Título: Uma facada sem autor conhecido
Autor: Luiza Damé/Rodrigo Hirose
Fonte: O Globo, 30/12/2005, O País, p. 3

Em entrevista ao 'Fantástico', Lula de novo não diz quem o traiu; Delúbio tem bem bloqueado

Mais uma vez, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva evitou dar o nome de quem o traiu no escândalo de corrupção envolvendo o PT e integrantes do governo mas disse que todo o episódio foi como uma facada nas suas costas. Em entrevista ao "Fantástico", da Rede Globo, que será exibida neste domingo, o presidente admitiu que há indícios de responsabilidade do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares.

- Não interessa se foi A, B ou C. Todo o episódio foi como uma facada nas minhas costas - disse Lula, ao responder à pergunta do jornalista Pedro Bial sobre quem o traiu.

No mesmo dia, em Goiânia, o juiz da 3ª Vara da Fazenda Pública em Goiás, Ari Ferreira de Queiroz, determinou a indisponibilidade de um carro de propriedade de Delúbio. O veículo (um Chevrolet Ômega CD), ano 2004, é avaliado em R$54 mil e será usado como parte do pagamento de R$164.695,51 que o ex-tesoureiro teria recebido irregularmente da Secretaria de Educação de Goiás. Segundo ação por apropriação indébita movida pelo Ministério Público, Delúbio teria recebido sem trabalhar por nove anos.

Este período corresponde ao tempo em que o ex-tesoureiro, que era professor de matemática no Colégio Estadual Lyceu de Goiânia, esteve à disposição da CUT. Na decisão, o juiz argumentou que Delúbio "mora há 16 anos em São Paulo" e, portanto, não poderia estar prestando serviços ao estado que justificassem que ele continuasse recebendo da Secretaria estadual de Educação.

A Justiça também tornou indisponíveis bens de duas outras pessoas que tinham relações com Delúbio: a deputada Neyde Aparecida (PT-GO) - um Fiat Palio Weekend - e Noeme Diná, ex-presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Educação no Estado de Goiás (Sintego) - um Renault Clio e um Palio EX. As duas, segundo denúncia do Ministério Público, teriam confirmado, quando estiveram na diretoria do Sintego, que Delúbio aparecia para trabalhar no sindicato, o que não ocorreu.

Um dos advogados de Delúbio e da deputada Neyde Aparecida, Sebastião Ferreira Leite, disse que vai recorrer da decisão. "Os dois não foram ouvidos e não tiveram direito de defesa", alegou o advogado.

Na entrevista ao "Fantástico", Lula repetiu a mesma expressão usada pelo deputado cassado Roberto Jefferson (PTB-RJ), durante seu primeiro depoimento no Conselho de Ética da Câmara, ao relatar a reação do presidente quando ficou sabendo da existência do mensalão. Segundo o ex-deputado, a reação do presidente foi como a de alguém "que recebeu uma facada nas costas".

Após falar da traição, na entrevista de ontem, Lula voltou a defender o ex-deputado José Dirceu (PT-SP):

- Ele não foi julgado. A CPI vai dizer se ele errou ou não - disse.

Em mais um crítica indireta à imprensa, afirmou que as "coisas boas" do seu governo não aparecem. Ressaltando que falaria somente de 2005, o presidente citou o crescimento econômico, a geração de empregos e os acordos salariais assinados este ano.

- Os acordos permitiram que 85% das categorias conseguissem aumentos salariais acima da inflação - disse.

Um pequeno trecho da entrevista de Lula ao "Fantástico", que vai ao ar em dois blocos, foi assistido por jornalistas no caminhão de transmissão da Rede Globo que estava no pátio do Palácio do Planalto. A produção do programa, ao perceber que a entrevista estava sendo acompanhada, fechou a porta do veículo. Serão entre 37 minutos e 40 minutos de entrevista no domingo. Segundo Bial, o presidente foi afirmativo nas respostas e não parecia desanimado.

Legenda da foto: LULA: "Todo o episódio foi como uma facada"