Título: UMA CALAMIDADE PARA ISRAEL
Autor: Charles Krauthammer
Fonte: O Globo, 07/01/2006, O Mundo, p. 27

O derrame sofrido pelo premier Ariel Sharon pode se provar um dos maiores desastres nos quase 60 anos da História de Israel. Enquanto escrevo, as condições de Sharon são incertas, mas a gravidade do derrame torna improvável que sobreviva. Isso pode ser desastroso porque Sharon representava o surgimento de uma idéia nacional, racional, que deveria criar com as próximas eleições um governo estável de centro pela primeira vez em décadas.

Por uma geração, políticos israelenses ofereceram duas alternativas. A esquerda dizia: Temos que negociar a paz com os palestinos. A direita dizia: Não há com quem conversar porque eles querem nos destruir; então vamos permanecer nos territórios e tentar integrá-los a Israel.

A esquerda teve a sua chance com os Acordos de Oslo em 1993. Eles provaram ser uma fraude. A OLP usou as concessões para criar um aparato armado e terrorista em Cisjordânia e Faixa de Gaza. A oferta de Israel de paz generosa em Camp David, em 2000, encontrou a segunda intifada, que matou milhares de judeus.

Israel se voltou para a direita, elegendo Sharon em 2001. Mas a idéia de ocupar os territórios indefinidamente era inviável. A genialidade de Sharon foi começar a estabelecer um terceiro caminho. Ele argumentou que o único caminho para a segurança era um redesenho unilateral das fronteiras, construindo uma cerca ao redor de Israel e retirando soldados e colonos do outro lado. O outro lado se tornaria a Palestina independente.

Sharon retirou Israel de Gaza. No outro front, a construção de uma cerca dará à nova Palestina 93% da Cisjordânia. Os 7% que ficarão com Israel vão incluir a maioria dos israelenses da Cisjordânia. Os demais terão que voltar a Israel.

O sucesso da estratégia é visto no colapso da intifada. Os ataques terroristas caíram 90%. A economia israelense ressuscitou e o país recuperou a confiança. A idéia de um Israel menor mas seguro ganhou apoio, marginalizou velhos partidos de esquerda e direita e estava à beira do sucesso nas urnas que estabeleceria um novo centro político para levar a estratégia adiante.

Mas o veículo para o novo centrismo, o Partido Kadima, tem apenas algumas semanas de existência e é amplamente dependente do carisma e da confiança pública em Sharon.

Para ser justo, o Kadima não é partido de um só homem. Atraiu dissidentes da esquerda e da direita, membros do Gabinete e do Parlamento. Não vai desaparecer do dia para a noite. Mas a saída de cena de Sharon colocará seu futuro em risco. Sharon precisava de um ano ou dois para governar como líder do Kadima, firmar raízes e formar uma nova geração de líderes.

Isso não vai acontecer. Não há ninguém no país, nem no partido, com seu prestígio. Ehud Olmert, seu vice, está longe de conduzir à vitória eleitoral que permitiria um governo estável de maioria.

O Kadima representa uma idéia de que a hora chegou. Mas nem todas as idéias se concretizam. Elas necessitam de protagonistas históricos que as levem à frente. Sharon era um ator histórico de grandes proporções. Ele colocou Israel no único caminho racional. Mas levou o país apenas até a metade do caminho. E não deixou nenhum Josué.

CHARLES KRAUTHAMMER é articulista do ¿New York Times¿