Título: Menos falatório e mais PIB
Autor: Cristiane Jungblut/Ilimar Franco/Gerson Camarotti/
Fonte: O Globo, 20/12/2005, O País, p. 3

Lula estabelece lei do silêncio entre ministros e cobra de Palocci queda no crescimento

Em 11 horas de reunião ministerial, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva estabeleceu uma espécie de lei do silêncio para evitar novas divergências públicas entre seus ministros e revelou seu enorme descontentamento com o resultado do PIB no terceiro trimestre, quando foi registrada queda de 1,2%. Mesmo tendo reafirmado seu apoio à política econômica de Antonio Palocci, ele repreendeu o ministro da Fazenda na frente de todo o Ministério ao falar do PIB. E cobrou unidade na defesa do governo para poder enfrentar a campanha eleitoral do ano que vem.

Palocci tentou se explicar, assegurando que esses números melhorariam com a retomada do crescimento industrial.

- Para mim foi uma decepção muito grande, a maior deste ano, os números do resultado do PIB. Foi um enorme impacto negativo - disse o presidente.

- Essa queda não é definitiva. Os números já mostram uma reação positiva e já há um crescimento da indústria. O quadro muda ainda este ano - argumentou Palocci.

Durante a reunião houve um debate entre os ministros sobre a política de juros do Banco Central. O presidente do BC, Henrique Meirelles, afirmou que o pior já passou e que no ano que vem a situação vai melhorar porque o crescimento econômico hoje se dá em bases sustentáveis.

- O crescimento está sendo retomado com base na recuperação da renda e não na oferta de crédito - disse Meirelles.

Críticas às altas taxas de juros

Mesmo assim o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, e o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), criticaram o ritmo da queda das taxas de juros.

Lula disse aos ministros que a tendência é os juros caírem em 2006. E que é preciso acelerar os gastos no primeiro semestre porque, devido à legislação eleitoral, os repasses não-obrigatórios são interrompidos a estados e municípios.

- O presidente quer um esforço maior nos gastos por causa das limitações de ano eleitoral e pediu que todos estejam aqui na primeira semana de janeiro para tocar o governo - disse um ministro.

O presidente, que proibiu o acesso da imprensa até no momento de seu discurso, disse aos ministros que não sabe se disputará a reeleição e que, seja quem for o candidato, terá a missão de defender as realizações de seu governo. O discurso foi gravado pela Radiobrás, mas não foi veiculado. Em agosto, quando o presidente comandou a primeira reunião depois da crise, afirmou que se sentia traído, sem dizer por quem.

- Talvez não tenhamos feito tudo o que prometemos, mas os nossos números são superiores aos do governo anterior - disse Lula, segundo presentes, acrescentando que espera um crescimento da economia de 5% no próximo ano, o que muitos entenderam que seria este o cenário propício para a reeleição.

Discussão pública é inaceitável, diz

Lula também foi enfático ao reclamar das brigas públicas, como a de Palocci com a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e com o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Luiz Fernando Furlan:

- Não quero que haja mais divergências públicas, isso é inaceitável!

Em relação ao escândalo que explodiu no PT, ele pediu que a coordenação política separe o governo da crise de seu partido. Disse que cabe ao PT assumir a responsabilidade de seus erros.

Foi a quarta e última reunião ministerial do ano - a 12ª de seu governo. Segundo ministros, Lula disse que avisará no momento oportuno se será candidato à reeleição:

- O presidente foi claro ao dizer que quer unidade política na defesa, unidade política na apresentação do governo. E que a palavra definitiva é a dele. Ou seja, não há ilhas de excelência, há uma excelência de conjunto do governo. É claro que esses embates tendem a se acelerar porque é um ano eleitoral - disse o ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner, escalado para falar sobre o encontro ao lado do ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes.

O ano de 2006 terá que ser "um ano de realizações", avisou o presidente. O governo quer acelerar já neste fim de ano os gastos, mas Jaques Wagner disse que o governo não usará a liberação de verbas para tentar conter a crise.

- Quem atravessou oito meses desse bombardeio sem usar do expediente da caneta contra a responsabilidade com a economia, seguramente não o fará só por conta do ano eleitoral - disse Wagner.

Com discurso otimista, os dois ministros disseram que o governo Lula apresenta um desempenho melhor que a gestão anterior.

- Não estamos falando se está tudo azul ou rosa. Estou dizendo que os números, comparando com períodos anteriores, são favoráveis a este governo - disse Wagner.

- O governo Lula tem melhor desempenho em todos os números em que pudéssemos ser desafiados hoje, ou em qualquer debate, em relação aos principais críticos deste governo - disse Ciro.

Apesar de Palocci ter apresentado um cenário positivo para a economia, Wagner disse que não se lembrava se havia sido fixada uma meta de crescimento para 2006.

- Será um crescimento com mais consistência - disse ele.

- 2006 estará mais para 2004 - completou Ciro.

Com estilo agressivo, Ciro chegou a negar que haja uma briga interna no governo sobre o rigor do ajuste fiscal. Ele disse que são intrigas da oposição e da imprensa. Na verdade, ministros como Dilma Rousseff , Palocci e Furlan têm discutido publicamente sobre a política fiscal.

- Palocci não gosta de juros altos. Palocci é contra juros altos. Alguns estão preocupados com um ângulo, outros com outro ângulo, mas temos convicção de que esta é a coesão que temos ao redor da orientação do presidente de que a política econômica é a adequada ao momento. Isso foi intriga da oposição e de setores da imprensa - disparou Ciro.

No Salão Oval, Lula abriu o encontro com uma rápida intervenção, comunicando que haveria mais tarde um jantar de confraternização. Os recados foram dados à tarde, depois de nove ministros apresentarem balanço de áreas do governo: desenvolvimento, ações sociais, infra-estrutura, condução da política econômica e segurança pública.

Legenda da foto: CIRO GOMES (à direita) e Jaques Wagner após a reunião: "Temos convicção de que esta é a coesão que temos ao redor da orientação do presidente", disse o ministro da Integração