Título: MEA-CULPA ÀS VÉSPERAS DO COPOM
Autor: Martha Beck e Aguinaldo Novo
Fonte: O Globo, 14/12/2005, Economia, p. 23

Secretário da Fazenda diz que governo foi responsável por inflação que levou a juros altos

Osecretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, admitiu ontem que o governo contribuiu para o surto inflacionário ocorrido no país em 2004 que obrigou o Banco Central (BC) a manter por 12 meses os juros altos, elevando-os de 16% para 19,75% ao ano. Segundo ele, o tiro no próprio pé ocorreu quando a Receita Federal passou a cobrar PIS/Cofins sobre as importações em maio do ano passado. A medida foi tomada para dar isonomia entre os produtos nacionais, que já pagavam esses tributos, e os importados, mas acabou contribuindo para um aumento dos preços no mercado interno.

Para o secretário, o governo deveria ter feito também uma redução das tarifas de importação, o que teria dado um equilíbrio à alta da carga tributária ocorrida com a tributação dos importados e evitado uma pressão sobre os índices de preços:

¿ A mudança de PIS/Cofins teve efeito sobre os preços relativos que, num ambiente de demanda aquecida e de aumento de preços de commodities internacionais, acabou levando ao surto inflacionário de 2004 e exigindo uma ação por parte do Banco Central. Foi uma mudança institucional positiva, mas eu faço um mea-culpa dizendo que aquilo deveria ter vindo com uma redução de tarifas de importação ¿ disse Appy, durante o seminário ¿Agenda microeconômica: evidências e perspectivas¿, organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e pelo Banco Mundial (Bird).

Palocci pede paciência aos que querem redução de juros

Appy também defendeu a política econômica afirmando que o fato de o Brasil ter conseguido controlar a inflação e dar solidez às contas externas foi importante para garantir ambiente favorável aos investimentos. Mas disse que ainda há espaço para a redução das tarifas de importação. Segundo ele, esse movimento faz parte de uma abertura comercial importante para criar um ambiente competitivo no país.

A redução das tarifas de importação também é considerada pela equipe econômica como um instrumento adicional de combate à inflação. Isso poderia dar ao BC condições para manter os juros em queda ¿ uma demanda cada vez maior tanto do setor empresarial quanto de integrantes do próprio governo ¿ e ao mesmo tempo manter a inflação sob controle.

¿ A abertura de mercado dá à economia maior capacidade para produzir. Em algum momento, isso acaba se traduzindo em pressão menor sobre os preços ¿ disse o secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, Luís Pereira.

Em São Paulo, na véspera do anúncio da nova taxa básica Selic ¿ hoje em 18,5% ao ano ¿ pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, pediu paciência aos que reclamam do ritmo de redução dos juros:

¿ Os juros já estão caindo desde setembro. Devemos ter paciência no sentido de que esse movimento seja consistente com o controle da inflação ¿ afirmou o ministro, que em encontro com executivos convidados pelas montadoras ouviu críticas aos juros elevados e à queda do dólar.

Palocci acrescentou que é natural que exista uma ansiedade e cobrança para que o governo acelere o corte da Taxa Selic:

¿ Se é verdade, e é verdade, que o controle da inflação tem um custo para o país, a inflação tem custos maiores ¿ respondeu ele.

Palocci tem sido alvo de críticas dentro e fora do governo e, na avaliação de alguns analistas, isso tende a aumentar com a proximidade das eleições. O ministro rechaçou a possibilidade de interferência política na decisão sobre os juros:

¿ As decisões de política monetária não são, não podem ser decisões eleitorais. Isso já aconteceu antes no país e pagamos um preço alto por isso.

No seminário da CNI e do Bird em Brasília, o pesquisador do Instituto de Pesquisa Economia Aplicada (Ipea) Armando Castelar disse que a falta de ambiente favorável ao investimento no Brasil faz com que o potencial de crescimento econômico fique limitado a 3,5%. Segundo ele, um dos principais entraves ao investimento é a carga tributária, hoje em 30% nos países em desenvolvimento, enquanto no Brasil chega a 35,91%. O peso dos impostos também foi apontado como o maior empecilho para potenciais investidores no país, segundo a pesquisa do Bird ¿Avaliação do clima de investimentos: resultados do Brasil¿.