Título: Brasil pede que países doadores liberem verbas prometidas ao Haiti
Autor: Deborah Berlinck
Fonte: O Globo, 17/11/2004, O Mundo, p. 33

O assessor da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, fez em Paris um apelo para que a França e a comunidade internacional liberem logo o US$ 1,2 bilhão que prometeram para a reconstrução do Haiti. Nem um dólar chegou ainda ao país, queixou-se. Se o dinheiro não entrar rápido ¿ alertou ¿ os esforços para reerguer o Haiti vão fracassar e a culpa vai recair sobre os países latinos. Ele lembrou que é a primeira vez que a América Latina se une para ajudar um país da região.

¿ Essa ajuda tem de vir com grande urgência. Em um país com 80% de desempregados, é possível imaginar como é difícil pedir calma e estabilidade ¿ disse.

Garcia fez o apelo durante um debate sobre o futuro da América Latina, organizado pelo jornal ¿Le Monde¿, anteontem à noite. Ele engrossou o coro do governo brasileiro. Há duas semanas, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, queixou-se da falta de dinheiro num encontro em Paris com seu colega francês, Michel Barnier, usando o mesmo argumento: não se pode exigir que o Haiti ¿ um país falido ¿ passe pela burocracia habitual de aprovação de projetos, para obter dinheiro.

¿ Dizem que alguns projetos podem levar dois anos para serem aprovados. Não haverá mais Haiti em dois anos! É preciso que esse dinheiro chegue em um, dois ou três meses. E se não há credibilidade necessária do governo atual (haitiano), é preciso encontrar uma solução para que não nos digam mais tarde: os latino-americanos fracassaram ¿ alertou Garcia.

Cobranças ao Brasil por silêncio sobre Cuba

A pressão sobre a França tem motivo: o Haiti é ex-colônia francesa e foi com o empurrão do presidente Jacques Chirac que o governo Lula ¿ de olho na obtenção de uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, com o apoio da França ¿ assumiu o comando da força de paz no Haiti.

Marco Aurélio não escapou durante o debate de uma cobrança sobre a posição brasileira em relação à Cuba de Fidel Castro. Um dos convidados, o escritor cubano dissidente Eduardo Manet, fez um apelo para a liberação de 75 pessoas, na sua maioria intelectuais que Fidel condenou no ano passado por divergirem do regime. Quando Edwy Plenel, diretor do ¿Le Monde¿, pediu uma explicação sobre a posição brasileira ¿ numa alusão ao silêncio do presidente Lula sobre estas prisões durante a visita a Cuba, em 2003 ¿ Garcia disse que o governo optou por uma ¿diplomacia silenciosa¿ e defendeu a reintegração de Cuba ao cenário latino, alegando que ¿certas pressões internacionais produzem o efeito contrário¿.

Mas Felipe Gonzalez, o ex-presidente socialista do governo espanhol, contou que passou anos dialogando com Fidel, sem efeito. Ele disse ter informações seguras de que o governo Bush começará a suspender o embargo contra Cuba em 2005, o que deixará Fidel numa posição delicada: não poderá mais culpar os Estados Unidos pelo fracasso do país.