Título: BC MANTÉM O RITMO
Autor: Patricia Duarte, Patricia Eloy e Vagner Ricardo
Fonte: O Globo, 15/12/2005, Economia, p. 29

Juros básicos caem apenas 0,5 ponto percentual, mas decisão desta vez não foi unânime

Pelo quarto mês consecutivo e em sua última reunião de 2005, o Comitê de Política Monetária (Copom) reduziu ontem em 0,50 ponto percentual os juros básicos (Taxa Selic), que passam a ser de 18% ao ano. A decisão, no entanto, não foi unânime, algo que não acontecia há mais de um ano. Dos oito diretores que participaram do encontro, dois defenderam um corte de 0,75 ponto percentual. A cisão sinaliza algo que boa parte dos especialistas vem defendendo, de que já existe espaço para reduções mais agressivas devido aos fundamentos econômicos mais sólidos.

¿ O fato de não ter sido unânime aumenta a probabilidade de o corte de 0,75 ponto vir em janeiro ¿ afirmou o economista-chefe do ABN-Amro, Mário Mesquita.

A última vez que não houve consenso no Copom foi em setembro de 2004, quando iniciou-se o processo de elevação da Selic, que só inverteu o sentido um ano depois. Naquele mês, a taxa passou de 16% para 16,25% ao ano, sendo que três dos oito diretores defenderam alta de 0,50 ponto. A taxa chegou a 19,75% em maio e começou a cair em setembro, quando foi a 19,50%. A Selic está agora no menor patamar desde janeiro de 2005, quando estava em 17,75% ao ano. Apesar de defender que já existia condições para reduções mais agressivas, boa parte do mercado apostava no corte de 0,50 ponto agora, muito mais pelo conservadorismo do Banco Central.

¿ Há espaço para um corte maior, porque o cenário macroeconômico é bom. Mas o fato de a equipe econômica ter ficado sob fogo amigo pode ter pesado na decisão, que foi técnica. Não queriam dar a impressão de que estão cedendo. Preocuparia mais a leitura que o mercado poderia fazer se viesse corte maior ¿ afirmou o economista-chefe da corretora Fator, Vladimir Caramaschi.

Corte não muda projeções para o PIB em 2006

A equipe econômica vem sofrendo pressões para flexibilizar a política econômica, sobretudo por conta do recuo de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB, o conjunto das riquezas produzidas no país) no trimestre passado. Alguns ministros chegaram a afirmar que o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva estaria tentando convencer o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e o presidente do BC, Henrique Meirelles, a acelerarem o corte de juros. A Selic elevada acaba encarecendo o crédito e, conseqüentemente, afetando o consumo.

O BC já havia dado sinais nos últimos dias de que manteria o ritmo de queda mais gradual, por meio da ata do Copom e de reunião com economistas de diversas instituições financeiras. Um dos pontos negativos mais ressaltados foi a preocupação com a inflação no curto prazo. A meta para este ano, de IPCA a 5,1%, não será atingida. No ano, até novembro, o índice já acumula alta de 5,31%. A última pesquisa Focus do BC mostrou, porém, que os economistas estimam que em 2006 a inflação ficará dentro da meta de 4,5%.

A queda de ontem não muda as projeções dos analistas em relação ao PIB estimado para o ano que vem. Segundo Sandra Utsumi, economista-chefe do BES Investimento, além dos juros elevadíssimos, a falta de investimentos do governo em infra-estrutura e a quebra da safra agrícola devem garantir um crescimento de pouco mais de 3% em 2006, abaixo dos mais de 5% projetados para a média dos emergentes.

¿ O mal já foi feito e, mesmo com uma queda mais forte que 0,5 ponto percentual, não dá para imaginar uma expansão do PIB superior a 3,75% em 2006 ¿ diz Utsumi.

Para Joaquim Eloi Cirne de Toledo, professor de economia da USP, a queda de meio ponto da Selic só terá algum reflexo na reação do PIB a partir de junho, porque cortes de juros só costumam ter efeito na economia após dois trimestres. Segundo ele, a taxa de juros reais ainda elevada ¿ hoje em 13,4% anuais ¿ inibirá uma reação mais efetiva da economia em 2006.

O economista do BNDES Francisco Eduardo Pires de Souza afirma que a taxa de investimento e a oferta de emprego devem ser afetadas no primeiro trimestre de 2006, porque a economia crescerá mais lentamente do que seu potencial.

Alexandre Póvoa, diretor da Modal Asset Management, acredita que a falta de unanimidade na decisão de ontem dá uma importante pista em relação à reunião de janeiro:

¿ O consenso acabou e cresceu a probabilidade de um corte de 0,75 ponto percentual no próximo mês ¿ acredita Póvoa.