Título: BC CAI NA REAL
Autor: Patricia Duarte e Luiza Damé
Fonte: O Globo, 29/12/2005, Economia, p. 21

Banco reduz de 3,4% para 2,6% previsão de alta do PIB e estima inflação acima da meta

Otropeço da economia no trimestre passado, quando o Produto Interno Bruto (PIB, conjunto das riquezas produzidas no país) recuou 1,2%, levou o Banco Central (BC) a revisar para baixo a estimativa de crescimento para este ano, que passou de 3,4% para 2,6% ¿ quase a metade da expansão de 4,9% vista em 2004. Mesmo assim, a inflação para o ano, medida pelo IPCA, ficará em 5,7% nos cálculos do BC, acima da previsão anterior (5%) e da meta de inflação do período, de 5,1%. Para 2006, a projeção do relatório trimestral da instituição mostra recuperação do PIB, com expansão de 4%, mas a inflação do próximo ano, para o BC, deverá ficar em 3,8%, abaixo da meta de 4,5%.

A estimativa de crescimento do PIB para 2006 é bem inferior à previsão feita na semana passada pelo ministro da Fazenda, Antonio Palocci, de cerca de 5%. Aliás, mesmo com os números divulgados ontem pelo BC, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reforçou a projeção de Palocci, durante discurso sobre educação.

¿ O ensino profissional é tão importante quanto a universidade, porque na medida em que o Brasil retoma o crescimento médio anual de 5%, vamos ter problemas de mão-de-obra qualificada em nosso país ¿ afirmou Lula, acrescentando:

¿ Acreditem que o Brasil entrou, definitivamente, na rota do crescimento econômico. E não um crescimento de vôo de galinha, que cresce um ano e cai outro ano. O país está preparado, com estabilidade, com a inflação controlada, para crescer durante dez ou 15 anos de forma sucessiva, obviamente que respeitando as intempéries que podem acontecer pelo mundo econômico afora.

Em 2006, inflação abaixo da meta

O diretor de Política Econômica do BC, Afonso Bevilaqua, buscou não confrontar as diferentes estimativas. Ele disse apenas que os cálculos do banco são preliminares, baseados nos dados mais recentes, e que o cenário ao longo do próximo ano pode mudar. Ele lembrou que, para 2004, a autoridade monetária chegou a projetar crescimento de 3,5%, o que não se confirmou.

¿ Nada impede que isso aconteça agora. Para o BC, é fundamental que a condução da política monetária seja feita de forma que o crescimento se aproxime mais e mais das estimativas que estão sendo feitas pelo ministro Palocci. Ele conhece as projeções do BC. Tem de perguntar para ele por que fez aquela projeção ¿ afirmou ontem Bevilaqua.

Os cálculos do BC tomam como base um cenário com taxa de juros básicos de 18% ao ano (Selic atual) e dólar a aproximadamente R$2,25 constantes. Segundo o diretor, o crescimento menor este ano não ocorreu unicamente devido à política monetária (de juros altos, para conter a inflação), que ele considera correta, mas também por fatores como política fiscal. Ele não descartou a recente crise política.

No próximo ano, acrescentou Bevilaqua, o resultado virá da expectativa de flexibilização da política monetária ¿ leia-se corte da Selic, iniciado em setembro ¿ e do aumento da massa salarial. A recuperação econômica, afirmou, já começou no quarto trimestre deste ano e se estenderá ao longo de 2006. Ele destacou que a retomada virá da agropecuária, com estimativa de crescimento de 4,8%, enquanto a indústria crescerá 5,3% e o setor de serviços, 2,9%.

Já a estimativa de inflação para 2006, abaixo da meta de 4,5%, abre caminho para mais cortes na taxa básica de juros. Segundo Bevilaqua, o IPCA menor deve ocorrer a partir da variação mais baixa de preços administrados, como combustíveis.

Investimento externo cai e reservas sobem

Bevilaqua destacou ainda os bons resultados do setor externo, puxados pela balança comercial, que deve encerrar o ano com saldo de US$44,5 bilhões, segundo o BC. Em 2006, a expectativa é que o saldo fique em US$35,5 bilhões. O superávit em transações correntes, este ano, deve ficar em US$15 bilhões (cerca de 2% do PIB), US$1,4 bilhão a mais que o cálculo anterior. Para 2006, o saldo esperado é de US$6,3 bilhões.

Os investimentos estrangeiros diretos, no entanto, recuarão: devem fechar 2005 em US$15 bilhões, contra projeção anterior de US$16 bilhões e, em 2006, ficarão em US$16 bilhões. Segundo Bevilaqua, até a última segunda-feira, os investimentos acumulavam US$14,98 bilhões no ano, abaixo dos US$18,2 bilhões que o país recebeu em 2004:

¿ Houve avanço na capacidade de a economia resistir a choques. Estamos entrando em período eleitoral, com inflação em queda e perspectiva de crescimento. Isso será levado em consideração pelos empresários.

O diretor também respondeu às críticas sobre a política de juros. Ele afirmou que nunca sentiu qualquer ameaça sobre as decisões técnicas do BC, nem pensou em pedir demissão e que a função do banco é cumprir a tarefa delegada pelo Executivo, de manter a inflação sob controle:

As reservas internacionais do país, segundo o BC, devem ficar em US$53,8 bilhões em 2005 e em US$60 bilhões no ano seguinte, os maiores patamares desde a adoção do regime de câmbio flutuante, em 1999.