Título: CLIMA ELEITORAL
Autor:
Fonte: O Globo, 06/01/2006, Opinião, p. 6

O pacote de investimentos anunciado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na terça-feira, somado ao programa de emergência para tapar buracos em estradas federais e estaduais, é indício forte de que o governo contraiu a clássica síndrome da obra eleitoreira.

A repetição dessa mazela da vida pública nacional começou a ficar evidente ainda no final do ano passado, com as pressões desencadeadas pela ministra recém-empossada Dilma Rousseff contra a proposta de um aumento no superávit primário para acelerar a queda do tamanho relativo da dívida pública. Por trás daquela operação política, era indisfarçável o conhecido mal-estar de parte do governo com a própria meta oficial de 4,25%. Com a proximidade das eleições e o desgaste do presidente, se dependesse desse grupo, sequer os 4,25% seriam preservados - mesmo que o desmando fiscal de hoje seja a inflação e a crise de amanhã.

A pressa e a imprevidência no anúncio de obras denunciam o interesse eleitoral. É legítimo o presidente querer se reeleger. Como seu sucessor, Lula e equipe se apressaram em empenhar o máximo de recursos possíveis na virada do ano para poder liberar investimentos sem depender da aprovação de um Orçamento encalhado no Congresso. O importante é saber como o dinheiro será gasto.

Nesse sentido, as expectativas não são animadoras. Pois o governo necessitará de uma competência administrativa que não demonstrou até agora. O anúncio de obras em hidrelétricas ainda na dependência de aprovação pela burocracia ambiental - lenta e intrincada como se sabe -, o lançamento em meio a fanfarras de um programa para tapar buracos em estradas considerado insuficiente, mera maquiagem de curta duração, tudo isso passa a sensação de improviso e de uso pouco eficiente do dinheiro do contribuinte. Consertar estradas e edificar hidrelétricas são ações imprescindíveis, se executadas de forma criteriosa.

O presidente tem reiterado que não cometerá qualquer desatino na economia por causa das eleições. Até segunda ordem, confia-se nele. Mas se o clima que tem envolvido o anúncio desses projetos continuar fortemente contaminado pelo calendário eleitoral, Lula terá de intervir para fazer valer o que promete.

O governo parece tomado pela síndrome da obra eleitoreira