Título: Inflação no ano fica acima da meta pela 1ª vez
Autor: Cássia Almeida e Ledice Araujo
Fonte: O Globo, 12/11/2004, Economia, p. 25

A inflação subiu em outubro. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou em 0,44%, depois de registrar taxa de 0,33% em setembro, informou ontem o IBGE. No ano, a taxa que orienta o sistema de metas de inflação acumula alta de 5,95%, ficando pela primeira vez acima do alvo determinado, de 5,5%, mas ainda abaixo do teto, de 8%. Nos últimos 12 meses, a inflação foi de 6,86%. A alta de outubro foi puxada pelo reajuste da gasolina e do álcool, que, juntos, responderam por um quarto do índice:

¿ O principal impacto veio dos combustíveis. Em novembro, essa pressão vai persistir, já que o aumento foi concedido em meados do mês passado ¿ afirmou Eulina Nunes dos Santos, gerente do Sistema de Índice de Preços do IBGE.

Núcleos preocupam e podem forçar alta de juros

Mas o que preocupa os analistas e indica que os juros básicos continuarão subindo foi o comportamento dos núcleos do índice. O núcleo que exclui os alimentos no domicílio e os preços administrados (com reajustes controlados ou monitorados pelo governo, como telefonia e gasolina) passou de 0,41% para 0,55%. E o índice de difusão (que calcula o percentual de itens que aumentaram de preço) subiu de 60,4% para 66,4%.

¿ Esses núcleos apontam inflação anual entre 6% e 7%, bem acima da meta de inflação para 2005. Essas medidas indicam que o Banco Central vai prosseguir calibrando os juros para reduzir o risco de não cumprir a meta no ano que vem ¿ disse Elson Teles, economista da gestora de recursos Fides.

Octavio de Barros, economista-chefe do Bradesco, alerta, ainda, para o repasse do aumento de custos da indústria. Esse repasse apareceu no aumento de preços dos automóveis novos (1,20% em outubro e 12,24% no ano), dos acessórios e peças (1,78% no mês e 17,44% no ano) e dos eletrodomésticos (0,99% no mês passado e 8,58% de janeiro a outubro).

¿ Os produtos industrializados estão pressionados pela alta de custos, principalmente do aço ¿ explicou.

Para os analistas, o BC subirá os juros para 17,75% até o fim do ano. Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do BC, também acredita em juros maiores. Para ele, a inflação está sob controle, mas a meta, não:

¿ Estamos pagando pela reputação do BC. O petróleo subiu muito e vamos comprometer o crescimento da economia para ganhar um ponto percentual na inflação. Estamos matando uma formiguinha com tiro de canhão.

Cebola, cenoura e tomate entre as maiores quedas

Enquanto os combustíveis empurram a inflação, a alimentação tem segurado o índice. Os preços do grupo caíram em média 0,23%, no segundo mês seguido de deflação. Produtos como cebola (-27,87%), cenoura (-17,16%) e tomate (-16,74%) registraram as maiores baixas.

Mas há produtos em alta como o feijão mulatinho (carioca), que subiu 11,69% no mês passado. Da cesta básica, pelo menos três produtos saíram das listas de promoções das lojas devido aos aumentos desde outubro: são o feijão preto, que subiu 10,9%; o frango, 9,5%; e o açúcar, 2,9%, segundo a Associação dos Supermercados do Rio.

No caso do feijão preto, a elevação deve-se à redução da oferta com a quebra de safra. Segundo o presidente da Bolsa de Alimentos, José de Sousa, a expectativa para este mês é de recuo com a chegada da safrinha de dezembro. Já o açúcar encareceu de R$ 0,70 para R$ 0,90 (kg) no atacado desde setembro, como reflexo da elevação das cotações do álcool no processo de recuperação de preços pelos usineiros.

¿ Acredito que a tendência do açúcar é a estabilização. Já subiu demais ¿ disse Sousa.

No corre-corre das compras, a dona de casa Maria de Jesus põe no carrinho, de preferência, as marcas em promoção. Foi o que fez ontem com o feijão Ouro a R$ 1,99 na loja Barateiro.

¿ Hoje gasto quase R$ 400 em supermercado. Há uns três anos, a despesa era metade.