Título: Verticalização: Lula contra o PT
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 09/12/2005, O GLOBO, p. 2

O PT continua se afogando em denúncias, o presidente Lula nega que já seja candidato à reeleição mas está tentando enquadrar seu partido numa questão essencial para sua eventual candidatura e para todo o jogo sucessório: o fim da verticalização das coligações. Ao criticar a regra na convenção do PSB, anteontem à noite, Lula pode ter feito apenas uma cortesia com o aliado mas há quem tenha ouvido um recado ao PT.

Se o presidente forçar seu partido a rever a posição já oficial favorável à manutenção da regra, ela pode acabar sendo derrubada. Por falta dos votos necessários, os defensores da emenda neste sentido desistiram de votá-la anteontem mas o assunto continua em pauta. De alguns petistas também já se ouve que a necessidade de alianças para apoiar Lula exigirá do partido a escolha de uma concessão em matéria eleitoral: o fim da verticalização ou o adiamento da entrada em vigor da cláusula de barreira. Mas esta última mudança, que agrada aos pequenos partidos, seria muito mais desgastante, além de ter pouquíssima viabilidade, por não ter o apoio de nenhum dos grandes partidos.

O próprio comparecimento de Lula à posse do novo presidente do PSB, seu ex-ministro Eduardo Campos, já foi um afago num dos poucos aliados que pode ter em 2006, se vier a ser candidato. Para isso, como ele mesmo disse, precisa contar pelo menos com os dois aliados históricos de esquerda ¿ PSB e PCdoB. Lembrou que quando fechou com o PMDB o acordo de apoio ao governo, não firmaram qualquer compromisso de natureza eleitoral para 2006.

E o PMDB, juntamente com o PFL, é um dos grandes partidos que desejam o fim da verticalização para viabilizar seus projetos de poder regional, independentemente da opção que façam na disputa presidencial. No ato do PSB, Lula negou qualquer paixão pela reeleição mas também pela verticalização, que considera uma restrição às alianças partidárias: ¿Eu acho que casamento tem que ser por amor, não pode ser obrigatório. As pessoas casam quando querem casar¿. Disse ainda que para ser candidato precisa de uma boa aliança eleitoral que lhe garanta também maioria para governar. E aí é que entra o PMDB, pois só com a esquerda ele viu que não se chega à maioria simples na Câmara. Sem maioria não vale a pena, chegou a também a dizer.

A falta de maioria não justifica os delitos políticos de Delúbio e companhia, a distribuição de recursos aos partidos aliados e o suposto mensalão. Mas certamente ela está na origem dos descaminhos que o PT tomou ao chegar ao governo, contrariando seu discurso histórico pela moralização da política.

O PSB que Lula afagou anteontem vem avisando que só poderá apoiá-lo com o fim da verticalização. Só ficando livre para fazer alianças várias nos estados poderá cumprir as exigências da cláusula de barreira. O PCdoB preferia o adiamento da entrada em vigor desta última. Mas como esta é uma concessão que renderia mais críticas, numa hora em que se cobra tanto o enxugamento do quadro partidário, é possível que o PT seja forçado a mudar de posição e ajude o PFL, o PMDB e os partidos médios a derrubar a verticalização ¿ ainda que ela represente uma involução rumo à farra das alianças que sempre imperou nas eleições brasileiras. Pois algo é certo: a prevalecer a regra, sendo Lula candidato em condições já tão críticas, corre o risco de ter como aliado apenas o pequeno PCdoB.