Título: A GUERRA DAS PESQUISAS
Autor: Merval Pereira
Fonte: O Globo, 17/12/2005, O País, p. 4

Pesquisas de opinião não definem as escolhas partidárias, mas nunca tiveram tanto peso político quanto nessa campanha pré-eleitoral, tanto para a própria candidatura de Lula à reeleição, quanto para a definição dos dois outros grandes partidos nacionais, o PSDB e o PMDB. No PSDB, o prefeito paulistano José Serra, e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, têm nas pesquisas os pontos decisivos de uma eventual candidatura. Se Serra não aparecesse tão destacadamente como o único tucano a vencer Lula, já agora nos dois turnos indistintamente, não haveria nem discussão. O governador Geraldo Alckmin, depois de uma carreira política que o levou de vereador do interior a 12 anos à frente do maior estado do país, seria o candidato natural do partido.

Além do mais, as últimas pesquisas confirmaram sua capacidade de crescimento na opinião pública nacional, e a do Datafolha é ainda melhor para sua pretensão, pois o distancia bem do ex-governador Garotinho, colocando-o com 20% das preferências contra apenas 11% de Garotinho. Pelo Ibope, Alckmin aparece empatado com Garotinho, com 20% das preferências, isto é, ainda lutando para chegar ao segundo turno, o que não é bom para ele.

Se até março ele não conseguir se distanciar de Garotinho claramente, ficará sempre a dúvida sobre sua capacidade de ir para o segundo turno contra Lula, etapa que Serra já superou largamente, pelo menos segundo as pesquisas. Chegando ao segundo turno, no entanto, Alckmin aparece já empatado tecnicamente com Lula nas duas pesquisas, o que quase equilibra sua disputa com Serra.

Disposto a manter a condição de candidato natural, o governador ressalta, sempre que pode, que Serra não se declarou candidato porque seria inconcebível deixar a prefeitura com pouco mais de um ano de mandato. A argumentação interna dos adeptos da candidatura Alckmin é de que a escolha de Serra como candidato à Presidência seria um risco político desnecessário.

Serra teria que passar a campanha inteira explicando a decisão de sair da prefeitura, depois de se comprometer por escrito a não sair. Falta de ética não é apenas roubar, argumentam os ¿alquimistas¿, mas também não faltar com a palavra. Essa ¿falha¿ daria argumento aos candidatos petistas até mesmo ao governo estadual, especialmente para a ex-prefeita Marta Suplicy, que acusava Serra de estar usando São Paulo como trampolim para chegar à Presidência da República.

Os ¿alquimistas¿ ressaltam, nas reuniões internas, que o PSDB só perderia com a candidatura de Serra: perderia a prefeitura de São Paulo que nunca teve, ¿o quinto estado do país¿, deixando que o PFL ficasse no posto por quase três anos; poderia dar argumentos ao adversário na campanha para governador, correndo o risco de perder o estado, e nada garantiria que ele ganhará a Presidência.

O jogo paulista é vital para os tucanos e, por isso, também a disputa do governo estadual entra nessa estratégia partidária. O ex-presidente Fernando Henrique, que é o grande eleitor no PSDB, aparece como o candidato mais competitivo do partido contra o favoritismo de Orestes Quércia, presidente regional do PMDB. Mas rejeita totalmente a idéia de se candidatar, cogitada por diversos setores do partido há muito tempo.

Ele se referiu quase com irritação à colocação de seu nome na lista de candidatos: ¿Eu estou fora, nunca admiti ser candidato ao governo de São Paulo. Na relação espontânea, meu nome nem aparece, porque essa questão não está colocada¿, garante Fernando Henrique, considerando que o resultado da pesquisa é uma maneira de induzir a pressão partidária para cima dele. Ele não se assusta com a presença de Quércia no primeiro lugar e garante que Alckmin tem pesquisas que mostram que ¿os japoneses¿ do PSDB ¿ o vereador José Aníbal, o ex-ministro da Educação Paulo Renato e o secretário Aloysio Nunes Ferreira, todos mais ou menos com o mesmo baixo índice de apoio nas pesquisas ¿ sobem muito de posição quando aparecem como candidatos do governador ou dele próprio.

De uma média de 4% a 5% da preferência, qualquer deles pula para cerca de 30% imediatamente, garantem assessores do governador. Quércia está em campanha, mas espera um acordo com o PSDB, que não tem candidato forte. Mas não há jeito de o PSDB abrir mão do candidato próprio.

Paulo Renato está jogando seus prestígio na sociedade para se impor no partido e tem contra si o fato de nunca ter disputado uma eleição. Mas tem a seu favor uma história importante no Ministério da Educação. Aparecer empatado tecnicamente como Aníbal, que teve mais de 500 mil votos nas últimas eleições municipais e tem mais história partidária, é um trunfo para ele.

Outro é o apoio do ex-presidente, que, no entanto, não tem condições de impor um nome ao partido. Mas Paulo Renato conta também com a simpatia de Alckmin e foi estimulado por Serra a apresentar seu nome ao partido. Ele pode vir a ser um tertius nessa disputa interna.

A pesquisa para o governo de São Paulo ajuda muito o raciocínio a favor de Alckmin, pois se os tucanos não acreditam que terá fôlego para se eleger governador, também não podem considerar que a eleição presidencial já está decidida em favor deste ou daquele candidato simplesmente pelos resultados das pesquisas de hoje. (Continua amanhã)