Título: COMBUSTÍVEIS LIVRES DA COTAÇÃO INTERNACIONAL
Autor: Ramona Ordoñez
Fonte: O Globo, 13/12/2005, Economia, p. 23

Gabrielli diz que preços no Brasil podem se descolar do mercado externo com a auto-suficiência da Petrobras em 2006

A auto-suficiência na produção de petróleo, prevista para ser atingida no primeiro trimestre do próximo ano, vai permitir que os preços dos combustíveis no Brasil não tenham mais que acompanhar as cotações no mercado internacional. A informação foi dada ontem pelo presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, ao destacar a importância da auto-suficiência para a economia do Brasil.

¿ A situação da economia brasileira ficará mais independente das situações do mercado internacional, tanto em termos físicos de fornecimento quanto de preços. Portanto, podemos ter uma certa separação do preço brasileiro do preço internacional ¿ destacou Gabrielli.

A Petrobras pretende atingir a chamada auto-suficiência sustentável no primeiro trimestre de 2006 principalmente com a entrada em produção da plataforma P-50, que nos próximos dias seguirá para a Bacia de Campos. Nessa ocasião a produção nacional de petróleo atingirá a média de 1,85 milhão de barris por dia, frente a um consumo da ordem de 1,8 milhão de barris/dia. Ou seja, a companhia acredita que conseguirá atingir uma produção superior ao consumo e, principalmente, manter esse nível também com a entrada em operação de outros sistemas, como o que vai elevar a produção da P-34, também em Campos.

Os preços dos combustíveis vendidos pelas refinarias da Petrobras foram liberados em janeiro de 2002 ¿ como uma das últimas etapas do fim do monopólio do petróleo em 1998. A partir de então, a política da Petrobras passou a ser de alinhar os preços internos dos combustíveis aos preços internacionais e ao câmbio.

No ano passado os preços da gasolina e do óleo diesel tiveram três reajustes, sendo que neste ano a Petrobras anunciou apenas um aumento em setembro, de 10% para a gasolina e 12% para o diesel. O GLP (gás de botijão) não é reajustado desde o dia 29 de dezembro de 2002, quando subiu 7,7%. A partir de junho deste ano, o petróleo bateu vários recordes e, em agosto, chegou a ser negociado próximo a US$64 o barril. Ontem, o barril do tipo Brent (referência internacional), negociado em Londres, fechou a US$58,40, em alta de 1,9%.

Analistas dizem que preços precisam ficar atrelados

As declarações do presidente da Petrobras agradam aos consumidores, mas deixam analistas do mercado preocupados. Segundo especialistas, para a Petrobras manter sua rentabilidade é fundamental que os preços internos continuem alinhados às cotações internacionais do petróleo.

¿ Os investidores analisam a rentabilidade das empresas para escolherem as aplicações. E para ter rentabilidade os preços da Petrobras têm que ser alinhados aos internacionais ¿ disse o analista Luiz Caetano, do Banco Brascan.

Este ano, por exemplo, no primeiro semestre, o resultado obtido pela empresa ficou abaixo do esperado pelos analistas, apesar de ter sido recorde: o lucro líquido foi de R$9,951 bilhões, 40% superior aos R$7,091 bilhões de igual período de 2004. O mercado esperava R$11 bilhões. O mesmo ocorreu no terceiro trimestre deste ano, quando a companhia registrou lucro líquido de R$5,6 bilhões, enquanto o mercado esperava R$6 bilhões. As diferenças foram atribuídas ao adiamento do reajuste dos combustíveis.

De acordo com Adriano Pires Rodrigues, outro especialista do setor, se a Petrobras deixar de acompanhar os preços internacionais, a auto-suficiência estará ameaçada porque, com menos recursos, não terá condições de manter os elevados investimentos para aumentar as reservas e a produção.

Se a gasolina não tivesse sofrido qualquer aumento este ano, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), taxa medida pelo IBGE que orienta o sistema de metas de inflação do governo, ainda não teria ultrapassado o alvo de 5,1% fixado pelo Banco Central (BC) para este ano. O IPCA acumulado de janeiro a novembro está 5,31%, já acima da meta que o BC persegue.

Reajuste respondeu por 6,5% da inflação em 11 meses

Pelas contas do coordenador de pesquisas do Instituto Fecomércio-RJ, Paulo Brück, a contribuição da alta da gasolina, mais forte entre os meses de setembro (alta de 3,36%) e outubro (4,17%), foi de 0,35 ponto percentual. Os reajustes responderam, portanto, por 6,5% da inflação em 11 meses.

¿ Se o combustível não tivesse aumentado, o IPCA no ano estaria em 4,46%, abaixo da meta ¿ disse Brück.

Para 2005 fechar na meta seria preciso que o índice em dezembro não passasse de 0,14%, o que está bem abaixo das projeções, que giram entre 0,2% e 0,4% para este mês. Segundo o professor da PUC Luiz Roberto Cunha, o que surpreendeu em novembro foi a alta dos alimentos (0,88%), a maior do ano, por causa das chuvas que fizeram subir os preços de legumes e frutas:

¿ Não podemos culpar somente a Petrobras pela alta da inflação. A companhia foi até cautelosa e deixou esfriar o movimento especulativo para fazer o reajuste.

COLABOROU: Cássia Almeida