Título: A MUDANÇA NA EDUCAÇÃO
Autor: Ruben Klein
Fonte: O Globo, 22/12/2005, Opinião, p. 7

O GLOBO traz a notícia (17/12) de que, segundo o Censo da Educação Superior, o crescimento de matrículas no ensino superior em 2004 foi desacelerado. Isso não é surpreendente e é até esperado, pois a expansão da conclusão do ensino fundamental e do ensino médio já terminou.

O Censo Escolar de 2005 mostrou que a matrícula no ensino médio já foi menor que a de 2004. O número de concluintes do ensino fundamental vem caindo desde 2003 e, ainda segundo o Censo de 2005, o número de concluintes no ensino médio em 2004 já foi menor que em 2003, e provavelmente vai ser menor ainda em 2005.

Isso quer dizer que o número potencial de candidatos novos, recém-egressos do ensino médio, ao superior está diminuindo. Então como e para quem expandir o ensino superior? Só se for para pessoas mais velhas que já terminaram o ensino médio.

A oferta de vagas no ensino superior em 2004 foi de 2,320 milhões, bem maior que o número de concluintes no ensino médio, em 2003, cerca de 1,884 milhão. Provavelmente, a oferta de vagas foi aumentada em 2005, mas o número de concluintes em 2004 caiu, aumentando a discrepância. Pode ser que o Prouni ajude a preencher algumas dessas vagas ociosas com candidatos mais velhos, que já terminaram o ensino médio, em anos anteriores. O Enem de 2005 teve cerca de 1 milhão desses candidatos, um aumento de cinco vezes em relação ao ano anterior.

O percentual de alunos, por idade, de 18 a 24 anos matriculados no ensino superior é, segundo a PNAD de 2003, 6,5%, 10,6%, 12,4%, 13,7%, 12,7%, 10,9% e 9,3%, que são taxas muito baixas. Em particular, somente 6,5% das pessoas de 18 anos (idade correta de entrada no ensino superior) estão matriculadas na universidade.

As PNADs mostram ainda que essas taxas mais que dobraram em relação ao ano de 1992, mas só melhoraram em cerca de um ponto percentual em relação a 2002. Mas, ao mesmo tempo, as PNADs mostram que enquanto houve um grande acréscimo no percentual de alunos dessas idades matriculados na escola no ensino regular, de 1992 a 2002, esses percentuais caíram em 2003.

Na década de 90, até 1998, as taxas de repetência e evasão caíram, tendo como conseqüência um melhor fluxo dos alunos, diminuição da defasagem idade-série e aumento das taxas de conclusão do ensino fundamental e do ensino médio. Mas de 1998 em diante, as taxas de repetência da 5ª série à 8ª série subiram ligeiramente e estabilizaram e no ensino médio continuam crescendo lentamente. Como conseqüência, as taxas de evasão também subiram um pouco. Por isso, hoje em dia o número de concluintes do fundamental e médio está diminuindo e a proporção de alunos de 17 anos em diante começou a cair em 2003.

Outro aspecto importante é a qualidade de ensino na educação básica. O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) realizado a cada dois anos, desde 1995 e que aplica testes de compreensão de leitura e de matemática em amostras probabilísticas, representativas dos alunos da 4ª e 8ª séries do ensino fundamental e da 3ª série do ensino médio, e cujos resultados são comparáveis ao longo dos anos, evidencia problemas da qualidade de ensino e que pouquíssimos alunos terminam o ensino médio com um nível satisfatório.

Diante desses dois fatos, fica claro que muito mais importante que a expansão do ensino superior é a expansão de conclusão do fundamental e do médio e da melhoria de qualidade do ensino nesses níveis. Só assim haverá mais alunos (e de melhor nível) para entrar no ensino superior.

Por exemplo, em 2003, somente cerca de 65% dos alunos estão concluindo o ensino fundamental e cerca de 45% o ensino médio. Se a repetência e a evasão não baixarem, é possível que haja um retrocesso e essas taxas de conclusão caiam.

Portanto o foco das políticas educacionais, hoje em dia, deve ser a educação básica (fundamental e médio) e é necessário implementar políticas efetivas de melhoria da qualidade de ensino e de redução da repetência.

Para completar, é importante chamar a atenção da natureza das matrículas no ensino superior. Segundo dados do Censo do Ensino Superior de 2004, divulgado pelo Inep, somente cerca de 6% das matrículas são em cursos de engenharia (247.478 matrículas), o que para um país que deseja crescer e competir tecnologicamente é muito pouco. Para contraste, a imprensa tem noticiado que na China cerca de 50% das matrículas do ensino superior são em engenharia. Novamente, para mudar esse quadro, é necessário investir no ensino de qualidade de matemática e ciências no fundamental e no ensino médio.

RUBEN KLEIN é matemático.