Título: SADDAM: 'FUI ESPANCADO E TORTURADO'
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Fonte: O Globo, 22/12/2005, O Mundo, p. 40

Ex-ditador reage a relato de testemunha e acusa EUA, que negam maus-tratos aos réus

BAGDÁ. Em meio a vívidas descrições da sangrenta repressão que se seguiu ao atentado frustrado contra Saddam Hussein em Dujail em 1982, em que 148 habitantes da aldeia foram presos, torturados e mortos, reiniciou ontem em Bagdá o julgamento do ex-ditador e de sete de seus principais asseclas. Numa explosão de descontentamento, Saddam acusou seus captores americanos de o torturarem e o espancarem na prisão, assim como aos outros detentos. A acusação foi negada pelos Estados Unidos.

O ex-ditador se manteve tranqüilo a maior parte da sessão - a sexta desde a abertura do julgamento em 19 de outubro - mas se lançou ao ataque após o testemunho de um homem que relatou como sua família teria sido massacrada no rastro da fracassada tentativa de matar Saddam.

- Quatro de meus filhos foram executados e eu deveria ser executado também - contou ele por trás de uma cortina, afirmando ter sido salvo pela invasão americana em 2003. - Nunca vi um tribunal, nunca tive um julgamento.

EUA: réus vivem tão bem quanto soldados americanos

Saddam acusou o juiz, o curdo Rizgar Mohammed Amin, de parcialidade, e fez também ataques aos Estados Unidos.

- Fui espancado em todas as partes do corpo e as marcas ainda estão em meu corpo, e isso foi feito por americanos. Sim, fomos espancados pelos americanos e torturados, todos nós - disparou o ex-ditador, que defendeu a punição de qualquer ex-subordinado seu envolvido em tortura.

A embaixada dos EUA em Bagdá negou que Saddam ou os outros sete réus tenham sido torturados ou espancados sob custódia americana. O ex-ditador já havia boicotado a sessão anterior do julgamento, no dia 7 de outubro, alegando que o processo judicial era uma farsa inventada pelos EUA e que ele estava sendo maltratado.

- Posso dizer que estas pessoas estão vivendo em condições tão boas quanto os soldados que as vigiam - disse um porta-voz da embaixada, Christopher Reid. - Essas acusações são falsas.

Participação nas eleições beirou os 70% do eleitorado

O meio irmão de Saddam e ex-chefe de seu serviço secreto, Barzan Ibrahim al-Tikriti, também enervou-se com uma testemunha que descreveu torturas que teria sofrido nas mãos dos agentes do regime. Um outro homem contou que Barzan comeu uvas tranqüilamente enquanto o observava sendo torturado.

A sessão de ontem terminou após três das cinco testemunhas previstas fazerem seus relatos e o julgamento será retomado hoje, para ser novamente suspenso até a segunda metade de janeiro, depois das eleições. Ontem, a Comissão Eleitoral Independente anunciou que o comparecimento às urnas nas eleições do dia 15 foi de cerca de 70%.

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