Título: Os funerais da reeleição
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 13/12/2005, O GLOBO, p. 2

Algumas conversas já começam a acontecer entre tucanos e petistas com vistas à aprovação de uma das emendas que propõem o fim da reeleição e a ampliação do mandato presidencial para cinco anos. Estão claras, como bem demonstrado aqui ontem por Ilimar Franco, que os tucanos agem por conveniência eleitoral, em busca de um acordo entre os três presidenciáveis do partido.

Sem reeleição, Geraldo Alckmin e Aécio Neves podem resignar-se mais facilmente a uma candidatura de José Serra. Mais jovens, terão nova oportunidade em 2010, e não apenas em 2014, considerando-se a inevitabilidade da reeleição ¿ salvo quando o governo é abatido por um grande desastre administrativo, econômico ou ético. Lula, antes da debacle petista, era tido como imbatível.

Os petistas, por seu lado, têm também suas conveniências. Se os tucanos dizem agora que a experiência pela qual tanto se empenharam mostrou-se inadequada ao Brasil, os petistas podem dizer que sempre foram contra, tendo votado contra a emenda em 1997. Mas não é só isso. Desde 1989 o PT nunca olhou para a Presidência senão pensando em Lula-lá. Cumprida esta etapa, com Lula reeleito ou derrotado em 2006, não disporão de outro segundo grande nome. Dirceu e Palocci, quando se engalfinhavam por questões de orientação econômica, eram movidos também pela silenciosa ambição de se habilitarem ao posto de herdeiro e candidato natural em 2010. Agora um está fora de combate e o outro ferido. O que se apresenta para o PT é o pós-lulismo, e nele não há luminares. Neste futuro incerto, com um vazio de grandes quadros, o mandato de cinco anos sem reeleição também será mais conveniente. Se o PSDB ou qualquer outro partido fizer um governo ruim, e o PT conseguir purgar seus erros e restaurar sua credibilidade, poderá mais cedo pensar na volta ao poder.

No Congresso, além do senador Tasso Jereissati, o deputado e futuro líder Jutahy Júnior, não por acaso ligado a Serra, é quem mais tem procurado os petistas para tratar do assunto. Já conversou, por exemplo com os deputados Carlito Mers, Sigmaringa Seixas e Paulo Delgado, entre outros. Mas não ainda com Ricardo Berzoini, presidente do PT. Outro tucano que tem se movimentado é o deputado Eduardo Paes.

¿ Tenho encontrado receptividade entre os poucos petistas com quem dialogo ao argumento central: a reeleição tem se mostrado danosa. Obriga o presidente, desde o dia da posse, a pensar na reeleição, induzindo-o a fazer alianças espúrias; tira-lhe mesmo a coragem de tomar decisões mais duras para preservar futuros aliados. E o que é pior, nos três níveis, a reeleição congela as ambições, que são legítimas. Na medida em que se sentem condenados a oito anos de ostracismo, os partidos de oposição adotam posturas mais agressivas, que podem levar ao que o deputado Jungmann chama de política de vetos recíprocos. Discutir a reeleição pode ser a abertura de uma primeira fresta para o diálogo PT-oposição.

Manda a honestidade que se diga: Lula sempre defendeu esta fórmula. Defendeu-a, por exemplo, num jantar com jornalistas em 12 de fevereiro de 2004, dois dias antes da eclosão do caso Waldomiro.

Estão sendo, portanto, criadas as condições para que a articulação prospere. Tratem eles, entretanto, de evitar que o fim da reeleição não reedite o varejão montado em 1987 para aprová-la.