿ (Companhia das Letras), na noite de anteontem. Além do autor, participaram do evento ¿Encontros no GLOBO¿, os também economistas Paulo Guedes, diretor da Fiducia Asset Management, e Roberto Fendt, professor do Ibre-FGV, e os jornalistas do GLOBO George Vidor e Flávia Oliveira, como mediadora.

¿ O Brasil tem a vocação para o crescimento, mas não tem vocação para poupança. O que resulta em inflação e crises no balanço de pagamentos. E ainda uma política de juros extremamente altos e por muito tempo ¿ resumiu Giannetti.

Para ele, essa falta de vocação está relacionada ao fato de a sociedade brasileira, historicamente, valorizar mais o presente que o futuro. Segundo o autor, é justamente a relação custo-benefício das escolhas feitas ao longo do tempo o tema central do livro, que vem sendo identificado como um tratado sobre juros. Nas 337 páginas da obra, Giannetti aborda economia, mas também biologia, medicina, psicologia e até filosofia e teologia.

¿ Nós (brasileiros) vivemos marcadamente o presente e descontamos o futuro a uma taxa muito elevada. Nossa psicologia é voltada para o presente: é o que chamo de miopia temporal ¿ disse Giannetti.

A tese foi contestada por Guedes, que atribui ao governo apetite pelos gastos. Segundo ele, a população consegue poupar 20% do Produto Interno Bruto (PIB) e o país cresce num ritmo de 2% ao ano em média.

¿ Não é um problema de falta de poupança. Os EUA poupam zero e investem 4%, 5% do PIB. Como conseguem crescer 4,5%, 5% ao ano? Pela eficiência da alocação (dos recursos públicos) ¿ argumentou Guedes.

Para ele, o crescimento brasileiro esbarra na má gestão governamental e filosofia econômica equivocada. Guedes lembrou que os gastos públicos somam 40% do PIB:

¿ Falta um gene na matriz intelectual brasileira: a liberal- democracia. Sem ela, não há crescimento, mercado, nem eficiência de alocação. Não temos a matriz do desenvolvimento econômico mundial.

Giannetti: ¿É opção errada aceitar pagar juro tão alto¿

Já o colunista George Vidor acredita que o hábito de poupar e pensar no futuro não estão incorporados no Brasil:

¿ No Japão, pessoas acima de 80 anos de idade ainda poupam violentamente. E hoje no Japão um executivo de 35 anos que não poupou US$1 milhão se considera fracassado.

Roberto Fendt, por sua vez, analisou os juros praticadas no Brasil. E concluiu que a taxa está menos alta do que se imagina. Para ele, considerando o câmbio, o prêmio de risco-Brasil e a tributação sobre os investimentos, o nível adequado de juros no país seria de 15,8% ao ano ¿ hoje a Selic está em 18,5%.

¿ Há mais de 2 pontos percentuais por ano de diferença. Não consigo encontrar um cristão que me convença de que são esses pontos que estão provocando essa recessão que está aí ¿ argumentou.

Os debatedores também trataram das taxas do crediário. Para Giannetti, o brasileiro, muitas vezes, faz opções erradas ao pagar juros tão altos:

¿ O juros que a pessoa física paga no Brasil seriam proibitivamente altos em qualquer nação civilizada. Quem aceitaria pagar 4% ao mês em média? Com 3,5% ao mês, uma dívida dobra em 20 meses. O juro da pessoa física no cheque especial oscilou entre 140% e 170% ao ano, nos últimos cinco anos. No crédito pessoal, de 50% a 70%. Isso não tem nada a ver diretamente com governo, é gente que aceita esse tipo de situação. Ou por desespero ou impaciência ¿ disse Giannetti.

Guedes rebateu. Para ele, o brasileiro médio que toma decisões de consumo, em vez de poupança, está fazendo escolhas racionais, diante de suas perspectivas. É a prestação que cabe no salário, assinalou.

Fendt também chamou a atenção para a desordem institucional de um Estado que, mesmo arrecadando muito, não consegue garantir os direitos básicos de seus cidadãos.