Título: GALILEO ESTRÉIA NO ESPAÇO
Autor:
Fonte: O Globo, 29/12/2005, O Mundo, p. 26

Primeiro satélite do sistema europeu de localização entra em órbita e desafia os EUA

BAIKONUR, Cazaquistão.

AAgência Espacial Européia (ESA) conseguiu ontem colocar na órbita terrestre o primeiro satélite que comporá a rede Galileo, que promete revolucionar os sistemas internacionais de localização. O bem-sucedido lançamento do Giove-A, um satélite de 600 quilos, é considerado também o primeiro passo do desafio estratégico da União Européia aos Estados Unidos, ao inaugurar um sistema que tornará obsoleto o sistema militar americano de localização por satélite GPS, uma vez que o Galileo esteja em pleno funcionamento, em 2010.

Um foguete russo Soyuz levando o Giove-A foi lançado da base de Baikonur, no Cazaquistão, às 5h19m GMT (3h19m em Brasília). Quatro horas depois, integrantes do controle da missão confirmavam que o satélite fora colocado com sucesso na altitude programada de 23.222 quilômetros sobre a Terra. A ESA alertou, no entanto, que só considerará a missão totalmente bem-sucedida no momento em que todos os sistemas de transmissão de dados e os painéis solares forem testados, o que pode levar alguns dias.

¿ O lançamento do Giove é a prova de que a Europa pode colocar em funcionamento projetos ambiciosos para o benefício de seus cidadãos e suas empresas ¿ disse o comissário de Transportes da UE, Jacques Barrot.

O Galileo, esperado ansiosamente por empresas de transporte, comunicação e alta tecnologia, já está sendo considerado principalmente um dos grandes empreendimentos políticos da UE. Com o mais moderno sistema de satélites do planeta, o bloco continental deixará de depender de redes estrangeiras.

Hoje há dois sistemas de localização por satélite em funcionamento. O americano GPS e o russo Glonass. Ambos são empreendimentos militares, sendo que o americano foi liberado em parte para uso civil em 2000. Porém, os EUA têm o poder de cortar o serviço, ou mesmo diminuir sua precisão, a qualquer momento.

O presidente Bush chegou a ordenar ao Pentágono que faça planos para possibilitar o corte rápido das informações caso haja uma crise de segurança nos EUA. Já o sistema russo permanece tendo uso exclusivamente militar.

Ao todo, serão 30 satélites (27 em funcionamento e três em espera, para o caso de alguma falha) espalhados na órbita terrestre, além de bases e transmissores em terra. Um convênio com EUA e Rússia permitirá a troca de dados permanente com os satélites das redes GPS e Glonass, ampliando ainda mais o serviço.

Empresas ainda estudam possíveis aplicações

As diferenças entre o Galileo e o GPS não se resumem apenas ao domínio de sistemas estratégicos de localização. O sistema americano começou a ser colocado em órbita na década de 1970 e sua tecnologia já é considerada obsoleta. O sistema europeu possibilitará o oferecimento de serviços que não podem ser feitos pelo GPS.

¿ A navegação por ondas de rádio será uma característica da vida cotidiana, auxiliando a evitar engarrafamentos e monitorando cargas perigosas ¿ disse o comissário Barrot.

O grande trunfo do Galileo é a precisão. Em qualquer ponto do planeta, a margem de erro garantida pela ESA será inferior a um metro. Com o GPS, esta margem é de 15 metros, o que é suficiente para operações militares, mas não para resgates de emergência, por exemplo.

As possibilidades de uso são consideradas quase ilimitadas por especialistas, e empresas de telefonia celular ainda estão estudando as possíveis aplicações. Sistemas de trânsito de grandes cidades ou estradas poderão ser mais bem coordenados para evitar problemas de tráfego, trabalhadores em atividades de risco poderão ser monitorados com precisão de centímetros. Companhias aéreas estão entre as mais entusiasmadas, pois cada aeronave poderá ter sua posição conhecida em tempo real, incluindo não apenas sua localização em relação a latitude e longitude, mas também altitude, o que poderia evitar virtualmente qualquer choque entre aviões.

Além da localização no espaço e no tempo, o sistema europeu conseguirá também medir a velocidade de objetos com receptores. Outra possibilidade do Galileo é a capacidade de o sistema receber e enviar sinais. Assim, uma pessoa que esteja perdida e envie um sinal de socorro poderá receber um sinal do sistema avisando que sua mensagem foi recebida e a ajuda está a caminho. O sistema pode funcionar também localizando receptores dentro de prédios e até em pequenas profundidades sob o solo.

O projeto Galileo é uma parceria entre a UE e empresas privadas, com a colaboração de outros países como China, Índia, Israel e Ucrânia. O Brasil, que chegou a ser procurado, preferiu não participar, pelo menos desta fase inicial.

Um segundo satélite será lançado no início de 2006. Em 2008 as comunicações devem começar a ser feitas com os primeiros quatro satélites definitivos.

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