Título: PACOTE CONTRA PREÇO DO ÁLCOOL
Autor: Geralda Doca
Fonte: O Globo, 05/01/2006, Economia, p. 17

Lula determina e ministério estuda ação contra alta dos preços do combustível

Por determinação direta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o governo prepara um pacote de medidas emergenciais para segurar os preços do álcool ¿ em dezembro, o preço do anidro, misturado à gasolina, subiu 18% no atacado e o do hidratado, 25%. Com isso, os postos estão recebendo a gasolina entre 3% e 5% mais cara, como divulgou o GLOBO na terça-feira. Ontem, postos do Rio aumentaram os preços do álcool em até 8,37% e os da gasolina em até 4,01%. São três as linhas de ação estudadas pelos ministérios da Agricultura e de Minas e Energia: corte, na próxima semana, de 25% para 20% da mistura obrigatória de álcool anidro à gasolina, redução da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) incidente no consumo do combustível e oferta de crédito aos usineiros.

A mudança na mistura vai gerar uma economia de 100 milhões de litros de álcool por mês e reduzir as pressões sobre a demanda do produto, aquecida pela entressafra e pelo consumo dos carros bicombustíveis, sucesso de vendas das montadoras, explicou o diretor do Departamento de Cana-de-Açúcar e Agroenergia do Ministério da Agricultura, Angelo Bressan. Segundo ele, a redução na mistura seria temporária, até o início de maio, quando começa a próxima colheita de cana, que traria redução imediata de pelo menos 30% nos preços de álcool.

O corte da Cide sobre a gasolina ¿ hoje o custo é de R$0,28 por litro ¿ é necessária em caso de diminuição de mistura de álcool para evitar que a medida acabe elevando os preços nas bombas, com impactos na inflação. Isso porque um maior volume de gasolina estaria sujeito à tributação.

Lula cobrou solução para alta dos preços

A luz amarela acendeu na Esplanada dos Ministérios porque o aumento da gasolina contradiz as expectativas do governo em ano eleitoral. O ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, afirmou ao GLOBO há pouco mais de dez dias que, diante do alcance da auto-suficiência na produção de petróleo pela Petrobras e a tendência à estabilidade dos preços internacionais do barril, não haverá reajuste da gasolina em 2006.

¿ O setor (de produção de álcool) está desregulamentado e o instrumento legal que nós temos é a mistura, que pode ser baixada de 25% para 20% ¿ disse o diretor, acrescentando que a proposta não está fechada entre os ministérios envolvidos e falta negociar com o setor privado, em encontro a ser realizado na próxima semana.

Para fazer os usineiros aderirem ao pacote, disse Bressan, serão oferecidas medidas compensatórias, como financiamento de capital de giro. Isto garantiria recursos públicos para a formação de estoques no início da próxima safra e tornaria obrigatória a liberação do álcool estocado, pois os empréstimos estariam vencendo nesta época e a venda do produto seria usada para quitar as dívidas.

Hoje, há cerca de quatro bilhões de litros de álcool estocados. Se fossem liberados nesta época de entressafra, não haveria pressão sobre os preços devido à grande demanda diante de oferta moderada. Mas o governo não tem hoje mecanismos que obriguem o setor a desovar os estoques.

Bressan disse ainda que Lula ficou aborrecido com as notícias sobre o aumento do preço do álcool e pediu ao ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, na terça-feira, para encontrar uma solução rapidamente:

¿ A idéia é essa: se não for possível reduzir os preços, pelo menos que eles parem de subir.

O litro de álcool anidro na usina está custando R$1,10 e o do hidratado, R$1. Mas, segundo o diretor, esse patamar ainda não pode ser considerado exagerado se for levado em conta o custo de produção, que varia entre R$0,75 e R$0,80 por litro. Ele lembrou que, em 2003, o governo fechou um acordo com o setor privado para venda do produto a R$1 e, portanto, o preço estaria dentro do esperado ¿ se for considerada a inflação acumulada desde então, da ordem de 20%.

Outra possibilidade para driblar o problema seria importar álcool dos EUA ou reduzir as vantagens do álcool hidratado (usado em carros flex fuel) em relação à gasolina, forçando uma elevação de preços, mas essas hipóteses são consideradas remotas.

Para reduzir a mistura de álcool na gasolina ¿ a hipótese mais concreta ¿ basta uma resolução do Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool (Cima). No caso da Cide, apenas um decreto presidencial. Bressan afirmou não ver problemas no fato de o governo reduzir o tributo e abrir mão de receita em ano eleitoral porque se trata de um imposto regulatório, com fins específicos e não arrecadatórios.

A proposta do governo agradou representantes do setor, com exceção da União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (Unica). O presidente da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e Lubrificantes (Fecombustíveis), Gil Siuffo, disse que o governo instituiu a mistura porque a demanda estava abaixo da produção. Mas, agora, o álcool está onerando a gasolina:

¿ A redução da mistura é um instrumento que já foi usado no passado para diminuir a especulação ¿ disse o presidente do Sindicato Nacional das Distribuidoras de Combustíveis (Sindicon), Alisio Vaz.

¿ Trata-se de uma medida pontual que não vai gerar excedente suficiente para resolver o problema. O setor precisa de políticas de médio e longo prazos que permitam a formação de estoques reguladores e estratégicos ¿ rebateu Antonio de Pádua Rodrigues, diretor técnico da Unica.

O novo aumento de preços deixou indignados revendedores e como consumidores. O gerente do posto Boa Parada (BR), no Rio Comprido, Valmir Gomes, disse que desde segunda-feira passada está comprando combustível mais caro, sem explicações das distribuidoras. O corretor de imóveis Anderson Oliveira levou um susto ontem ao abastecer seu carro:

¿ O jeito será abastecer com cartão da bandeira para pagar no fim do mês ¿ disse.

A professora de educação física Evelyn Faria disse que os gastos com gasolina subirão R$300 por mês:

¿ Como trabalho em cinco academias, rodo o dia inteiro de carro. O jeito é reduzir meus ganhos.

COLABOROU Gustavo Fernandes, do Extra

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